Há, pelo Porto, inúmeras intervenções em imóveis antigos, e não é raro ver fachadas em equilíbrios verticais, despojadas do interior que um dia lhes deu sentido porque o corpo do edifício foi arrasado para ser construído de novo. Mas não tem - e não deve, dizem especialistas, ao JN - de ser sempre assim. Porque reabilitação não é sinónimo de destruição.
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"A demolição é uma coisa bárbara, feita por aqueles que não sabem [reabilitar]", afirma o arquiteto Joaquim Massena, que assina o projeto de reabilitação de um edifício de cinco pisos perto do Bolhão, na Baixa, e juntou aos trabalhos a especialidade de conservação e restauro.
Essas são velhas batalhas de Susana Lainho, e é por isso que trava a guerra em duas frentes, a lutar pela preservação interior e exterior do edificado antigo. Sobretudo, dos edifícios que encerram significativo património artístico, como os dois em que está a intervir nas zonas do Bolhão e Clérigos.
"obras de arte"
Num prédio da Rua Formosa, no coração do Porto, rendeu-se aos "tetos com obras de arte" que descobriu e aos quais o trabalho de restauro está a devolver a dignidade. Nas formas e nas pinturas originais, que incluem, até, pormenores com ouro de lei.
"A maior parte dos tetos que temos no Porto, sejam mais ou menos elaborados, não só têm forma como também têm cor, e é importante preservar isso. A ideia é perceber que dá para recuperar", defende a conservadora-restauradora, cuja equipa trabalha na reabilitação projetada por Joaquim Massena. "O arquiteto Massena tem essa sensibilidade, de perceber que são elementos artísticos", nota Susana Lainho, que num dos salões do prédio viu renascer uma pintura a óleo em tons ocre e rosa que, em tempos, fora coberta na íntegra por tinta branca.
"Não são pinturazinhas; são pinturas pensadas e dimensionadas para estes espaços", lembra a especialista, comparando-as com "telas pintadas". "São tetos que, aparentemente, estavam maus e que vão ficar perfeitos", aponta Massena, sublinhando que "é preciso sensibilizar as pessoas, que só não são sensíveis se lhes disserem que é mais simples demolir. É mentira quando dizem que tem de se demolir para reabilitar". Nos Clérigos, a equipa de Susana trabalha nas alturas, a restaurar a azulejaria da "fachada mais bonita" da zona, orgulha-se o proprietário do prédio, Álvaro Ramilo, que, face a essa "mais valia", teve a "exigência de preservá-la". E com os azulejos originais: até os que estavam em risco de queda são recolocados, e "o assentamento é feito com argamassa tradicional e compatível", explica a conservadora-restauradora.
Alterar legislação
A APRUPP, uma associação de reabilitação urbana, defende a "alteração da definição de reabilitação na legislação, já que inclui a reconstrução como uma ação de reabilitação, o que desvirtua o próprio significado da palavra e coloca em causa os objetivos e metas ao nível dos consumos energéticos e de produção de CO2".
Subir IVA para reconstruções
Alice Tavares, líder da APRUPP, diz que se deve "aplicar um IVA de 23%, em detrimento dos 6% atualmente aplicados, para as intervenções de "reabilitação" que usam de forma extensiva a reconstrução, já que esta deve ser entendida como uma construção nova, incluindo as que usam o fachadismo".