As mudanças legislativas em Portugal são normalmente mal recebidas porque representam mais do mesmo: não vão ao fundo das questões e sucedem-se umas às outras.
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As mudanças verificadas no novo Código do Processo Civil encontram pelo menos um olhar positivo quanto à bondade da sua revisão mas não há euforias: tudo depende de como vão ser aplicadas. Isto significa que a nova legislação não será eficaz sem formação dos operadores judiciários ou sem uma nova prática ética por parte dos magistrados e advogados quanto ao objetivo final: solucionar um conflito sem perder de vista a vontade do legislador. Ora, quanto a isto, não há ministra da Justiça que consiga obrigar o sistema a mudar se ele não quiser funcionar noutra lógica. E, além disso, este código não basta: há um mar de reformas à espera de ver a luz do dia.
[perguntas]
[1] A decisão do presidente da República é boa para o setor da Justiça e para o país?
[2] O novo Código de Processo Civil traduz-se numa boa reforma legislativa?
[respostas]
Agostinho Guedes, diretor da Escola de Direito da Universidade Católica do Porto
[1] O futuro dirá se a decisão foi boa.
[2] Penso que as alterações feitas vão no bom sentido. Porém, para que as alterações legislativas permitam uma melhor justiça, insisto que é fundamental mudar também a mentalidade dos magistrados e advogados no sentido de os recentrar no objetivo do processo: solucionar um conflito de acordo com o critério de justiça definido pelo legislador, de forma rápida, económica e eficiente.
Alberto Pinto Nogueira, procurador-geral adjunto
[1] A pergunta não tem resposta, pois o Presidente, que tenha ouvido, não falou em Justiça. Aliás, no "sítio" ,a política só fala de défice, orçamento e de como os do costume vão ser mais massacrados, enquanto o dinheiro do Estado dança para os Bancos.
[2] Sim. A questão é de saber COMO vai ser aplicado. O costume!
Manuel Sousa, presidente da delegação do Porto do Sindicato dos Funcionários Judiciais
[1] A decisão do PR foi a mais sensata atendendo à situação económica/financeira do País.
[2] Julgo que sim. Finalmente procedeu-se a uma reforma profunda do Processo Civil (sem remendos) com alterações de sistematização. Os princípios são basicamente os mesmos, mas as alterações mostram uma reforma inspirada na simplificação, celeridade e flexibilidade, atribuindo ao Juiz do processo uma intervenção mais ativa, direcionada para a agilização processuais.
Carlos Moreno, juiz jubilado do Tribunal de Contas e professor de Finanças Públicas
[1] Só com o OE para 2014 e as negociações com a troika em Setembro será possível ver, e mesmo assim sem grande nitidez, se a decisão do Presidente da República será boa para o futuro do país e da sua Justiça. Foi a sua 2ª opção e está carregada de riscos e de incertezas. Sem investimento e criação de emprego o país será um morto-vivo.
[2] O novo CPC é seguramente melhor do que o anterior. Mas devemos esperar pela sua aplicação e os seus resultados para avaliarmos a sua eficácia no terreno.
Joana Pascoal, advogada e atual presidente da Associação Jovens Advogados
[1] A decisão do Presidente enferma do mesmo mal das brilhantes sentenças dadas anos depois da interposição da acção: pecam por tardias e muitas vezes a situação que as originou cessou.
[2] Só a prática o dirá. Note-se que o Juiz poderá desenhar a tramitação que melhor se adapte ao caso concreto. Este novo poder soberano permitirá maior celeridade? Ou apenas contribuirá para responsabilizar a magistratura pelos atrasos na Justiça? Será genial inovação ou presente envenenado?
Luísa Neto, jurista e professora associada da Fac. Direito da Universidade do Porto
[1] Independentemente da substância da decisão é essencial a clareza e a certeza de calendários e processos. Afastando o cenário de eleições, o PR deveria ter imediatamente definido se optava por governo de iniciativa presidencial ou se mantinha o apoio ao governo em funções. O compasso de espera foi escusado e prejudicial.
[2] A reforma traz uma simplificação mas implica formação (e habituação) dos operadores judiciários. Outras reformas anteriores tiveram escasso resultado.
Maria Manuela Silva, diretora do departamento de Direito da Universidade Portucalense
[1] Mais vale uma má decisão do que não decidir. No entanto, este decide e não decide, propor eleições antecipadas e depois decidir manter o governo até ao fim da legislatura não foi certamente muito bom para o país, independentemente do setor.
[2] Creio que pode agilizar alguns aspetos e melhorar outros. No entanto talvez não seja suficiente para melhorar o estado da justice. Tem de ser complementada com outras reformas como a penal ou mapa judiciário, também urgentes.