"Não havia necessidade. Com uma manhã tão escorridinha, tinha agora de chover?" O protesto de Fátima Rebelo tinha razão de ser. São Pedro fez acreditar que não mandaria chuva no dia da Senhora dos Remédios. Puro engano. Os muitos milhares que ontem acorreram a Lamego para ver a procissão acabaram por sair molhados. Porém, nada que perturbe a fé de quem vem de longe, por devoção ou para cumprir promessa.<br />
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É uma e outra que movem Maria José Teixeira, residente na freguesia de Castelões, em Penafiel. Chegou manhã cedo e só regressou ao final do dia. Há quatro anos que é assim no dia oito de Setembro. "A minha filha de 30 anos luta há nove com uma doença grave, um linfoma", explicou, ao JN, junto à Igreja das Chagas, de onde partiu a procissão. "Prometi à Nossa Senhora dos Remédios que se ela quisesse ajudar-me, todos os anos neste dia eu estaria aqui, sozinha, de manhã à noite". No regaço, um arranjo de tantas rosas brancas quantos anos tem a filha. No final na procissão colocou o ramo no andor e repetiu a frase que tem feito parte do seu quotidiano: "Ó Senhora dos Remédios, tens o remédio na mão, tens o remédio da vida e da salvação".
A fé de Maria José Teixeira seguiu com ela na cauda da procissão, ao longo de mais de três quilómetros. À frente do andor da Senhora dos Remédios seguiam outras fés vestidas à padroeira. As duas de Lamego. A de Sónia Lourenço que foi "por promessa mas também por gosto", não obstante as dores de costas que já levava. A origem estava no colo coberto com o manto, de onde se vislumbrava a cabecita da sua bebé de cinco meses. Ao lado, Sandra Rodrigues carregava nos braços o menino Jesus. Pelo terceiro ano consecutivo. "Para que nossa senhora nos ajude a todos. Não gosto de pedir só para mim".
Alheios a estas manifestações de fé, os miúdos que enfeitam o barco em que viaja a Senhora dos Remédios, cerca de duas dezenas, divertiam-se. "Ó topa, topa?" As palavras imperfeitas de José António, quatro anos, tentava provocar uns dos tropas, um dos vários Rangers que sempre acompanham, ao lado, o andor que é, tal como todos os outros, puxados por juntas de bois.
As duas que levavam a padroeira eram de Mouçós, em Vila Real, mais pequenos e escuros. Nos andores da frente uns gigantescos bois de raça galega, que Joaquim Moreira voltou a transportar de Santiago de Subarrifana, em Penafiel. "Por uma das juntas, a do carriço e do pardal, já me davam 15 mil euros, mas eu não os entreguei porque os queria trazer aqui".
Pelas sete juntas de bois que puxam os andores da procissão, a Irmandade da Senhora dos Remédios paga "mais de cinco mil euros", salientou o padre Fernando Albano. Um cortejo em que participaram ontem cerca de 1500 pessoas, sendo que 300 são figurantes bíblicos. "Nos últimos tempos temos tido uma grande adesão de adultos, por isso as crianças são cerca de 20%".
A procissão é o ponto alto das festas de Lamego, que têm 15 dias de duração. O presidente da Câmara, Francisco Lopes, rejeita que este ano tenham sido mais fracas, apesar de ter reduzido o orçamento de 350 mil para 250 mil euros. "Não é a maior ou menor relevância dos nomes escolhidos para a animação musical que faz a grandiosidade das festas", sublinhou.