Sem descendentes a querer seguir o negócio, as três filhas do fundador da pastelaria dos "barquinhos" decidiram encerrar a partir de domingo.
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"Há pessoas que entram aqui com as lágrimas nos olhos a pedir-nos para não fechar. Recebi telefonemas de Madrid, França, S. Paulo", conta Filomena Campos, também ela sem conseguir conter a emoção. A Riba-mar, ali, no largo David Alves, a dois passos do Cine-teatro Garrett, no coração da Póvoa de Varzim, vai fechar as portas, depois de 52 anos a adoçar os dias dos poveiros. A pastelaria dos "barquinhos" é uma das mais antigas da cidade.
"Há clientes que andaram comigo ao colo e outros que fui eu que andei com eles ao colo e, agora, já vêm cá fazer os bolos de aniversário dos filhos. Não são clientes são amigos", continua a contar a filha mais velha de Francisco Campos.
O pai, hoje com 92 anos, começou na pastelaria em Famalicão. Abriu a Riba-mar em 1971. As receitas são todas dele e tudo é feito ali, das massas aos ovos moles, do doce de chila ao chantilly. Margarida, Ludovina e Filomena cresceram ali e todas passaram fins de semana, férias e verões a servir. Hoje, já só Filomena trabalha a tempo inteiro na pastelaria, mas a ligação afetiva à Riba-mar é de todos, filhos e netos. Os empregados - 12 - têm todos mais de dez anos de casa e há mesmo quem tenha 50.
"O prédio foi vendido e o senhor propôs-nos adquirir o negócio. Os nossos filhos estão todos licenciados e ninguém quer seguir isto. Andei meses a matutar e, agora, decidi que estava na altura, que queria era tomar conta dos meus netos e aproveitar a vida", explica Filomena, frisando que a decisão "nada teve a ver com dinheiro". A renda já ultrapassa em muito os mil euros. O prédio ia sofrer obras é certo, mas, depois, a Riba-mar podia voltar. A questão foi mesmo "pessoal".
Certo é que, desde que, ontem, publicou a notícia no facebook, não faz outra coisa senão atender clientes "em choque". E, com o último dia da Riba-mar marcado para domingo, as encomendas são "às dezenas" e não param de crescer: "Quilos e quilos de húngaros, barquinhos, natas, empadas, rissóis, eu sei lá".
"Ainda nem acredito!", atira uma cliente ao balcão. Filomena lá vai dizendo que é "um ciclo que se fecha". Despede-se com um "até sempre". Diz que ainda não caiu em si, mas olha o neto mais novo - Francisco como o avô - e suspira: "Ele já não vai conhecer os barquinhos".
Os famosos barquinhos
É um pequeno bolo em forma de barco, feito de bolacha, recheado com ovos moles e coberto com chocolate. Na vela de papel, traz uma quadra alusiva à Póvoa. São os barquinhos um dos bolos mais famosos da Riba-mar. O pastel Riba-mar - um amanteigado com fruta cristalizada e açucar - os húngaros, as natas, as sardinhas com chila, os salgados, o bolo-rei e o pão de ló completam a lista dos mais pedidos;
52 anos de amor e dedicação
"Foi com amor e dedicação que estendemos cada massa, tratamos de cada fornada e vos servimos cada bolo ou café. Obrigada por nos terem permitido fazer parte dos momentos mais especiais das vossas vidas", diz a mensagem com que as três irmãs se despedem dos clientes