Imobiliária envia cartas a moradores para deixarem o Bairro da Quinta do Gama, no Porto. Advogado dos residentes alerta para "situação dramática".
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Trinta pessoas estão em risco de ficar sem casa, no Porto. Vivem há anos no Bairro da Quinta do Gama, no Bonfim, mas o proprietário enviou-lhes cartas para saírem e o advogado dos residentes, Francisco Sá Carneiro Sampaio, alerta o poder local para a "situação dramática" que está a ser gerada, pois "saindo não têm onde dormir".
Nuno Coelho, que vive no antigo bairro com a família e vai presidir à Comissão de Moradores, queixa-se de "bullying", ao referir-se a pressões para que deixem as habitações. Na campanha para as eleições autárquicas, PAN, CDU e BE já visitaram o local. A Câmara do Porto diz ter "reunido com o proprietário" e que "estão a ser analisadas possíveis soluções, nomeadamente no âmbito do programa "1.º direito", não obstante tratar-se de uma questão entre privados". O JN tentou contactar a empresa que enviou as cartas, MT3 Imobiliária, mas não obteve resposta.
"Sempre paguei as rendas", sublinha Nuno Coelho, descontente com o modo como têm sido tratados. "É a terra de ninguém. Estamos a ser vítimas de terrorismo habitacional. Deitaram abaixo um armazém e deixaram cá todo o cascalho. Não temos iluminação pública. Não vêm cá os lixeiros, nem os bombeiros", enumera.
"falsas promessas"
O vizinho Ernesto Duarte, conhecido no mundo artístico pelo nome de Barrako 27 e pelos trabalhos no hip hop, admite que não paga aluguer, mas ressalva ter gasto "cerca de 7000 euros em obras" e que não tem mais para onde ir.
Francisco Sá Carneiro Sampaio realça o facto de se tratar de "pessoas muito carenciadas" e que na iminência de um despejo "há uma questão local que urge resolver".
O advogado observa que há diferentes situações no bairro, que vão desde aqueles que têm contrato aos "ocupas", passando por quem se defende com vínculos que vêm dos antepassados. Os moradores que receberam cartas são aqueles que assinaram contratos em 2017. "Por falta de informação foram levados por falsas promessas que nunca se concretizaram. Há um erro de vício", considera, lamentando a ausência de aconselhamento jurídico na altura de rubricar aqueles documentos
"Como o bairro faz parte da Área de Reabilitação Urbana (ARU) do Bonfim, deve ser dada preferência na venda à Câmara do Porto, assim como aos arrendatários. Na ARU, qualquer venda de prédio urbano tem que ir à Câmara", faz notar, sobre a aquisição de frações do terreno por parte da imobiliária.
O advogado está a dar apoio na constituição da associação de moradores e promete contestar as cartas, assim como pedir uma reunião à Câmara.
PROJETO
Laboratório de Habitação pronto a colaborar
O Laboratório de Habitação Básica está a acompanhar o caso e disponível para auxiliar os residentes da Quinta do Gama, que tem entrada pela Rua de Barros Lima e vistas para a Igreja do Bonfim. Segundo Fernando Matos Rodrigues, do Laboratório, o objetivo é "travar a venda das casas" e levar a que a "Câmara do Porto se envolva no processo", de forma a acautelar os interesses das famílias que lá vivem. O Laboratório também está a ajudar a organizar a associação de moradores. Para a Quinta do Gama será elaborado um "projeto participativo, que poderá ou não ser utilizado, e que contará com a colaboração de estudantes de arquitetura".