Habitantes de Alvações do Corgo e Vila Maior têm transportes públicos para a sede de concelho pela primeira vez.
Corpo do artigo
O dia acordou geado. Oito e meia da manhã e o termómetro pouco acima de zero. Junto à paragem do autocarro de Alvações do Corgo, Santa Marta de Penaguião, só gente à espera do padeiro. Ninguém para viajar até à sede de concelho no novo transporte público. Novo e primeiro, pois nunca outro tiveram.
"O pessoal ainda não se habituou", comenta um dos presentes. Meia hora depois, chega o autocarro de 23 lugares da Auto Viação do Tâmega, empresa com a qual a Câmara chegou a acordo.
O motorista, Jacinto Costa, espreita pelo vidro embaciado. Uma jovem vem a correr rua acima, esbaforida. "Este não é o que vai para Vila Real, minha filha!", berra-lhe uma das do pão. E ela, a miúda, detendo-se, a sorrir, exclama: "Ah! Estava a ver que morria!".
E pronto, sem outros passageiros, os autores desta reportagem sobem à boleia até aos altos de Alvações. Na Rua do Supitate, Duarte Pinto, 19 anos, levanta a mão esquerda e faz paragem. "Vou ao dentista", justifica.
Jacinto emite o bilhete de 2,60 euros e dá a volta. "Há gente que prefere esperar na paragem do centro da aldeia, sempre poupa 25 cêntimos. Em duas vezes quase dá para o café", diz o homem do volante, 40 anos de experiência em autocarros grandes e pequenos. E bem precisa dela, pois Alvações cresceu sem cuidar que uma "enormidade" como um autocarro de 23 lugares alguma vez haveria de passar na rua principal, onde também se aparcam carros com pouco zelo. Isto sem contar com os apertos de paredes de casas logo à entrada de Vila Maior, a outra aldeia mais à frente também servida por esta nova carreira.
Credos na boca
"Se passo com a frente bato com a traseira, para passar a traseira bato com a frente", protesta Jacinto Costa contra o que chama de "cancrozinho". Mas passa. Tal como se passa na estrada que une as aldeias, de tal forma apertada que obriga a ter a uma boa quantidade de credos na boca de quem nela se estreia, sempre a rezar para que de lá não venha outro carro, a adivinhar o bom e o bonito para se cruzarem.
Em Vila Maior entra Amândio de Carvalho, 71 anos. Vai a uma consulta. Paga 2,10 euros pelo bilhete. "Isto é uma coisa muito boa. Com os cinco euros que pagava ao carro de praça vou, venho e ainda sobra". Mais à frente sobem Rosa Fernandes, 75 anos, e António Pinto, 79. "Vamos de autocarro à vila buscar dinheiro". Jacinto recebe 4,20 euros pelos dois. "Já não vem mais ninguém", conforma-se, enquanto acelera curvas fora até à vila.
Entre as 12 e as 13 horas fará a viagem de regresso.