Ruas da Foz cheias de gente para ver passar o tradicional desfile dos trajes de papel
Do Jardim das Sobreiras, junto à Cantareia, até à praia do Ourigo. No trajeto de quase dois quilómetros, o público tentou encontrar o melhor lugar para ver passar o cortejo dos trajes de papel, que este domingo voltou a encher as ruas de cor.
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Ainda o dia amanhecia calmo, junto ao bairro da Rainha Dona Leonor, e já vários figurantes se concentravam à porta da Escola Paulo da Gama.
Com grande parte do trânsito condicionado na Foz, muitos optaram por deixar os carros ali nas imediações e descer até à marginal.
O relógio ainda não marcava 9.30 horas e apenas se avistava a Banda Marcial da Foz do Douro e elementos do Orfeão da Foz, que "transportaram" os vinhedos do Douro para o cortejo.
Ana Picarote, nove anos, bisneta de Joaquim Picarote - um dos fundadores do desfile, que deu um novo fôlego em 1963 à tradição - caminhava cuidadosa para não estragar o adorno dos chinelos. Desde o ano passado que a mãe, Francisca, 42 anos, acompanhada pelo marido, Hugo Pereira, de 49, faz questão de levar a filha ao cortejo. "Vir e participar é cumprir uma tradição que o meu avô tudo fez para a preservar", disse, orgulhosa.
Entre um pormenor ou outro, e com o tema do Douro Vinhateiro, até ramadas rasteiras o Orfeão da Foz fez desfilar pelas ruas. E para o público que chegou a duvidar, alguém confirmou que até os cestos, "que mais pareciam feitos de vime", eram também de papel.
Manuel Picarote, que há 60 anos desfilou à frente do pai no cortejo pela primeira vez, não escondeu a emoção de este domingo voltar a cumprir a tradição do pai: "Até chegar aqui ao desfile, fiz questão de passar na rua onde morávamos e hoje aqui estou para o homenagear". Pouco antes das 13 horas, o confrade do Vinho do Porto - assim Manuel ia vestido - haveria de o desfazer no tradicional banho santo.
Fado abriu desfile
Com uma hora de atraso - com a justificação do presidente da União de Freguesias de Aldoar, Foz do Douro e Nevogilde, Tiago Mayan, de que "a logística com tantos figurantes acaba por ser complicada" - o cortejo lá arrancou da Cantareira por volta das 11 horas.
Foi, aliás, o autarca que juntamente com Sofia César Machado - encarnando as figuras de Carlos do Carmo e Amália Rodrigues - teve a honra de abrir o desfile.
"É um orgulho e uma responsabilidade enorme", confidenciou Sofia ao JN, enquanto de braços abertos - como Amália - pedia "palminhas" ao público e distribuia uns "obrigado, obrigado, obrigado".
E se ao passar junto ao Instituto de Socorros a Náufragos se avistavam algumas clareiras entre o público, à chegada à zona da Esplanada do Castelo, onde estava a tribuna dos convidados, o cortejo acabou por engolido por milhares de pessoas.
Foi precisamente neste local, que a fadista Patrícia Costa, assumindo o papel da Severa, e acompanhada por um grupo de cantadeiras trajadas com fatos feitos de papel de jornal, cedidos pelo Jornal de Notícias, cantou e recebeu uma grande ovação. Nem com o Coliseu lotado teria tanta a gente a assistir....
Até os hóspedes do Hotel Boavista aproveitaram as vistas do terraço para fotografar o cortejo.
Também ali na tribuna ficou-se a saber que o vestido da fadista Maria da Fé, figura encarnada por Maria Bandeira, demorou 180 horas a ser feito.
Ainda lá atrás, junto ao jardim do Passeio Alegre, Maria, de apenas dois anos, pedia colo pela primeira vez. A tia, Marlene Fonseca, 43 anos, moradora no bairro da Pasteleira, acabou por "arrastar" a mãe da menina, Cristina, para o cortejo, e Maria, também vestida toda de papel, acabou por atrair todas as atenções.
Ao som do grupo da Batucada Radical, o cortejo finalizou cheio de pujança, perto das 13 horas, no tradiconal "banho Santo".
"A água está ótima", desabafou Tiago Mayan, que logo virou costas, porque ainda faltavam dar "mais quatro mergulhos". Manda a tradição que têm de ser sete.
"Dizem que S. Bartolomeu está na água e que o diabo anda à solta", ouviu-se no areal.