A primeira reação é virar a cara, minimizar o ecrã do computador e gritar Não. A segunda é questionar: publica-se? Não? E olhar, de novo, engolindo em seco. A terceira é assumir que sim, ao cabo de um debate alargado.
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A imagem de uma criança com a cabeça a ser lavada pelas ondas do mar Egeu é, como escreveu Pedro Simón, no El Mundo, tudo o que há de mais normal se não estivesse tudo errado. "O normal aos três anos é que te faças de morto e não que o estejas"...
A realidade, ao largo desta imagem, é a de dois botes com refugiados sírios que falharam a curta viagem entre Akyarlar, na turística costa turca de Bodrum, e a paradisíaca ilha grega de Kos. Escassos quilómetros, talvez menos de dez. Um deles carregava 17 pessoas, o outro seis. Entre estes, uma mãe com os seus três filhos. Este é um deles, três anos. Morreram 12 pessoas. São as contas das que deram esta quarta-feira à costa e que Nilufer Demi fotografou.
A imagem por detrás da longínqua realidade que está a ser "discutida", pausadamente, nos gabinetes alcatifados da liderança europeia ainda demasiado pouco consensual, saltou para o mundo. E carregou a expressão de uma hashtag violentíssima de significado: "KiyiyaVuranInsanlik", "o naufrágio da humanidade". Discutiu-se. É necessário? Não é? A imagem é o retrato do desespero, diz o britânico "Independent", jornal de um país liderado por um primeiro-ministro que, há dias, no fogo da crise de migrantes em Calais, falava em "praga".
A imagem é a que ilustra uma notícia que deveria ter começado pela pergunta retórica do ministro dos Negócios Estrangeiros eslovaco: "Em tempos normais é difícil obter um visto Schengen, mas agora dezenas de milhares de pessoas circulam sem qualquer controlo. Então, é isto que é Schengen?". É a imagem que ilustra o dia em que se soube que a polícia checa tirou à força dos comboios vindos da Hungria migrantes com bilhete paga para a Alemanha que lhes escreveu números de identificação nos braços, reavivando trágicas e septuagnárias memórias.
O dia em que mais um camião carregado de gente a asfixiar foi intercetado na Áustria. O dia em que a Hungria reteve 2000 pessoas em Budapeste e acusou a Alemanha de criar a ideia de que aceiaria qualquer um que diga vir da Síria. É mesmo necessário continuar?