Os falcões que constituíram família no edifício do "Jornal de Notícias" consideraram que "as condições são boas" e "gostaram do sítio", havendo mesmo a probabilidade de voltarem no próximo ano.
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Uma família de falcões peneireiros aproveitou uma janela partida no 13.º andar do edifício do "Jornal de Notícias", no Porto, para constituir família. Os falcões foram descobertos quando os serviços de manutenção se preparavam para arranjar a janela.
Segundo Gonçalo Elias, ornitólogo, autor de livros sobre as aves de Portugal e coordenador do portal "avesdeportugal", os falcões não constroem ninhos "com raminhos", aproveitando "estruturas já existentes", como cavidades de edifícios em ruínas, ninhos antigos de outras aves, escarpas ou outras saliências.
Os falcões peneireiros costumam pôr entre três a seis ovos, a incubação dura entre 27 e 29 dias e as crias ficam aptas a voar ao fim de um período que oscila entre 27 e 32 dias, tornando-se independentes cerca de um mês depois, explicou Gonçalo Elias ao JN, citando o livro "Aves de Portugal", do qual é co-autor, e a enciclopédia "Birds of Western Palearctic", de Stanley Cramp.
Uma postura "tardia"
Os falcões só têm uma ninhada por ano. Normalmente, a postura dá-se nos meses de março e abril, estando as crias aptas para voar em maio. No caso dos falcões nascidos no edifício do JN, três dos quatro ovos eclodiram no dia 1 e na madrugada de dia 2 de julho. Na manhã de dia 3, nasceu a quarta e última cria.
O especialista considera que este processo foi "tardio", uma vez que a postura deverá ter sido em junho. Gonçalo Elias especula que isto pode acontecer por diversas razões: mau tempo pode ter dificultado a ação de encontrar ninho, o macho pode ter estado "desemparelhado" e só encontrou uma fêmea mais tarde ou a primeira postura "perdeu-se" e o casal de falcões teve de fazer uma segunda tentativa num "sítio diferente e mais seguro".
"Há uma época normal, mas diversas circunstâncias e fatores podem afetar o calendário [de reprodução]", afirmou o ornitólogo ao JN.
O especialista disse também que as crias poderão começar a voar em agosto e serão independentes em setembro, segundo o calendário conhecido sobre esta espécie.
Além disso, segundo adiantou Gonçalo Elias, esta trata-se de uma incubação assíncrona, uma vez que a fêmea iniciou a incubação logo após a postura do primeiro ovo, o que fez com que as crias eclodissem sucessivamente e de acordo com a ordem de postura.
Este tipo de incubação pode fazer com que as crias que nasceram primeiro sejam mais fortes e consigam-se impor-se e reclamar mais comida do que os filhotes mais novos, que são mais pequenos e fracos.
Casal de falcões pode voltar no próximo ano
O especialista adiantou ainda ao JN que, se os falcões constituíram família através da janela partida no "Jornal de Notícias", foi porque "acharam que as condições são boas" e porque "gostaram do sítio", havendo mesmo a probabilidade de voltarem no próximo ano.
Para isso, Gonçalo Elias sugeriu "fazer uma limpeza do local" depois de as crias voarem e, possivelmente, colocar uma caixa que o casal possa usar como ninho para uma próxima ninhada.
Segundo o ornitólogo, a partir de março, os falcões começam a inspecionar possíveis locais para constituir família, pousando frequentemente nos locais que consideram adequados. A partir dessa altura, não deve haver perturbação para aumentar as hipóteses de as aves se voltarem a reproduzir no edifício.
Casos semelhantes em Portugal
Gonçalo Elias disse ao JN que considera que os falcões são "cada vez mais urbanos", acrescentando que começaram a surgir "a partir da década de 90" e que o número nas cidades é crescente.
Não existe uma compilação completa, mas são já vários os casos documentados nas redes sociais e meios locais, especialmente de pessoas que são surpreendidas com estas aves nas suas varandas:
2012 - O casal de falcões Zuzu e Margarida escolheu uma floreira num apartamento na Amadora para criar família. A fêmea morreu em 2018.
2017 - Quatro crias de falcão nasceram numa floreira em Alfornelos, Amadora.
2019 - A 25 de maio, nasceram crias de falcões peneireiros, cuja mãe foi batizada de Maria, numa floreira em Cascais.
2019 - Em Castelo Branco, também uma família de falcões foi criada numa floreira.
2020 - A 23 de junho, nasceram quatro crias de falcões peneireiros num vaso colocado numa varanda de uma casa em Odivelas.