Há seis anos que não nascia nenhuma criança na freguesia de Arcos de Valdevez. População dá as boas-vindas ao bebé com oferta de notas.
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Valentim Domingues de Sousa, nascido a 2 de maio de 2020, em plena pandemia, é "a luz dos olhos" da bisavó Amélia Afonso, de 80 anos, de Sistelo, Arcos de Valdevez. E também ilumina os dias da aldeia dos socalcos agrícolas, onde desde 2015 não nascia nenhuma criança. Vestida de preto da cabeça aos pés, "Ti Mélia", como é conhecida por todos na terra, alegra o lugar da Igreja (centro da freguesia) quando passeia o bisneto no carrinho, pelos caminhos de pedra.
"Ainda há de vir a moça. Queremos uma moça agora. Na família só há uma e Sistelo precisa de gente. Temos pouca. Os velhos morrem e novos também há poucos", comenta Amélia, contando que nem sempre a aldeia que a viu nascer foi despovoada. "Antigamente, nascia gentinha a mais, Deus me perdoe. Qualquer mulher tinha nove, 12 filhos".
Antes do sexto bisneto da "Ti Mélia", o único que esta tem junto a si, porque os outros "estão na América e em Paredes de Coura", tinham nascido, há seis anos, um rapaz, Afonso, e há 11 outro com mesmo nome, filho do presidente da Junta. Enquanto isso, a população envelhecida vai minguando.
Segundo o autarca Sérgio Rodrigues, que já contribuiu para a natalidade, "70% dos habitantes de Sistelo tem acima de 65 anos". E em 2020, morreram seis, em 2019 outros tantos e em 2018, cinco.
"É uma problemática das aldeias do mundo rural. O despovoamento está à vista de toda a gente. Ainda não se criaram políticas efetivas para apoiar a natalidade. Não estou a falar daqueles apoios diretos, os tais vales, mas de condições para os casais pensarem em constituir família em zonas como Sistelo", afirma Sérgio Rodrigues ao Jornal de Notícias, referindo que, ainda assim, há na aldeia "sinais positivos" de que "a perda de população está a estancar".
Regresso à terra
Há dois anos, um casal de emigrantes, com uma filha de três, regressou à terra da Suíça. E, em breve, outro casal jovem "vai fixar residência e abrir um estabelecimento", numa freguesia que tem 210 habitantes.
Os pais de Valentim, Marco e Marlene, que perderam há pouco tempo a avó (com covid-19), estão a ajudar a rejuvenescer Sistelo. "Somos o casal mais novo e nascer uma criança é sempre bom", comenta o pai, referindo que a população alegra-se com o nascimento e mobiliza-se de forma espontânea para contribuir com uma espécie de "apoio à natalidade".
"Os mais velhos há muito que não viam um bebé e lá vêm com um envelope com uma notinha a dizer: "É para o menino"", conta o pai, brincando: "Se continuar assim, quando chegar aos 18 anos está rico". "As pessoas dão 10, 20, 50 euros. Aqui usam muito isso. Quando nasce uma criança, toda a gente dá uma notinha".