O sociólogo Boaventura de Sousa Santos afirmou que nenhuma das mulheres que o acusa de assédio sexual e moral "pode invocar ter tido contacto físico ou íntimo" com o próprio.
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As acusações a Boaventura de Sousa Santos remontam a abril de 2023, quando três investigadoras que passaram pelo Centro de Estudos Sociais da Universidade (CES) de Coimbra denunciaram situações de assédio num capítulo do livro intitulado "Má conduta sexual na Academia - Para uma Ética de Cuidado na Universidade". Em entrevista à CNN, no domingo à noite, o sociólogo admitiu - como já o tinha feito em outras ocasiões - que teve comportamentos inapropriados, mas não relacionados com assédio sexual. "Cometi erros, mas não foram desse tipo", referiu.
O ex-diretor emérito do CES referiu-se aos piropos. "Qualquer homem da minha idade que diga que, nos anos 1960 ou 1970, não fez um piropo ou um galanteio a uma mulher, ou é mentiroso ou hipócrita. E qualquer mulher desta idade, que também naquela época, recebeu um piropo ou um galanteio e nunca gostou é mentirosa ou hipócrita", afirmou. Boaventura de Sousa Santos disse, na entrevista, não se recordar se esses piropos foram dirigidos a alunos.
Após a divulgação do capítulo onde constavam as denúncias, um coletivo de denunciantes - composto por treze mulheres - veio a público divulgar outras situações de assédio do CES e nomear Boaventura de Sousa Santos como o alegado agressor. "Nunca tive contacto, nenhuma dessas pessoas pode invocar ter tido contacto físico ou íntimo comigo. Falam de assédio sexual porque o assédio sexual é o que vende. A minha reputação é internacional. Se me queriam afastar, tinham de o fazer com estrondo", disse na mesma entrevista.
A 13 de março do ano passado, o relatório de uma comissão independente, constituída pelo CES, confirmou a existência de padrões de conduta de abuso de poder e assédio, por parte de pessoas em posições hierarquicamente superiores. Em novembro de 2024, o sociólogo saiu do CES e acusou a instituição de "linchamento".
"Lógica de proximidade"
Em entrevista, Boaventura de Sousa Santos apontou ter havido "um conjunto de interesses externos e internos" nas acusações de assédio que vieram a público contra si. "Sou um pensador incómodo e um intelectual crítico. Seria um alvo fácil para atacar", declarou. Atualmente, há uma ação judicial interposta por Boaventura de Sousa Santos contra o coletivo de denunciantes pela defesa do seu bom nome. Existe também um inquérito a decorrer no Procuradoria-Geral da República, na sequência das conclusões da comissão independente.
Depois do capítulo publicado na editora Routledge, várias mulheres vieram a público relatar alegadas situações de assédio cometidas por Boaventura de Sousa Santos. Numa reportagem publicada na Agência Pública, meio de comunicação brasileiro, em maio do ano passado, as denunciantes afirmaram que Boaventura de Sousa Santos "oferecia sexo como moeda de troca". "Quando as luzes se apagaram, ele colocou a mão entre as minhas pernas, na minha virilha. (...) Continuou a olhar em frente, a ver o filme. Eu saí assustada", relata Mariana Cabello, que esteve num curso de verão do CES em 2016.
O sociólogo disse ser "absolutamente ridículo" ter tocado na zona íntima de alguma investigadora do CES. "Tenho lógica de proximidade com todas as pessoas. Nós latinos não somos calvinistas, a gente abraça-se. Essa atitude de proximidade e convívio sempre existiu", acrescentou. O ex-diretor emérito do CES acusou ainda as mulheres do coletivo das denunciantes de serem "vendedoras do trauma".
Aos 84 anos de idade, Boaventura de Sousa Santos lamenta que o processo judicial de defesa do seu bom nome esteja parado desde dezembro. Foi detetado um problema técnico nas gravações do julgamento, não havendo, neste momento, data para o reinício do processo.