Esta quarta-feira, o Parlamento discutiu e fez a votação final global do Orçamento do Estado (OE) para 2024, aprovado apenas pelo PS (PAN e Livre abstiveram-se). Em vésperas de eleições, os partidos já falaram para os repetivos eleitorados. O PSD alertou contra o "radical, impreparado e impulsivo" Pedro Nuno Santos.
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Em jeito de despedida de António Costa, o líder parlamentar do PSD, Joaquim Miranda Sarmento, lembrou um Governo que, embora dispusesse de maioria absoluta no Parlamento, se enredou "em escândalos, casos e trapalhadas". "Se vamos para eleições, isso é da inteira culpa e responsabilidade do dr. António Costa e do PS, que desbarataram o mandato conferido pelos portugueses", referiu.
Miranda Sarmento acusou o primeiro-ministro de ter revelado falta de "bom-senso", nomeadamente por se ter rodeado de Vítor Escária e Lacerda Machado, por ter segurado o ministro João Galamba ou por ter criado guerras com o presidente da República, "fazendo um favor aos populistas". Esta última observação arrancou palmas da bancada do PSD.
"Escusam de inventar desculpas mal amanhadas sobre parágrafos e comunicados", insistiu o deputado laranja, aludindo ao texto da Procuradoria-Geral da República que motivou a demissão do primeiro-ministro. "O dr. António Costa demitiu-se por uma razão: o seu Governo ruiu por dentro, envolto em casos mal explicados", completou.
Sobre o Orçamento, Miranda Sarmento salientou quatro "pecados" principais: fraco crescimento económico, "voragem fiscal", baixo investimento público e degradação dos serviços públicos. Considerou também que o recuo do PS no IUC, depois de o partido ter descrito a medida como ambientalmente justa, foi "puro oportunismo político e eleitoralismo barato".
Com o aproximar da ida às urnas, o social-democrata atirou ainda a Pedro Nuno Santos, candidato à liderança do PS. Descrevendo-o como "radical, impreparado e impulsivo", considerou que um Governo liderado por ele seria "ainda mais trágico" do que os anteriores Executivos socialistas.
Costa: estabilidade orçamental deixa país com mais "liberdade de escolhas políticas"
No final da sessão, António Costa - que se manteve em silêncio durante o debate - fez uma breve declaração aos jornalistas. Procurando realçar os méritos dos seus governos, referiu que, desde 2015, foi possível virar "a página da austeridade" e controlar o défice.
Desse modo, segundo o primeiro-ministro, foi possível fazer com que o país chegasse à atual "situação de sólida e tranquila estabilidade orçamental", que "aumenta as liberdades das escolhas políticas" e favorece uma "trajetória de continuada melhoria". "Foram oito anos de convergência com a União Europeia, como não acontecia desde o início do século", acrescentou.
No debate, o ministro das Finanças, Fernando Medina, lembrou Paul Krugman - Nobel da Economia que, recentemente, disse que Portugal é um "milagre económico" - e defendeu que o "sucesso" do Governo "assentou na destruição dos pilares fundamentais" das políticas da Direita. Ao mesmo tempo, insistiu na necessidade das contas certas - que disse não serem "um capricho", mas sim condição para a prosperidade.
Chega diz que PS foi "vítima" de si próprio, IL diz "'hasta la vista'" a Costa
André Ventura, do Chega, começou por lembrar a António Costa que "ninguém o demitiu"; o primeiro-ministro é que saiu devido a "um escândalo de compadrio e corrupção". "O que é irónico e curioso é que o PS acaba a ser vitima do próprio clima irrespirável de compadrio e negociata que promoveu nos últimos anos", sustentou.
O deputado considerou que os recuos do PS em matéria de IUC e tabaco foram "cambalhotas eleitoralistas", insurgindo-se também contra o peso dos impostos. Em vésperas de eleições, procurou moderar-se, citando Sá Carneiro (o que motivou risos) e Adelino Amaro da Costa, ex-ministro do CDS. Apenas teve um assomo do tom que costuma adotar quando disse ao primeiro-ministro que "nem a sua mãe acredita em si", o que levou Santos Silva a repreendê-lo e a ser aplaudido.
Ventura prometeu que, caso o Chega alcance o poder, encarnará uma "Direita diferente", que não corta pensões e "não vai subir impostos". Despediu-se de António Costa dizendo que este "não deixará saudades como primeiro-ministro".
Rui Rocha, da IL, afirmou que a "fuga permanente às responsabilidades" é a marca dos oito anos de governação de Costa, acusando o primeiro-ministro de se ter refugiado, sucessivamente, na troika, na pandemia ou na guerra para explicar os insucessos. Tal como PSD e Chega, também disse que o PS deixou cair o IUC por eleitoralismo.
No final de uma intervenção que gerou agitação na bancada do PS, o liberal despediu-se de Costa dizendo-lhe "'Hasta la vista', adeus". Aludindo a Vítor Escária e Lacerda Machado, recomendou ao governante que, no futuro, "escolha melhor as companhias".
Rui Rocha também atacou Pedro Nuno Santos, que "já diz que não é esquerdista" porque "há eleições". Dito isto, atirou: "Vai chegar uma segunda-feira em que a 'troika' Raimundo, Mortágua e Pedro Nuno Santos não terá poder para impedir o país de crescer", por ter deixado de mandar "na saúde, no bolso e na casa dos portugueses".
PS roubou discurso à Direita e deixou PSD "às aranhas", dizem PCP e BE
À Esquerda, Paula Santos, do PCP, considerou "inusitado" que o OE seja votado numa altura em que o Governo está a prazo, considerando revelador que a Direita tenha aceite esse cenário. Também deixou críticas ao Governo: "Dizem que os indicadores económicos são bons, mas isso não tem tradução na vida das pessoas. Evocam as contas certas, mas isso não coloca comida na mesa, não garante a consulta, não assegura o professor nem impede o despejo".
A comunista sustentou que o PS fez, no OE, "aquilo que o PSD gostava de fazer", deixando os sociais-democratas "às aranhas". Realçando as virtudes da geringonça, acusou a IL de apenas servir para defender lucros e o Chega de ter deixado cair "a máscara", por não se ter oposto à subida das rendas "para valores incomportáveis".
Mariana Mortágua, do BE, sublinhou que, embora o PS tenha tido "todas as condições para governar", aplicou uma política "arrogante" e "de remendos mal amanhados". No entender da bloquista, os socialistas deixam um país "a arder" na habitação e nos serviços públicos, por terem como única prioridade garantir um excedente orçamental.
Tal como o PCP, também Mortágua atirou à Direita, considerando que esta "não sabe o que dizer ao país e, por isso, finge que o problema são os impostos". No seu entender, essa visão é errada: "Mesmo que um salário de mil euros não pagasse um cêntimo de imposto, continuava a não suportar uma renda de 700 euros", frisou.
PAN e Livre, os partidos que se abstiveram na votação, enumeraram algumas "vitórias" que os levaram a não votar contra. O PAN disse querer assumir-se como "referencial de estabilidade" e "tampão aos retrocessos" (numa referência à extrema-direita), o Livre salientou a importância da aprovação da sua proposta para criação de um Fundo de Emergência na Habitação, para impedir o surgimento de "cidades de tendas" - ou seja, o aumento de sem-abrigo.