Azeite: Novos olivais "pintam" paisagem no Alentejo, mas espanhóis rejeitam "invasão" (C/ FOTOS)
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** Rita Ranhola (texto) e Nuno Veiga (fotos), Agência Lusa **
Beja, 16 Mar (Lusa) - Os longos hectares de oliveiras "pintam" o caminho entre Beja, Serpa e Moura, fruto dos novos olivais intensivos plantados nos últimos anos, sobretudo por espanhóis, que rejeitam ter "invadido" o Alentejo, frisando que "o azeite não tem passaporte".
"O azeite não tem passaporte e só tem uma nacionalidade, a qualidade. A água de Alqueva é para o Alentejo e um espanhol só traz euros, a terra fica cá sempre, tal como o investimento, a rega, a maquinaria e os postos de trabalho", assevera à agência Lusa o empresário espanhol Brígido Chambra.
O dono da Agrogenil, empresa especializada na administração e assessoria técnica de propriedades agrícolas, diz ter sido o primeiro a investir na região, em 2002, na aquisição da herdade da Rabadoa, seguida da Fonte dos Frades, no concelho de Beja.
No total e até hoje, só a sua empresa instalou "perto de 12 mil hectares" de novos olivais intensivos em 28 propriedades da região, 24 de investidores espanhóis e quatro de portugueses, sobretudo no distrito de Beja (Moura, Serpa, Ferreira do Alentejo, Vidigueira e Beja), mas também nas zonas de Évora e Avis (Portalegre).
A Rabadoa foi, entretanto, vendida a um congénere e a Fonte dos Frades à Franlabora, sociedade criada em Portugal pelo também espanhol Grupo Âncora - que a Agrogenil integra -, o qual detém seis herdades no Alentejo, num total de mais de dois mil hectares de olival.
"Se fosse português, não via isto como uma invasão espanhola, mas sim como criação de riqueza. A Fonte dos Frades estava abandonada, não tinha trabalhadores fixos e agora tem 13 ou 14 e muitos mais sazonais. Compramos em Beja a maquinaria e o gasóleo, contratamos empreiteiros locais e transformamos aqui o azeite", sublinhou também José Luis de Prado Ruiz-Santaella, director-geral do Grupo Áncora.
A olivicultura intensiva da Franlabora, um dos vários grupos económicos espanhóis presentes em terras alentejanas, pode mesmo vir a ultrapassar brevemente os sete mil hectares, graças ao projecto do maior olival do mundo, com quase cinco mil hectares, na Herdade dos Machados, em Moura.
O projecto apenas irá avançar caso as negociações com o Ministério da Agricultura permitam voltar a reunir os mais de seis mil hectares da herdade, retalhada no tempo da chamada Reforma Agrária.
Se assim não acontecer, alerta o também director técnico da Franlabora, a Herdade dos Machados permanecerá, "em todo o século XXI, igual ao que foi no século XIX".
O projecto para os Machados, segundo os dados fornecidos à Lusa pelo Grupo Áncora, prevê o início da plantação de olival, que vai custar "perto de 40 milhões de euros", em 40 por cento da área no próximo ano, sendo os restantes 60 por cento repartidos até 2011.
A construção de um lagar para a transformação de 850 toneladas de azeitona por dia, que se junta ao outro lagar que o grupo tem em Fonte dos Frades (500 toneladas/dia, mas com projecto para aumentar capacidade), é outro investimento associado, na ordem dos 7,5 milhões de euros.
O volume anual de azeitona proveniente da herdade está previsto atingir as 65 mil toneladas, sendo que o de azeite aponta para perto das 11 mil toneladas.
Os investimentos globais da Franlabora nas várias herdades, à volta de 150 milhões de euros, envolvem previsões de facturação superiores a 500 milhões de euros acumulados até 2022 (valências agrícola e industrial).
"Trabalhamos para ganhar dinheiro, mas de onde ninguém o tira, que é da terra", frisou, aludindo à água de Alqueva e à disponibilidade e preço da terra como as razões para a vinda dos espanhóis: "Ouço falar muito de subsídios, mas dos 12 mil hectares que já fiz, só dois ou três mil tiveram apoios".
Há cinco ou seis anos atrás, um hectare de terra sem olival no Alentejo rondava os seis mil euros, enquanto que em Espanha atingia o triplo. Hoje, os "saldos" mantêm-se, pois, segundo o empresário, apesar do aumento dos últimos anos, a terra alentejana oscila entre os 12 a 15 mil euros por hectare e a espanhola chega aos 25 mil euros.
Nos projectos já efectuados no Alentejo, Brígido Chambra costuma plantar "duas ou três variedades" de olival, sobretudo arbequina, mas já recorre à cordovil e cobrançosa (de Portugal), sempre com a preocupação de obter uma "produção estável e sem quebras".
"Queremos fazer um azeite que agrade aos mercados emergentes, da América e da Europa do Leste, para onde exportamos a granel. Não podemos fazer azeite para o Alentejo ou só para Portugal, a produção é muito maior", explicou.
Num português bastante fluente, Brígido Chambra, que diz nunca ter encontrado na região uma pessoa que lhe dissesse que "não quer os espanhóis no Alentejo", alimenta perspectivas optimistas para o futuro nacional do azeite.
"Dentro de oito a dez anos, quando todos os novos olivais estiverem em produção plena, Portugal não será mais deficitário, deixando de ter que importar metade do azeite que consome e, pelo contrário, tendo muita produção para exportar", sustentou.
RRL.
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