A procura por uma vida melhor e por mais segurança uniu estes cinco imigrantes no Porto. Atravessaram o Atlântico, deixaram amigos e família e trouxeram a bagagem cheia de sonhos. Mas não estão sós.
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São, de longe, a maior comunidade estrangeira no Porto. No distrito, vivem, segundo dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, 27 496 cidadãos brasileiros, quase metade dos 55 473 estrangeiros radicados na região. Na cidade, há 8307 entre os 18 950 residentes de outras nacionalidades. E estes números dizem respeito apenas à contagem oficial, ou seja, àqueles que têm a situação regularizada.
1. Vanessa Moreira
"Situação no Brasil complicou-se"
Vanessa Moreira, de 31 anos, trocou o verão do Rio de Janeiro pelo clima ameno de Portugal. A carioca desembarcou no Porto para fugir da violência na sua cidade natal. "A situação no Brasil complicou-se em termos de violência e isso motivou-me a melhorar a minha vida. Eu sempre tive vontade de empreender e vim para Portugal com essa vontade", contou. Vanessa é formada em contabilidade, reside no Porto há quatro anos, mas nunca chegou a exercer aqui a profissão para a qual estudou.
Há um ano, abriu em Portugal um "pedacinho do Brasil": é proprietária da churrascaria BBQing, local conhecido sobretudo pelas espetadas brasileiras, em Vila Nova de Gaia. "Conheci os responsáveis pela marca e interessei-me, por gostar e identificar-me com a área da restauração. A questão das espetadas, algo muito comum no Brasil, aqui tornou-se um conceito inovador e achei que valia a pena apostar", afirmou.
A falta da família e amigos é algo comum entre os muitos estrangeiros que vivem no Porto, mas a comunidade brasileira está cada vez mais a conseguir manter o "jeitinho brasileiro" em Portugal. "A comunidade acolhe-nos e faz-nos sentir mais perto da nossa cultura", sublinhou Vanessa Moreira.
2. Wesley Bezz
"Peguei nos meus dois reais e vim"
O sonho de mudar de vida e fazer comédia fora do Brasil trouxe Wesley Bezz para Portugal. Formado em logística, faz vídeos para o Youtube, Instagram e TikTok, relatando a sua visão da diferença cultural entre Brasil e Portugal, em tom satírico. "Peguei nos meus dois reais [moeda brasileira] e vim para Portugal", ironizou Wesley.
O comediante, de 29 anos, tinha o desejo de comprar uma casa no Brasil para viver com a companheira. Só que ficou desiludido depois de a vendedora lhe ter dito que "a namorada precisava ganhar tanto quanto ele". No Porto há três anos, Wesley é barista e faz comédia nos tempos livres. No entanto, o seu desejo é viver da internet. "Já fazia vídeos no Brasil, mas lá não tinha grande número de seguidores, foi a trabalhar num bar que comecei a fazer mais comédia com as diferenças entre os dois países. Acabei por ver tantas situações que aproveitei e começou a dar certo. Mas ainda não consigo viver só da internet, por isso, abandonar o meu trabalho, para já, está fora de questão", observou.
Apesar da estar integrado no nosso país, Wesley já sofreu na pele aquilo que considera ser a discriminação para quem vem de fora. O episódio, que não esquece, aconteceu durante uma viagem a Aveiro com amigos: foi barrado pelo dono de um bar quando pediu para usar a casa de banho. "Quando eu disse que queria ser cliente deixaram-me entrar. Mas, ainda assim, conseguia ouvir comentários xenófobos sobre a minha nacionalidade, que não pararam até eu sair do bar", recordou Wesley Bezz.
Segundo o relatório anual da Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial (CICDR) 26,7% das queixas recebidas no ano passado são de cidadãos com nacionalidade brasileira.
As queixas de discriminação contra brasileiros tiveram um crescimento em Portugal, comparando aos últimos dois anos, de acordo com o mesmo documento. Em 2020, por exemplo, foram registadas 96 denúncias, 13,5% a mais do que no ano anterior, acrescenta o relatório anual da referida comissão.
3. Silmara chaves
"Queria uma coisa nova"
A vontade de viver um novo desafio fez Silmara Chaves, de 31 anos, deixar o Rio de Janeiro e embarcar numa aventura rumo a Portugal. "Eu estava na melhor época da minha carreira quando decidi mudar-me para Portugal, queria uma coisa nova", contou.
Silmara tem formação em Educação Física e conquistou bastantes seguidores nas redes sociais depois da publicação de um vídeo no Instagram a dançar na Ponte Luís I.
Nestes quatro anos a viver no Porto, começou a dar aulas de dança, mas agora está focada na sua carreira em marketing digital. Silmara Chaves foi responsável pelo primeiro workshop de Aline, uma das bailarinas da estrela brasileira Anitta. Atualmente, está envolvida num novo projeto com as bailarinas da cantora e na escrita do seu livro biográfico.
4. ingrid bello
"Cansámo-nos de tanta violência"
Tal como muitos outros compatriotas, foram a falta de segurança e a violência do Rio de Janeiro que levaram Ingrid e a família a escolher Portugal para viver. A engenheira de produção vive no Porto há quatro anos e é a responsável pela agência de viagens online "5 Cantos".
"Cansámo-nos de tanta violência. Escondíamo-nos em casa com medo que acontecesse alguma coisa. Os únicos momentos de lazer era quando viajávamos, tendo daí surgido a nossa paixão por viagens", relatou. Ingrid Bello chegou a Portugal com o intuito de empreender um negócio e já criou, com o marido, a agência online, através da qual ajudam pessoas a escolher os melhores destinos e roteiros de viagem.
5. isadora Rinelli
"A vida circense é a minha paixão"
Coragem ou "falta de noção" - uma destas razões levou Isadora Rinelli a embarcar num avião há quatro anos e aterrar no Porto. A paulista é uma artista de 31 anos que também comprou o bilhete para Portugal na sequência do descontentamento com o cenário político do seu país: "Já imaginava que o futuro do Brasil não seria promissor e eu sou artista desde criança".
A artista embarcou nesta aventura para mostrar um pouco do seu talento no Porto, cidade pela qual se diz apaixonada. Isadora canta mas também faz alguns espetáculos com malabares (incluindo facas) em alguns dos pontos mais emblemáticos da cidade Porto e tem sido bem reconhecida pela sua arte.
"Comecei a tocar violão e a cantar muito nova e aos 25 anos o circo apareceu para mudar a minha vida. Hoje, a vida circense é a minha paixão", afirmou Isadora Rinelli, que deixa uma mensagem de inspiração para os outros brasileiros que vivem no Porto: "Respira que nada é permanente, se está a passar por uma grande dificuldade saiba que grandes alegrias virão. Se sonhou chegar aqui respira somente, confie que isso passa. Às vezes precisamos de ter um olhar mais otimista e sonhador e se nos apegarmos às coisas que dão errado, não saímos do lugar."
"Se fosse fácil nenhum de nós teria saído do Brasil. O mais difícil ainda está por fazer, então, tenha paciência e siga o seu sonho que a sua hora chegará", concluiu Isadora.