Fechado nunca esteve, mas nas últimas duas semanas só 21 das 126 lojas do centro comercial Stop, no Porto, estiveram abertas. Com os bombeiros à porta, os estúdios de música que, por falta de licença, foram selados pela Polícia Municipal, reabriram esta sexta-feira. Artistas e proprietários estiveram no edifício.
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Num gesto simbólico, abriu-se o portão do número 329 da Rua do Heroísmo, no Porto. O edifício nunca esteve fechado mas, nas últimas duas semanas, só 21 lojas estiveram abertas. Bateram-se palmas, mas não faltou ironia, com músicos a criticar a ação municipal, uma vez que "está tudo igual como há três semanas". Os artistas consideram ainda que a presença dos bombeiros poderia ter sido acordada sem a selagem das salas. Junto à porta, está afixado o termo de responsabilidade assinado pela administração do condomínio. As frações continuam a não estar licenciadas e faltam extintores e outros equipamentos de combate a incêndios.
Com um carro de bombeiros a pouco mais de 20 metros do centro comercial Stop, e enquanto uma equipa de bombeiros fazia a vistoria de segurança do edifício, o som das baterias, dos baixos e das vozes dos vocalistas voltou a encher salas de ensaio e os corredores de um edifício que, decorado por graffiti, respira liberdade, resistência e talento.
Em uníssono, os artistas, de chave na mão, respiraram de alívio ao regressar aos estúdios, ainda que com a consciência de que esta solução "temporária" pode não durar muito mais do que um mês. A hora de abertura que estaria acordada seria as 10.30 horas, mas a abertura fez-se já perto das 11 horas. E também os proprietários estiveram presentes na reabertura das salas. Um deles, que preferiu não identificar-se, garantiu ao JN existir vontade em resolver o problema em articulação com a Câmara do Porto. Aliás, depois de uma reunião realizada esta semana, "mais de 70%" dos proprietários já foram contactados no sentido de começar a sanar as questões de segurança em falta e fazer algumas obras no edifício. Até mesmo engenheiros civis, funcionários de uma empresa de um outro proprietário, circularam pelo edifício, dizendo não terem identificado danos estruturais e acrescentando que a "solução é simples".
Impacto "enorme e irrecuperável"
Nas últimas duas semanas, "a maioria das pessoas que ficaram sem sala não tiveram uma alternativa onde ensaiar ou onde gravar", sublinhou Bruno Costa, presidente da Alma Stop, em frente ao centro comercial, momentos antes da simbólica abertura. Houve também quem tivesse de pagar um estúdio à hora para ter onde ensaiar, o "que é muito, muito mais dispendioso". "Portanto, o impacto foi absolutamente enorme e irrecuperável", resumiu.
"A urgência era tal para regressar às salas que precisávamos de o fazer de uma forma ou de outra", admitiu o músico. Bruno Costa nota que "ainda há bastante trabalho pela frente", principalmente no que diz respeito a um horário especial para descarregar os instrumentos no final dos concertos.
Quanto à solução de criar um campus para artistas na Escola Pires de Lima, a posição dos músicos não mudou: querem evitar a mudança. "A estrutura já cá está. Já tem o número de salas adequado para toda a gente. Mesmo que haja uma transição temporária para outro espaço, queremos sempre regressar aqui", acrescentou.
"A verdade é que não conheço nenhum músico que queira ir para a Escola Pires de Lima ou queira estar noutro sítio que não aqui. Porque não é uma questão de preciosismo, é uma questão de comunidade", insistiu Bruno Costa, receando uma "divisão" da comunidade artística.
A solução "temporária" poderá, no entanto, não durar muito mais do que um mês. Isto porque, a 8 de setembro termina o prazo do processo de licenciamento do edifício que está em curso. Para o presidente da Alma Stop, "este é um assunto muito, muito sério e grave". "E como tal, nós não podemos tomar decisões impulsivas. Ainda estamos a debater o que vamos fazer entre os músicos se acontecer algo desse género", compromentendo-se, a "na devida altura", apresentar "propostas e ideias".
Algumas queixas de ruído serão legítimas, "outras não"
Com um sentimento "agridoce", por achar "que isto é o princípio de alguma mudança", Tiago Dinis, da Associação Cultural de Músicos do Stop, nota, no entanto, que no edifício "não mudou nada". "O que mudou foi que os músicos podem voltar a ter os seus ensaios e trabalhar, embora não a 100%, mas pelo menos a poderem fazer o seu trabalho e poderem garantir a qualidade dos espetáculos e as gravações que existem aqui no centro", referiu ao JN.
Quanto ao somatório de 594 queixas de ruído, o músico nota que "se uma pessoa quiser ligar todos os dias, pode ligar e essa queixa entra", desconfiando se são "fundamentadas ou não". "Acredito que algumas sejam legítimas, mas também acredito que muitas não", afirma.
"Acho que isto é a primeira fase de um novo mundo Stop", perspetiva o músico, considerando, no entanto, a alternativa da Escola Pires de Lima como uma "boa solução".