Elevado a cardeal há um ano, Monteiro de Castro, 74 anos, participa pela primeira vez num conclave. Emociona-se quando fala de Bento XVI e diz que os portugueses não devem emigrar, mas ficar no país, que tem de apostar na exportação.
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De que forma este novo momento da Igreja pode ser interpretado?
Creio que o Santo Padre tomou uma decisão bem pensada, nobre. Uma decisão de uma pessoa que vê o que é a Igreja hoje e aquilo que ela necessita do Papa. O estado dele, de saúde, não permite dar uma resposta adequada àquilo que se pede da Igreja. Se pensarmos o que era o Papa há 100 anos ou há 50 anos e o que é hoje vemos a diferença, que é enorme. O Papa deixou-nos uma riqueza enorme em escritos. Considero que são os mais importantes de todo o século XX e desta parte do século XXI.
A despedida de Bento XVI aos cardeais foi um momento marcante?
Foi. Estavam muitos bispos, porque tinham vindo de todo o Mundo. Eram mais de 100 e o Papa recebeu um por um...
Deixou alguma palavra especial ao Papa?
Claro que deixei e por muitos motivos. Primeiro, porque nunca pensei chegar onde cheguei. Como sabem, no ano 2000, quando terminei o meu serviço diplomático, pedi para regressar à minha terra [emociona-se e as lágrimas vêm-lhe aos olhos].
É com muita emoção que recorda este Papa?
Sim... por um motivo ou outro estava muito ligado a ele. Há um mês fui ao jardim do Vaticano, onde está a imagem de Nossa Senhora, e a polícia disse-me: "Olhe que o Papa está a chegar". Então eu retirei-me um bocadinho e passou o carro. O Papa parou o carro e veio saudar-me e falar um pouco: aí já revela quem ele é! Conversamos um bocadinho. É uma pessoa extraordinária e com uma capacidade intelectual fora do normal e que conseguiu unir as religiões, que isso é sumamente importante. O Papa procurou unir o Mundo inteiro. Como ele diz muitas vezes: devemos pensar como cristãos, que temos Deus, que Deus é pai e que é pai de todos nós.
Participa pela primeira vez num conclave. Como estão as suas emoções?
Naturalmente estamos abertos ao Mundo e aí vamos ver. Aí o Senhor nos ajudará. E só aí é que vamos saber e vamos ver o que é que o Senhor nos inspira.
Como é fazer parte deste processo?
Se me perguntasse se há algum cardeal que devia ser Papa, talvez eu lhe pudesse dizer que creio que não há nenhum. Se é nomeado, não importa quem seja, ele vai aceitar. Porque nós quando nos ordenamos sacerdotes foi para servir e não para ser servido. Foi para servir a Igreja. Não importa onde, nem quando, nem como.
Que Papa é que a Igreja e o Mundo precisam?
O Senhor é que sabe. Porque nós pensamos que sabemos, mas Ele sabe mais do que nós. Nós vamos rezar um pouco e depois se verá.
O conclave pode ser marcado entretanto?
Com este "modu proprio" do Santo Padre [que permite antecipar o conclave] ficou aberto aos cardeais. É certo que já aqui estão cardeais de países muito distantes e para eles seria muito melhor fazermos a reunião já.
Vieram muitos cardeais para a despedida do Papa?
Sim, mas mais de metade deles não tem voto. Com voto somos 115. Os eleitores ainda não estão cá todos.
Olhando agora para Portugal e para o momento que o país atravessa. Urge esperança?
Sim. Em Portugal temos de nos unir todos, procurar melhorar a situação dos portugueses. Um dos pontos muito importantes é que trabalhem em Portugal e não no estrangeiro. E depois temos de dar mais valor àquilo que temos, porque dá pena quando chegamos a Portugal, vamos a uma parte e começamos a ver que tudo o que temos é comprado, não é português. Isso dá pena. Quando eu estudava em Braga, tínhamos diversas coisas, agora é tudo comprado. As nossas fábricas sofreram muito depois do 25 de Abril.
Devíamos apostar mais no país?
Uma coisa é certa, onde os portugueses vão há gente que fica contente. Estive muitos vezes em Paris com o presidente do Governo e ele dizia-me sempre: "Olhe, aqui melhor gente que a portuguesa não temos". Mas o que precisamos é que os portugueses trabalhem em Portugal e que o país exporte.
Vamos sair da crise?
Sim, sim. É uma questão de tempo, e depois também de melhor orientação. Agora temos de ter presente aquilo que somos, 11 milhões de habitantes. Não podemos ter as mesmas estruturas que um país que tem 180 milhões.