A Câmara do Porto aprovou, em reunião de Câmara desta segunda-feira, a descentralização de competências na área da Saúde. O BE e a CDU votaram contra, por recear maiores encargos no futuro. A transferência pressupõe a requalificação de vários edifícios e a construção de quatro novos centros de saúde.
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A ordem de trabalhos era curta, mas o 13.º e último ponto da agenda da reunião de Câmara do Porto desta segunda-feira motivou um voto contra dos vereadores do Bloco de Esquerda e da CDU. O ponto previa a "submissão a aprovação da Assembleia Municipal" do auto de transferência de competências da área da Saúde e da respetiva adenda. E foi precisamente esse documento que levou os vereadores a não concordar com a proposta, sublinhando não estar em causa o envio da proposta à Assembleia Municipal, mas sim eventuais encargos futuros.
Em causa está a transferência de 19 edifícios, estando identificada a necessidade de substituição e requalificação com diferentes graus de complexidade, relacionadas com o estado de conservação dos espaços ou até mesmo com a necessidade de alargar a resposta dada atualmente. Além disso, a Administração Regional de Saúde do Norte (ARS-N), durante o processo negocial com a Câmara do Porto, identificou a necessidade de serem construídos quatro novos centros de saúde, incluindo um em Azevedo de Campanhã.
Quanto às novas construções, alguns ocuparão terrenos a disponibilizar pelo Município, livres de taxas, e já identificados no Plano Diretor Municipal (PDM) como terrenos para equipamento.
Esta descentralização será assumida pela Câmara do Porto a 1 de janeiro de 2024, sendo que só será, de facto, concretizada, com a realização de novos contratos. O Município diz precisar de entre três e quatro meses para lançar esses mesmos procedimentos. Até lá, continuará a ser o Ministério da Saúde a assumir as competências.
"Processo foi muito mais virtuoso", nota Moreira
O presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, em declarações aos jornalistas no final da reunião privada de Executivo, sublinhou a diferença deste processo de transferência de competências em relação aos anteriores, já que, "neste caso, nenhum município era obrigado a aceitá-lo".
Com o mapeamento dos centros de saúde na cidade, o processo para a manutenção de uma unidade em Azevedo/Campanhã, cujo processo, de acordo com Moreira, está inscrito no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e "está já a avançar". "Havia também a questão de haver uma neutralidade entre a despesa que passa para o Município do Porto e a receita que é criada e que está já inscrita em Orçamento do Estado. E conseguimos, assim, chegar a bom porto", considera o presidente da Câmara.
Como a despesa para o Município rondará os cinco milhões e 200 mil euros, essa mesma verba será transferida pelo Estado.
Um outro ponto abordado durante o debate foi também o horário de funcionamento dos centros de saúde. "Esta descentralização, tal como está mapeada, parte do princípio que tudo se irá manter em termos de horários, mas a lei prevê agora, e a nossa adenda também prevê, que haverá uma flexibilização. Ou seja, há uma comissão que está criada para avaliar as alterações que possam surgir ao longo do tempo, na qual a Câmara do Porto faz parte. Se for entendido, por exemplo, que um determinado centro de saúde deve funcionar num horário alargado, está lá estabelecido que o Município do Porto assumirá os custos relativamente ao seu pessoal, - aos técnicos operacionais -, e o Ministério da Saúde toma a responsabilidade relativamente ao seu pessoal: os médicos", clarificou.
Moreira realçou a "legitimidade" das forças políticas que votaram contra, mas o assunto seguirá agora para discussão, tal como o previsto, em Assembleia Municipal.
"Do nosso ponto de vista, este processo foi muito mais virtuoso do que os outros, porque não foi por decreto-lei. Permitiu negociar e tem uma mapeamento dos centros de saúde que queremos", concluiu.
BE: "Contrato inclui uma adenda, com a qual não estamos de acordo"
O vereador do BE, Sérgio Aires, quis dar nota de que considera que esta é a transferência de competências "mais delicada de todas". Ainda assim, destacou a forma como este processo foi conduzido, "diferente dos outros", havendo capacidade de negociação diretamente com o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, "coisa que não aconteceu nos outros processos".
Por isso mesmo, sublinhou, "agora está a fazer-se bem o que se fez mal antes".
"O voto foi para enviar isto para a Assembleia Municipal, ao que naturalmente, nunca nos opomos. Acontece que isto inclui um contrato e inclui uma adenda. E nessa adenda, com a qual não estamos de acordo", justificou o vereador, adiantando ter exposto "algumas dúvidas" ao presidente da Câmara do Porto.
"Acho complexo que se garanta tanta certeza e segurança, porque para já só está tudo certo até 2024. Em 2025, até o processo de negociação pode ser diferente porque pode estar outro ministro e resolver que não quer negociar coisa nenhuma", perspetiva Sérgio Aires. "Estamos a falar de coisas tão sérias que me parece que deixar isto no registo de aleatoriedade ou de boa vontade de ministros ou secretários de Estado, é bastante perigoso. Portanto, votamos contra", reiterou.
CDU: "Há uma área de nevoeiro muito forte"
Da CDU, Ilda Figueiredo votou no mesmo sentido. Aos jornalistas, no final da reunião privada, nota "que a adenda inclui responsabilidades de transferência de 19 edifícios, de reabilitação de diversos edifícios e de construções novas", financiadas pelo PRR. Mas, para a vereadora, "o problema é: e no futuro?".
"Como é que vai ser no futuro? Há aqui uma área de nevoeiro muito forte sobre o que vai acontecer no futuro e os encargos que uma situação destas pode trazer", receia Ilda Figueiredo, notando que a votação dizia respeito à ida da proposta a votação a Assembleia Municipal. Quanto a isso, "nada contra".
"Mas quando foi depois referido todo o conteúdo de uma adenda que não estava clara, é óbvio que não posso aceitar. E daí o voto contra, que não é contra a ida à Assembleia Municipal, mas sim contra o conteúdo da transferência e da adenda", clarifica a vereadora, enaltecendo a importância do centro de saúde de Azevedo/Campanhã.
PS e PSD de acordo
Para o PSD, "este ponto protagonizou todos os passos que o partido entende como certos quando, há uns anos, o líder do PSD e do PS assinaram um acordo para a descentralização". O vereador social-democrata, Alberto Machado, considera que "tudo o que esteve para trás não esteve bem porque foi uma descentralização imposta", destacando que, neste caso, houve uma negociação.
Quanto à adenda, que levantou preocupações ao BE e à CDU, Alberto Machado afirma que, para os sociais-democratas, "a adenda é a consequência lógica de todo o trabalho feito no âmbito do processo negocial". "Sabemos quais são os edifícios, os recursos humanos e que há possibilidade de, a todo o momento, de negociar, caso haja alguma circunstância excecional, e sabemos quanto vai custar e que o Estado assume essas verbas".
Também Tiago Barbosa Ribeiro, do PS, acompanha a proposta da Câmara do Porto. "Consideramos que foi um processo bem gerido e dialogado. São créditos que têm que ser atribuídos à Câmara do Porto e ao Ministério da Saúde. Aliás, liderado por alguém que conhece bem a cidade neste momento, [Manuel Pizarro], e portanto isso terá, eventualmente, ajudado à conclusão deste processo", disse.
O vereador considera ainda que esta transferência vai garantir "um melhor serviço à população". Sobre a adenda, "permite identificar os pontos mais positivos deste processo e aquilo que é a responsabilidade atribuída ao Município e ao Ministério da Saúde".