Os populistas eurocéticos vão aumentar a sua presença no Parlamento Europeu após as eleições de maio de 2014 mas, com todas as diferenças que os separam, os partidos tradicionais vão continuar a dominar a tomada de decisões.
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Para Yves Bertoncini, diretor do "think tank" Notre Europe, do Instituto Jacques Delors, a questão chave nestas eleições é saber qual vai ser o equilíbrio de forças entre os dois principais grupos políticos: o Partido Popular Europeu (PPE, direita) e os Socialistas e Democratas (S&D, esquerda).
"Vai haver um crescimento dos partidos populistas e do número de deputados populistas. Mas esse aumento não vai mudar grande coisa", disse Bertoncini, contactado telefonicamente pela agência Lusa para Paris.
Atualmente, explicou, há no Parlamento Europeu (PE) entre 100 e 130 deputados de partidos populistas. Depois das eleições de maio, podem passar a 200, num plenário com um total de 751 lugares.
Esses deputados são contudo "uma família muito dividida", estão dispersos por quatro grupos diferentes, pelo que, o facto de serem mais, só "terá como resultado uma influência verbal, de protesto", porque "continuará a haver mais de 550 deputados 'clássicos' que vão dominar o PE".
"Pode discutir-se quem é populista e quem não é, mas o ponto comum entre os populistas relativamente à Europa é a oposição ao sistema político europeu. Só que por razões muito diferentes. A Esquerda Radical combate o ultra-liberalismo mas não a imigração, enquanto a extrema-direita centra-se mais na livre circulação de pessoas na Europa", explicou.
"O populismo é uma categoria para análise política, não é uma categoria de ação política (...) Se perguntar ao UKIP de Nigel Farage se tem algo em comum com Marine Le Pen vão dizer-lhe que não, que não são extrema-direita. Se perguntar à Izquierda Unida, de Espanha, se tem algo em comum com o Fidesz da Hungria, dir-lhe-ão 'claro que não'", exemplificou.
Bertoncini considerou que "não vai acontecer" a anunciada intenção dos partidos de extrema-direita de França e da Holanda de criar uma frente comum eurocética no PE e que os populistas continuarão divididos por três ou quatro grupos, com "o domínio a ser exercido pelos partidos não-populistas, mais tradicionais, que representam a esmagadora maioria das pessoas".
Mais importante, afirmou, é saber se os partidos tradicionais "vão incorporar algumas ideias populistas". Neste aspeto, sublinhou há ângulos e riscos diferentes.
"Diria que a influência na questão da zona euro será muito reduzida, porque há uma espécie de apoio popular à permanência no euro. Muitos povos não estão contentes -- devido a reformas estruturais muito difíceis, como em Portugal, ou devido aos resgates a outros países, como a Alemanha -, mas a esmagadora maioria pensa que voltar à moeda nacional ainda seria pior".
Já quanto às posições anti-imigração e anti livre circulação, "há um risco importante", como se viu com (o primeiro ministro britânico) David Cameron e o artigo que publicou defendendo uma revisão das regras da livre circulação.
Para Bertoncini, um aumento dos populistas não vai contudo ter influência na tomada de decisões no PE: "Não vai bloquear o PE. Vai até ter um efeito paradoxal de obrigar os partidos tradicionais a fazer mais compromissos", disse.
Dois terços das decisões tomadas, explicou resultam de acordos entre o PPE e o S&D, nalguns casos alargadas aos liberais ou a outros grupos.
Questionado sobre se prevê que o PPE se mantenha como maior grupo político após as eleições de maio, o especialista considera que "isso não é certo" e baseia-se na análise das "tendências" observáveis nos partidos nacionais que integram o PPE.
"A UMP francesa tinha 29 assentos e pode perder 10 deles. Em Itália, era o partido de Berlusconi nas últimas eleições. Elegeram 35, vão perder muitos. O mesmo se passa com a Polónia, Roménia, Espanha -- Rajoy vai perder lugares (...) Portanto, há uma tendência para que o PPE perca muitos assentos", disse.
Do lado do S&D, prosseguiu, "pode haver avanços em vários países": "Em França nem por isso, mas na Alemanha, um pouco, em Itália, um pouco, e especialmente no Reino Unido, onde o Labour (trabalhistas) pode duplicar o número de assentos".
"Seja como for, como vamos continuar a ver um PE governado por uma dinâmica de coligações, com a chamada grande coligação entre S&D e PPE mais equilibrada (...) E isto terá obviamente influência nas decisões tomadas pelo PE", concluiu.