Juízes do Tribunal de Contas (TC) consideram que a transportadora fluvial fez um negócio, de 52,4 milhões de euros, lesivo para o Estado e enviam conclusões para o Ministério Público, para apurar responsabilidades financeiras e criminais dos gestores da Transtejo. As baterias seriam compradas à parte por 15 milhões.
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"É como um automóvel sem motor, uma moto sem rodas ou uma bicicleta sem pedais" - esta foi uma das considerações que o Tribunal de Contas utilizou na análise que fez à aquisição de dez embarcações elétricas sem baterias pela Transtejo. Os navios de transporte de passageiros no Tejo - empresa do Estado que faz serviços de ferry no rio Tejo, em Lisboa - custaram 52, 4 milhões de euros e as baterias seriam compradas à parte por 15 milhões, negócios que os juízes não aceitaram e, por isso, pedem intervenção do Ministério Público.
Foi em 2021 que a empresa espanhola Astilleros Gondan S.A venceu o concurso internacional para a aquisição dos navios elétricos. Porém, as embarcações vieram sem baterias, situação que é vista pelos juízes como um negócio lesivo para o Estado e que merece críticas no acórdão conhecido esta quarta-feira e que foi citado pelo jornal "Público".
"O mesmo seria, com as devidas adaptações, comprar um automóvel sem motor, uma moto sem rodas ou uma bicicleta sem pedais"
"A Transtejo comprou um navio completo e nove navios incompletos, sem poderem funcionar, porque não estavam dotados de baterias necessárias para o efeito. O mesmo seria, com as devidas adaptações, comprar um automóvel sem motor, uma moto sem rodas ou uma bicicleta sem pedais, reservando-se para um procedimento posterior a sua aquisição. Na verdade, não se pode sequer falar em navios sem as baterias, como não se pode falar, por exemplo., em navios sem motor ou sem leme. Isto porque elas constituem uma parte integrante (ou seja, compõem) desses mesmos navios", pode ler-se num acórdão colocado online na quarta-feira.
Segundo o relatório, as baterias para os catamarãs seriam compradas à parte e a Transtejo optou pelo ajuste direto, um negócio paralelo que o Tribunal de Contas não aceitou, dado que teria um custo adicional de 15,5 milhões de euros e seria algo "lesivo do interesse público". A transportadora alegou que se trata de um equipamento de desgaste com vida útil inferior à dos barcos.
Segundo o "Público", quando foi submetido o visto prévio para aquisição dos navios elétricos, a Transtejo informou que iria lançar um novo concurso público para as baterias. Todavia, o tribunal acedeu a um contrato de ajuste direto à mesma empresa espanhola que tinha recebido a encomenda dos navios elétricos.
Os juízes acusam a transportadora fluvial de ter induzido em erro o Tribunal porque a empresa "tinha o perfeito conhecimento de que estava a faltar à verdade quando disse que iria recorrer a um concurso autónomo para o fornecimento de baterias".
No acórdão de 46 páginas, o TC levanta, por várias vezes, várias dúvidas e põe em causa a utilidade de um negócio nestes termos.
"O comportamento da Transtejo com a prática de um conjunto de sucessivas decisões que não são apenas economicamente irracionais, mas também ilegais, algumas com um elevado grau de gravidade", porque, sublinham os juízes, "atinge o interesse financeiro do Estado e tem elevado impacto social"