As vespas-asiáticas estão a alarmar o Porto, o distrito do país onde foi detetado o maior número de ninhos. Até agosto, o Serviço da Proteção da Natureza e do Ambiente da GNR registou 133 denúncias de avistamento ou presença de vespeiros, indicadores que pecam por defeito, já que várias entidades respondem a estas denúncias.
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Os alertas multiplicam-se, mas muitas vezes as populações esperam várias semanas até que a situação seja resolvida. Em todo o país, registaram-se, recentemente e em pouco mais de um mês, quatros casos mortais ligados a picadas de vespas.
Há relatos de ninhos em praticamente todos os concelhos do Grande Porto e são muitas as críticas à falta de atuação por parte das autoridades. Em Gondomar, os moradores estão em alerta constante devido a um ninho de vespas que se formou numas árvores no meio de dezenas de casas. A Proteção Civil já os informou que "têm de esperar porque há situações prioritárias", como ninhos perto de escolas ou de lares de idosos.
"Demos pela presença do ninho há cerca de 15 dias e de um dia para o outro já tinham o favo construído", conta Joaquim Coelho, 71 anos, que mora na Rua Frei Luís de Sousa, em Gondomar. Na zona habitacional são muitos os que já têm idade avançada e "a preocupação é da vizinhança em geral". "Há uma vizinha idosa, com 86 anos, que vai dar uma volta maior para não passar na rua com o ninho", explica Joaquim. "Se tiver de fugir, não tem forças."
O veneno das vespas-asiáticas é menos complexo do que o das abelhas. Por isso, explica José Grosso-Silva, investigador no Museu de História Natural e da Ciência da Universidade do Porto, é menos provável que se gerem reações alérgicas. Mas a possibilidade existe. "Os casos graves e mesmo mortais que se têm verificado relacionam-se, em princípio, com situações de picadas múltiplas na face/cabeça, braços e mãos e a sua gravidade deve-se mais ao volume de veneno inoculado do que à toxicidade".
Atraso nas respostas
Já foram vários os moradores a ligar para a Proteção Civil, adianta Telmo Ribeiro, também residente em Gondomar. "Liguei para a Proteção Civil esta semana e disseram que o caso está referenciado, mas que estamos em lista de espera porque há ninhos perto de escolas e de jardins de infância que têm prioridade".
A realidade, explica Marco Martins, presidente da Comissão Distrital de Proteção Civil e presidente da Câmara de Gondomar, "é que nos últimos dois meses houve um "boom" de vespas asiáticas, mas o ninho é analisado em 24 horas, a partir do momento da denúncia", adianta. Ainda assim, o autarca salvaguarda que efetivamente há um atraso na remoção dos ninhos porque "existe um sistema de hierarquização das denúncias".
Em Gaia, o cenário repete-se. Os Bombeiros Sapadores não têm mãos a medir. Este ano, já eliminaram 402 ninhos de vespas-asiáticas. "Em face do crescimento exponencial do número de solicitações das últimas semanas é natural que exista algum atraso na análise e resolução das situações reportadas", explicou o comandante dos Bombeiros Sapadores e Proteção Civil de Gaia, Vítor Primo. Além disso, "a eliminação pelo uso do fogo esteve bastante condicionada nas últimas semanas por razões de ordem operacional e pela vigência dos estados de alerta", acrescentou.
As denúncias feitas junto da Proteção Civil são depois encaminhadas para as entidades ou serviços municipais respetivos. Só o Serviço da Proteção da Natureza e do Ambiente da GNR registou 133 denúncias no Porto, 92 em Braga, 60 em Viseu, 53 em Aveiro 50 em Coimbra.
Colmeias
Quando, em agosto de 2011, apareceram num apiário em S. Salvador da Torre, Viana do Castelo, "umas vespas diferentes na cor e no tamanho", o apicultor Nuno Amaro temeu o pior. Já tinha ouvido falar da vespa-velutina, conhecida por asiática, devido à sua procedência. Uma espécie predadora e invasora "com a cabeça amarela, tórax e abdómen negros, com o ponto do abdómen amarelado e patas muito compridas".
Muniu-se de armadilhas rudimentares, "feitas com garrafas de plástico e funis invertidos, com uma mistura de cerveja, groselha e vinho branco para as atrair", para proteger as suas colónias de abelhas melíferas. E para não ser chamado de "maluco", guardou alguns exemplares conservados em álcool. A Associação Apícola do Minho (APIMIL), à qual pertencia, reportou o caso, como sendo o primeiro em território nacional, ao entomólogo José Manuel Grosso-Silva, do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos, da Universidade do Porto. E o investigador sentenciou (ver caixa): "Portugal vai ter de viver com a vespa-asiática".
Oito anos depois, Nuno Amaro, lamenta: "Ao início não fomos levados muito a sério, mesmo por colegas apicultores. Diziam para nos preocuparmos com a varroa (ácaro que infesta as abelhas). Descurou-se a vespa-asiática".
"A praga está completamente instalada. É impossível erradicar. Vai ser um problema para as gerações vindouras, porque veio para ficar. Se tivessem sido tomadas medidas quando foi detetada, o impacto seria menor", comenta.
Nuno Amaro continua a produzir mel em Viana do Castelo, com um sócio e protege a produção das invasoras com um método natural. "A vespa ataca e destrói colmeias fracas. O que fazemos é investir para manter as colónias fortes e sãs", afirma. "Houve uma evolução e as próprias abelhas parece que estão a querer desenvolver mecanismos de defesa".