Chuva obrigou a interromper o teatro comunitário nas ruas de Vila do Conde, mas os seus 200 participantes não desistiram de levar “o monstro” à fogueira.
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Pela primeira vez em 19 edições da Queima de Judas de Vila do Conde, o espetáculo não chegou ao fim. A chuva torrencial obrigou a parar, mas nem assim o Judas deixou de ir para a fogueira e o grupo de 200 participantes no espetáculo comunitário de teatro de rua celebrou, a cantar e a dançar, a liberdade e a chegada da primavera.
A dura faina do bacalhau, ao largo da Terra Nova, o trabalho na antiga Seca e o 25 de Abril eram, este ano, os grandes temas. Com música ao vivo e fanfarra a acompanhar e os bacalhaus em palco, começava o espetáculo. “Cagaçal”, uma personagem de Vila do Conde, entre o louco e o bêbado, entra em cena. Chegam as dezenas de crianças que, naquela altura, trabalhavam na secagem do peixe que vinha do frio, numa atividade que empregava centenas, sobretudo mulheres e crianças.
A história de “grandes que comem os pequenos”, dos que lucram muito e dos que trabalham, das elites e do povo, tinha 50 anos, mas nunca o tema fora tão atual.
Era o início da Queima de Judas a resistir numa noite fria de Sábado de Aleluia, mas a “aberta” não durou mais de 20 minutos e, com a chuva a cair intensamente, a organização teve mesmo que cancelar o espetáculo.
“Três meses de trabalho”, um espetáculo que “não faz sentido fora da data” e que, por isso mesmo, Pedro Correia, o diretor artístico, fez questão de mostrar “nem que fosse só um bocadinho”. Eram 200 pessoas em palco, dos três aos 70 anos. Misturam-se idades e artes - teatro, dança, música e artes circenses -, anónimos e associações locais. Todos amadores, dirigidos por atores profissionais, num trabalho coordenado pela associação cultural Nuvem Voadora.
Ficou a aguardar-se uma trégua na chuva, porque o Judas, esse foi mesmo a queimar, que é preciso mandar embora o inverno e libertar a primavera.