Matosinhos reivindica parte de terrenos de Leça para outros projetos. Fatura pode atingir 650 milhões do PIB regional.
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Chegou a conta do fecho da refinaria de Leça. Matosinhos e a Área Metropolitana do Porto apanham em cheio com a fatura económica e social. Um estudo da Faculdade de Economia da Universidade do Porto calcula que o impacto do desmantelamento da unidade da Galp pode causar mais sete mil desempregados e uma queda de 1,1% (até 374 milhões de euros) no PIB da economia regional e de 5% no indicador de produção de Matosinhos (276 milhões). O município já reclama parte dos terrenos "para projetos alternativos".
"É muito legítimo que as entidades públicas reivindiquem que uma parte dos terrenos passem para a gestão pública, a fim de ali se centrarem investimentos que alavanquem a economia do município e da região. E que poderão possibilitar candidaturas a fundos comunitários, a fundos que resultem da Transição Social Justa, e ao Fundo Social Europeu, para proteção dos trabalhadores afetados por estas decisões", disse ao JN a presidente da Câmara de Matosinhos.
Luísa Salgueiro tinha acabado de receber o relatório da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, que traça um cenário de devastação económica e social causado pelo fecho da Galp, anunciado há mais de 20 anos, precipitado em dezembro do ano passado e concluído em abril último, com o desemprego à vista para mais de 400 trabalhadores.
Decorridos quatro meses de negociações e verificada a intransigência da Galp, que se justifica com a alegada necessidade de acompanhar a transição energética europeia e mundial, Matosinhos verificou "o ato consumado" e parte agora para a "uma oportunidade" de relançamento da economia local.
Tecnologia e mar
"A transmissibilidade da propriedade dos terrenos a favor da Câmara ou de uma entidade pública pode ser uma oportunidade para a instalação de algo que pode ser muito dinamizador daquela área, com projetos de interesse coletivo, designadamente da Universidade do Porto, na área das novas engenharias, para trazer novos públicos, gerar empregos e mais atividade económica. Isto para compensar, ainda que parcialmente, o impacto brutal verificado por este estudo", acrescentou a autarca de Matosinhos, à entrada para o laboratório de ideias designado Conselho Consultivo sobre a Reconversão da Refinaria, reunido ao final da tarde de ontem, para avaliar o estudo da Universidade do Porto.
Entre os projetos referidos por Luísa Salgueiro destaca-se o já anunciado Centro Tecnológico da Energia e do Mar. "A localização da atual refinaria é um ativo estruturante para a região e para o país. Está no coração da AMP, tem acessibilidades únicas, proximidade do aeroporto e do porto de mar, é servida por comboio e vias rápidas para Espanha. Tem no território uma Universidade de excelência e escolas superiores de grande prestígio internacional e tem ainda a disponibilidade de técnicos de qualidade mundial", concluiu a autarca.
Reações
Sindicatos com sabor "agridoce" e Galp pelas "melhores soluções"
Os trabalhadores fizeram-se representar no Conselho Consultivo de ontem, mas a resignação parece instalada. "Na última reunião que tivemos na Câmara viemos com um sentimento agridoce, porque a senhora presidente da Câmara alterou o discurso de defesa intransigente dos trabalhadores e da refinaria, dizendo que era impotente para lidar com a situação", afirma Telmo Silva, do Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Transformadoras.
A Galp, entretanto, reconhece os impactes socio-económicos na AMP. Fonte da empresa diz que procura "as melhores soluções para o futuro das instalações, das pessoas e do concelho" e que foi "criado um grupo de trabalho para endereçar os desafios da transição energética em Matosinhos", onde permanecerá "um parque logístico".
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Desemprego
Segundo o estudo da Universidade do Porto, o fecho da refinaria terá impacto de 1,9% a 2,8% no desemprego em Matosinhos (entre 1600 e 2300 postos de trabalho. Na AMP, calcula-se um choque entre 0,6% e 0,9% (4900 a 7100 empregos).
Rendimentos
Fatura igualmente pesada para as famílias. Em Matosinhos, a quebra de rendimentos é avaliada entre entre 47 a 64 milhões de euros, 2,7 a 3,6% das remunerações anuais do concelho. AMP: quebras entre 0,8% e 1,2% (62 a 92 milhões).
Rescisões
A Galp encetou conversações individuais com os 401 trabalhadores. Acordou a rescisão com mais de 40%. Uma centena mantém-se em atividade. Cerca de 30% ficarão até janeiro de 2024, para as operações de desmantelamento.
Crise
A crise sanitária não poupou a Galp: 560 milhões de lucros em 2019 e 42 milhões negativos no exercício de 2020. "Mas há 90 milhões para distribuir pelos acionistas", queixam-se os sindicatos.
Desvio para Sines
A Galp concentrou a produção na refinaria de Sines. O Estado é um dos acionistas da petrolífera, com uma participação de 7%, através da Parpública.