Diminuição do contacto com os amigos pode ter impactos sociais no futuro, avisa especialista. Famílias em alerta, mas adolescentes garantem cumprir todas as regras.
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Mudaram-se os tempos, mas não as vontades. Adolescentes e jovens vivem o segundo verão condicionado pelas restrições impostas pela pandemia, que lhes reduziu os grupos de amigos com quem habitualmente passavam grande parte das férias. Os mais velhos são quem sente maior frustração na mudança de rotina, enquanto os mais novos mostram maior receio do vírus. Para os pais, a preocupação é transversal.
Sofia Ramalho, vice-presidente da Ordem dos Psicólogos, deixa o alerta: "A diminuição do contacto com os amigos pode ter impactos no futuro". Por isso mesmo, aconselha os pais: "É importante validar aquilo que os filhos estão a sentir. A dimensão social nos adolescentes tem uma importância muito superior à dos adultos".
À chegada ao areal de Matosinhos, seis amigos, todos colegas de turma no Colégio Luso-Francês, no Porto, admitem estabelecer regras entre si para não arriscar uma possível infeção, mesmo que isso contrarie alguns hábitos: "Usamos máscara, não bebemos água da mesma garrafa e não partilhamos comida. Estamos também mais afastados uns dos outros enquanto comemos e não andamos aos abraços". Ainda assim, confessa José Samagaio, de 15 anos, as idas à praia diminuíram face ao ano passado.
"Este ano foram umas cinco ou seis vezes", lamenta o adolescente. Todos veem com naturalidade a preocupação dos pais, acrescentando que nenhum elemento do grupo esteve infetado. Até porque, asseguram, têm feito testes rápidos.
Saidas raras
As famílias mantêm-se alerta, como é o caso de Olga Cerqueira, de 46 anos, que aproveitou o dia para ir até à praia com os filhos João e Inês, de 14 e sete anos.
"Só viemos mesmo molhar os pés e vamos embora. Lidamos com as restrições com alguma dificuldade, principalmente no que toca à liberdade deles. Temos medo, então ficamos mais em casa e só saímos de vez em quando", revela.
O receio dos pais justifica-se pela junção de vários cenários: os cortes no orçamento familiar, o teletrabalho e o aumento das situações de conflito, explica Sofia Ramalho. "É importante que as famílias possam desenvolver competências para acompanhar mais os filhos e encontrar algumas soluções", reforça. Ou seja, permitir saídas, desde que sejam cumpridas as regras de segurança.
Junto ao Edifício Transparente, no Porto, Beatriz Miracorreia e Francisca Sousa, ambas de 13 anos, revelam que o receio do vírus se sobrepõe aos programas que gostariam de marcar com os amigos. "Temos combinado algumas coisas, mas não tanto como no ano passado. Não queremos ficar de quarentena durante as férias", reconhece Francisca. Beatriz atira: "Os nossos pais sabem que cumprimos".
"Não parece verão"
À porta do NorteShopping, na Senhora da Hora, em Matosinhos, o dissabor entre os jovens mantém-se. "Não parece verão", observa Beatriz Martins, de 20 anos, que foi até ao centro comercial com três colegas.
"Fomos uma vez à praia mas estava muita gente e não nos sentimos muito confortáveis. E as saídas à noite não existem", lamenta a amiga de Beatriz, Ana Teixeira, também de 20 anos, que vê na toma da vacina, já agendada para todo o grupo, "um sinal para que se possa finalmente baixar as restrições".
Ano de caloiro em casa
Para Beatriz Martins, a ida ao shopping foi a primeira saída deste verão. A estudante na Escola Superior de Enfermagem do Porto viveu o ano de caloira como "uma experiência nada normal".
"Passei o ano todo em casa com aulas online. Portanto não tive vida académica. Há a expectativa de que o próximo ano seja presencial ou pelo menos misto", suspira Beatriz, esperançosa.
Este é um cenário relevante. Sofia Ramalho reforça: "Os períodos de mudança ou transição de ciclo de estudos são situações de maior stresse e vulnerabilidade".
A falta de distanciamento social na praia é um cenário que Daniel Pinto, de 17 anos, e o amigo João Silva, de 16, confirmam. No entanto, para Ana Silveira, de 15 anos, que fez uma visita ao shopping com a tia, a praia é o único local onde consegue estar com grande parte do grupo de amigos.
Pormenor
Apesar da "sensação de cansaço face à pandemia", e mesmo "limitados nas suas interações com os outros, inclusivamente no próprio toque físico, que é importante também para o desenvolvimento", a psicóloga Sofia Ramalho observa que o papel dos jovens foi "muito importante", tendo sido até "elementos influenciadores da adoção de práticas de segurança".