Maior dispositivo naval estacionado por Washington nas Caraíbas capturou já dois navios e deixou escapar um.
O tráfego em Caracas é muitas vezes uma verdadeira dor de cabeça para os automobilistas que tentam cruzar a capital. Nesses momentos, a opção por um mototáxi pode ser a solução mais rápida. É sentado numa motorizada que encontramos a única pessoa que, até ao momento, assumiu ao JN compreender o bloqueio naval dos EUA. Sem dar o nome verdadeiro, este condutor justificou a decisão de Washington com a "indemnização insuficiente" que Hugo Chávez teria dado às empresas petrolíferas norte-americanas a operar no país. Contudo, em vários dias de entrevistas e reportagens em Caracas, entre apoiantes e opositores do governo de diversas categorias profissionais, parece haver uma unanimidade em torno da rejeição aos ataques a embarcações, ao bloqueio naval e até a uma eventual invasão.
No centro de Caracas, em Parque Central, à frente de uma histórica taberna, António, emigrante português há quatro décadas na Venezuela, assume ter sido apoiante de Hugo Chávez, embora não se identifique com Nicolás Maduro. Originário do Porto, rejeita, ainda assim, qualquer intervenção dos EUA contra a Venezuela. Enquanto serve ao balcão, explica que este ano não pôde passar o Natal em família em Portugal devido às pressões da administração Trump sobre as companhias aéreas.
Por sua vez, o português Ricardo Vaz considera que esta é a "ameaça mais séria" que a "revolução bolivariana" sofre desde 1999. Enumerando várias tentativas de golpe e sanções, este jornalista a viver há oito anos em Caracas diz que a maior mobilização militar dos Estados Unidos nas Caraíbas pode ter consequências graves para os comerciantes portugueses. "Mesmo que nos últimos anos, a partir de 2021, tenha havido, a nível macroeconómico, uma recuperação, a economia continua muito instável, continua com problemas estruturais", explica.
Caça ao petróleo
Uma semana após anunciar um bloqueio naval contra a Venezuela, Washington conta já com a captura de três petroleiros. Apesar de o petróleo venezuelano ter sido nacionalizado há mais de meio século, bem antes de Chávez chegar ao poder, Trump condenou aquilo que considerou ter sido um roubo dessa matéria-prima ao seu país. A caça aberta aos recursos da Venezuela começou com a interceção do cargueiro Skipper no dia 10, em frente à costa venezuelana, numa abordagem que levou Nicolás Maduro a considerar que a pirataria havia regressado às águas das Caraíbas. Com duas décadas de navegação, este navio, da Triton Navigation Corp., levava pavilhão da Guiana e estava debaixo de sanções dos EUA desde há três anos. Levava a bordo 1,8 milhões de barris de crude e terá sido levado para Galveston, no Texas.
Contudo, no domingo, antes de tentarem capturar, sem sucesso, o petroleiro Bella 1, também sujeito a sanções, os EUA capturaram, no sábado, o cargueiro Centuries, também de bandeira panamenha e propriedade de um comerciante de petróleo com sede na China, que não estava sujeito a quaisquer sanções. Sem grande cerimónia, recentemente, Donald Trump lançou uma vaga de ataques aéreos contra embarcações ao largo da Venezuela e da Colômbia, condenados pelas Nações Unidas.
Se esta operação contra lanchas com supostos narcotraficantes, que provocou a morte de uma centena de tripulantes sem qualquer detenção ou julgamento prévio, começou com a alegação de que Maduro encabeça um cartel de droga, a verdade é que Trump fala cada vez menos do narcotráfico e cada vez mais de petróleo. v