Com a chegada da chuva intensa e do frio torna-se mais evidente o problema das pessoas em situação de sem-abrigo que vivem nas ruas da cidade do Porto.
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Apesar das respostas institucionais e do apoio de rua a estas pessoas carenciadas e sem teto, todos os dias um total de 140 pernoitam nas ruas da cidade. É o caso de Manuel António Castro, de 69 anos. Despejado da casa onde vivia passou a dormir num túnel junto à Avenida de Fernão de Magalhães. Doente e fisicamente debilitado, acabou por ir viver temporariamente com a irmã, em Gaia.
"Isto são condições sub-humanas. Não percebo porque é que as instituições não funcionam. Há anos que vivem aqui pessoas, uns saem outros chegam. O cheiro é nauseabundo. Para além da situação humanamente indigna, isto coloca em causa a salubridade pública", refere Aleksandra Roque que reside no edifício cujo rés do chão faz de túnel entre a Rua de Barros Lima e as traseiras do antigo Hospital de Joaquim Urbano, transformado pela Câmara do Porto em centro de acolhimento temporário para pessoas em situação sem-abrigo.
Manuel Castro vivia mesmo ali, na Rua de Câmara Pestana, numa habitação cedida por uma senhoria após a sua casa de "ilha" ter sido demolida. A moradia acabou, contudo, por ser vendida recentemente a um fundo imobiliário de Guimarães. De acordo com os vizinhos, o novo proprietário intimou Manuel a sair e confiscou-lhe os dois cães, prometendo devolver os animais caso ele saísse.
Cães na quinta, Manuel na rua
Manuel assinou o acordo, os cães foram devolvidos e encaminhados por uma pessoa amiga para uma quinta. Manuel passou a viver na rua. No túnel vivem agora José Fernando Silva, de 51 anos, que passou por situação semelhante, um casal, marido que padece de doença oncológica e mulher, e o senhor Pereira que dorme no parque de estacionamento das traseiras. Os moradores mostram-se preocupados e, além da Polícia, já se queixaram à Autarquia.
Propostas recusadas
O presidente da Junta de Freguesia do Bonfim diz que o caso de Manuel "estava referenciado" e que a Autarquia, assim como a Câmara do Porto, "acompanham" a situação, cabendo à Segurança Social encontrar alojamento.
"O problema são os quartos em albergues, sem conforto e com muita confusão, de difícil adaptação", conta José Fernando. "Este caso como muitos outros estão a ser tratados pelos serviços sociais da Junta, o problema é que muitas vezes as pessoas recusam as soluções apresentadas", diz José Manuel Carvalho, autarca do Bonfim.
Por seu lado, a Câmara do Porto afirma que o caso de Manuel "é do conhecimento das várias instituições da Rede Social do Porto e há um técnico da Rede Local de Intervenção Social que está a fazer o respetivo acompanhamento, bem como a Equipa de Rua".
A Autarquia recorda, ainda, que "a intervenção só pode ser feita no respeito pela vontade e liberdade das pessoas, e no cumprimento da legislação em vigor".
"Fui criado pelos meus avós, que já faleceram. Sempre morei nesta rua mas acabei por ficar sem a casa, que era alugada, e sem ter para onde ir porque não sei do paradeiro dos restantes familiares"
José Fernando Silva, Pessoa sem-abrigo