O sucateiro Manuel Godinho, principal arguido no processo "Face Oculta" terá recorrido a empresas "não declarantes fiscais" e a empresas de "passagem de facturação" para branquear resíduos adquiridos de forma clandestina.
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A informação foi avançada pelo inspector tributário Benjamim Monteiro que foi ouvido esta quinta-feira como testemunha durante a 24.ª sessão do julgamento que está a decorrer no tribunal de Aveiro.
Benjamim Monteiro, que participou em buscas na empresa SCI, de Manuel Godinho, em Aveiro, deu conta de um intricado processo de "branqueamento de resíduos", envolvendo um conjunto de empresas pertencentes a João e Manuel Reis (pai e filho), que identificou como sendo "não declarantes fiscais".
Segundo o inspector, estas empresas terão emitido, entre 2005 e 2008, várias facturas falsas em nome das empresas de Manuel Godinho e dos sucateiros Manuel Nogueira Costa e Paulo Pereira Costa, coarguidos no processo, no valor de cerca de 40 milhões de euros, excluindo o IVA.
Benjamim Monteiro disse que estas empresas não tinham sustentação para aquele volume de facturação, concluindo que aquela facturação servia para "dar cobertura legal a resíduos obtidos de forma clandestina, ilegal", pelo empresário de Ovar.
O inspector referiu ainda que as empresas de Manuel Nogueira Costa e Paulo Pereira da Costa serviriam como empresas de "passagem de facturação", já que "tinham como fornecedores praticamente não só declarantes fiscais mas as vendas também eram, na sua maioria, para as empresas de Manuel Godinho".
Questionado pelo advogado Pedro Marinho Falcão, que defende Paulo Pereira da Costa, sobre se existia uma ascendência real de Manuel Godinho sobre o seu cliente, o inspector referiu que havia "uma partilha de interesses".
A testemunha realçou ainda que Paulo Pereira Costa "tinha acesso a uma quantidade infindável de resíduos de sucatas, fazendo muito pouco".
A sessão ficou ainda marcada por um requerimento da defesa de Manuel Nogueira Costa e Paulo Pereira da Costa a pedir que não fossem admitidos depoimentos sobre factos relacionados com o processo de alegada fraude fiscal, conhecido como 39/08, de onde foi extraída certidão que deu origem aos presentes autos, e que se encontra suspenso.
O juiz presidente Raul Cordeiro indeferiu o requerimento, afirmando que o depoimento da testemunha seria prestado "sem balizas pré-estabelecidas".
"Não há dúvida que, nestes autos, não estão em causa crimes de natureza fiscal. Mas tal não significa, a nosso ver, que não possam discutir-se em audiência e produzir-se elementos de prova que eventualmente tenham sido carreados para o 39/08", afirmou o magistrado.
O advogado Pedro Marinho Falcão voltou a insistir nesta questão, invocando uma nulidade processual, mas o juiz presidente reafirmou que não via qualquer nulidade na decisão tomada, limitando-se a pedir aos sujeitos processuais para direccionarem a instância para aquilo que tenha relevância neste caso. "Com isto não quer dizer que não se pode falar do outro processo", concluiu.
O julgamento prossegue na próxima terça-feira de Carnaval, de manhã, ainda com o depoimento do inspector Benjamim Monteiro.