Aumento da afluência nas reservas de Gaia e de Vila do Conde põe espécies em risco, em particular o borrelho.
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Assim que chega fevereiro e o borrelho-de-coleira-interrompida - pequena ave que em adulta pesa cerca de 56 gramas - é avistado na Reserva Natural Local do Estuário do Douro (RNLED), em Gaia, os dias de Paulo Faria, engenheiro florestal responsável pela gestão e coordenação do espaço, passam a ser desassossegados. O mesmo acontece em Vila do Conde, aos elementos da Associação Pé Ante Pé, a partir de abril e até o final do verão. É que esta espécie protegida nidifica nas praias e dunas, existindo elevado risco dos ovos serem pisados ou de os veraneantes estenderem as toalhas em cima dos ninhos, deixando as crias aflitas.
Também as outras aves que por ali encontram abrigo sofrem com o aumento de afluência de pessoas.
Paulo Faria destaca que a RNLED é uma zona "condicionada, mas não proibida", que além de conservar uma significativa riqueza em biodiversidade e englobar uma área de 62 hectares, é um importante local de descanso, alimentação e abrigo de muitas espécies de aves migradoras".
Mas, não raras vezes, a reserva e a zona da praia e das dunas, onde os borrelhos nidificam, sofrem ameaças, "como o pisoteio humano, cães a correrem sem trela, circulação de veículos e algumas atividades recreativas como o kitesurf",referiu Paulo Faria, lembrando que o concelho de Gaia "tem 12 quilómetros de frente marítima, onde muitas destas coisas podem acontecer".
Paulo apelida os borrelhos de "príncipes das areias" e na duna mostra que têm a particularidade de "ornamentar o ninho com conchas e pequenas pedras". "E tanto ovos como crias têm cores e padrões que se dissimulam na areia", acrescenta. Daí que "as crias sejam quem mais sofre ", refere, sublinhando que "os sete primeiros dias de vida são cruciais".
Parceria com município
Também a Associação Pé Ante Pé, criada em 2015, tem um trabalho ativo de monitorização das aves "de toda a costa entre a Póvoa de Varzim e Vila do Conde", constatando que "são muitas as ameaças" para as cerca de 15 a 20 espécies que surgem no Estuário do Ave.
O biólogo e presidente da associação, Pedro Martins, contou que concretamente "na faixa que vai de Azurara a Labruge, há um trabalho feito em parceria com o Município de Vila do Conde" na defesa do borrelho-de-coleira-interrompida. "Não só com a distribuição de cartazes de sensibilização à entrada das praias - apelando às pessoas para terem cuidados redobrados, mantendo os cães com trela, e usando apenas os acessos às praias e nunca as dunas -, como também foi proposto à Autarquia não fazer limpeza mecânica dos areais nesta área protegida, apenas manual".
"É uma dor de alma ver as crias a andarem aflitas à volta das toalhas estendidas pelas pessoas à procura dos progenitores", lamentou Albano Silva, membro da associação, que já viu um borrelho a nascer, e não tem dúvidas em elegê-lo como a sua ave preferida.
Dia do Pai
O Dia do Pai, a 19 de março, é assinalado de forma especial na Reserva Natural do Estuário do Douro, em Gaia, destacando-se o papel do borrelho-de-coleira-interrompida, uma vez que depois da eclosão dos ovos é o macho que cuida das crias até serem autónomas.
Pé Ante Pé
A Associação Pé Ante Pé, criada em Árvore, Vila do Conde, tem um amplo trabalho de divulgação e conservação da natureza e da biodiversidade, promovendo atividades como educação ambiental nas escolas, ações de reflorestação, passeios para observação de aves e o pedestrianismo. Apoia ainda a investigação científica.