No bairro da Quinta do Ferro vivem famílias sem água ou luz. Projeto de reabilitação está parado desde 2017.
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Em pleno coração de Lisboa, a menos de um quilómetro de Santa Apolónia e da Rua do Paraíso - para onde estão previstos projetos habitacionais de luxo - 16 famílias moram "numa autêntica favela". No bairro da Quinta do Ferro, na Graça, vivem sem água canalizada ou casa de banho.
Muitas só têm luz quando conseguem fazer uma puxada do poste de iluminação público. Em 2017, a Associação de Amigos da Quinta do Ferro candidatou um projeto à Câmara de Lisboa, tendo-lhe sido atribuída uma verba de 50 mil euros. Ainda está no papel.
O bairro da Quinta do Ferro nasceu em 1930, na Graça, em Lisboa, ilegalmente. Hoje, a habitação ilegal coabita com a privada e a devoluta, que foi sendo ocupada por sem-abrigo. A muitas das casas construídas precariamente ainda faltam saneamento e água.
Jezuvina Salvador, 83 anos, tem de ir ao chafariz. Carrega o balde, com dificuldade, porque "as pernas já doem", mas não tem alternativa. Nasceu e sempre viveu ali. E, durante décadas, não teve casa de banho. Foi o filho que a construiu recentemente.
"Com a sanita, temos de ir buscar água ao chafariz para despejar, mas sempre é melhor do que ir à fossa", explica João Salvador, 57 anos. Para tomar banho, vai muitas vezes ao balneário público da associação Voz do Operário. A habitação é precária, com paredes e chão frágeis, mas a do tio, ao lado, é "bem pior". "Ele tem mesmo de ir à fossa, não tem casa de banho", lamenta.
Para o morador, a solução já não passa pela reabilitação do bairro. "Por mim, deitavam tudo abaixo e realojavam-nos. Não pedimos muito, basta um T0", diz João, que já se candidatou a habitação municipal com a mãe, mas não teve direito a casa.
A acumulação de lixo junto aos contentores, as ratazanas à noite, e a insegurança deixam Lina Silva, 44 anos, sem esperança. "Não querem saber de nós. Recolhem o lixo da rua de baixo, fora do bairro, e o nosso fica aqui. Vivemos numa autêntica favela", diz. José Figueiredo, 52 anos, também está cansado de esperar. "Há promessas de reabilitação do bairro, mas não cumprem.
O JN enviou questões à Câmara de Lisboa, mas não obteve resposta. Os deputados municipais do CDS questionaram também a Autarquia e apresentaram na Assembleia Municipal uma recomendação, que foi aprovada, para que a Câmara inicie urgentemente a reabilitação do bairro.