A Associação Porto Digital (APD), entidade presidida pelo vice-presidente da Câmara do Porto, gastou, este ano num trimestre, mais de 191 mil euros em contratos de comunicação e marketing, mais 24% do que o valor total do ano passado.
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De acordo com um documento à qual a Lusa teve hoje acesso - que inicia com reparos do presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, nos quais este mostra "apreensão" e "preocupação - no primeiro trimestre de 2025, a APD contabilizava contratos no valor de 191.430 euros, enquanto em 2024 o valor total foi de 154.694,99 euros e em 2023 de 98.085,00.
"Os dados de 2025 correspondem a contratos celebrados no 1.º trimestre de 2025, sendo superiores em 24% ao valor total dos contratos do ano de 2024", lê-se no documento assinado pelo diretor municipal da Presidência, e que surge na sequência da auditoria feita a pedido da vereação do PSD aos contratos celebrados nos últimos seis meses pela Porto Digital.
No despacho sobre esta análise à auditoria, Rui Moreira escreve: "Visto com apreensão a falta de envio tempestivo dos contratos ao Tribunal de Contas".
O autarca acrescenta "preocupação com a ineficácia do planeamento da atividade da Associação, mais a mais em anos sucessivos, com impacto na escolha dos procedimentos concursais".
"É fruto do aumento da atividade da Porto Digital"
A APD é presidida por Filipe Araújo, atual vice-presidente do executivo de Rui Moreira e candidato independente à Câmara Municipal do Porto nas eleições Autárquicas deste ano.
Em declarações à agência Lusa, Filipe Araújo sublinhou que a associação está a "executar muitos projetos europeus" e rejeitou qualquer ligação entre os gastos e a promoção da sua imagem pessoal.
"Isso é fruto do aumento da atividade da Porto Digital. A Porto Digital este ano está a executar muitos projetos europeus. É normal, tem tido essa capacidade de angariar financiamento europeu. Aliás, não é só este ano, prolonga-se para os próximos anos. Obviamente, há aumentos em várias rubricas, inclusive a da comunicação", disse o presidente da APD.
No início de abril, o PSD enviou um requerimento ao presidente da Câmara do Porto para que fosse realizada uma auditoria aos contratos da Porto Digital, sobretudo de consultadoria.
O pedido surgiu depois de o deputado municipal do PSD, Rodrigo Passos, ter afirmado que três contratos da APD geravam dúvidas se teriam sido usados para "propaganda" do vice-presidente da câmara, Filipe Araújo.
Na sequência das declarações sobre a Porto Digital, Filipe Araújo avançou com uma queixa-crime contra o deputado social-democrata.
No documento hoje consultado pela Lusa, e que inclui um relatório do Departamento Municipal de Auditoria Interna (DMAI) da autarquia do Porto, lê-se que foram "detetados atrasos, por negligência, no envio ao Tribunal de Contas de três contratos".
É ainda alvo de reparo a "execução de dois contratos em data anterior a sua publicação no Portal Base".
E publicada uma tabela sobre "sucessivas adjudicações a duas empresas com objetos contratuais muito semelhantes".
Em causa as empresas Helppier, Lda., e a Datacentric, Lda., que de 2021 a 2023 participavam nos concursos separadamente e em 2024 formaram o Consórcio Datacentric-Helppier.
No relatório do diretor municipal da Presidência lê-se que a APD justificou a sequência dos contratos e respetivos procedimentos, no que a contratação pública diz respeito com base no fator da imprevisibilidade", bem como com a aplicação de uma metodologia de inovação incremental, somando-se, terá justificado a associação, "a incerteza quanto às fontes e calendários de financiamento".
Mas, para o diretor municipal, "o simples acompanhamento da execução financeira dos contratos, a partir do ano de 2023 inclusive terminados antes do fim do prazo contratual, deveria ter conduzido a uma opção pelo procedimento com publicação no Jornal Oficial da União Europeia (após 1 de janeiro de 2024 para valores superiores a 221.000 euros, tendo em 2023 o limite de 215.000 euros)".
A título de exemplo, é referido que um contrato assinado em março de 2024 com a duração de 365 dias "foi totalmente executado financeiramente em seis meses".
Já um contrato assinado em outubro de 2024, com a mesma duração, estava em março de 2025 executado a 81%.
"Aceitando-se que em 2021 não seria possível uma antecipação das necessidades futuras, já o mesmo não podemos concluir da análise do comportamento e execução dos contratos nos anos seguintes. As prestações de serviços contratadas foram contínuas, permanentes e do mesmo tipo. Par isso eram suscetíveis de poderem ser objeto de um único contrato, fragilizando o argumento da imprevisibilidade", é a conclusão do relatório do DMAI.
A agência Lusa contactou o vice-presidente da Câmara do Porto, Filipe Araújo, que remeteu esclarecimentos para mais tarde.