Para qualquer pessoa, mas em particular para aqueles que vivem sob os holofotes da exposição pública e se mantêm numa carreira musical ativa por longas décadas, saber envelhecer é uma arte reservada apenas a alguns. A última noite do Vilar de Mouros foi uma mostra de todo o espectro de possibilidades de envelhecimento.
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Começamos pela manutenção das capacidades. The Waterboys passaram por Vilar de Mouros em 2016. Estiveram num (muito criticado) concerto em Portugal há dois anos. Na noite desta sexta-feira, fizeram as pazes com o público português. Trouxeram à margem do rio Coura um espetáculo que não tenta ser mais do que aquilo que é.
Os britânicos sabem o que lhes resta numa banda que começou o seu sucesso nos anos 1980: mostrar a (ainda) espetacular qualidade instrumental e a (ainda) no sítio certo voz de Mike Scott. Chegaram ao palco do Vilar de Mouros no balanço de um David Fonseca que tinha feito aquecer a temperatura e, levados nesse embalo e pelos clássicos e versões que trouxeram, conquistaram uma casa que se foi enchendo à medida que o concerto avançava.
Vilar de Mouros fez-se Vilamoura
A surpreendente qualidade que mantêm desconta até o facto de em nenhum momento ter acertado o nome da terra minhota onde atuava. “Boa noite, Vilamoura”; “Como estão, Vilamoura?”; “Obrigada, Vilamoura”. Por hora e meia, os festivaleiros perdoaram (ainda que entre risos e piadas trocadas um pouco por toda a multidão) e dobraram Portugal ao meio como se dobra uma folha de papel – para que Vilar de Mouros e Vilamoura, por uma vez, fossem (quase) perto.
A mesma fortuna (ou sabedoria) não parece ter calhado a The Libertines. Os anos dissiparam o charme de outras décadas e a transparência do tempo fez-nos ver, pelo mesmo esta sexta-feira, que o carisma, a voz e o talento musical já não andam de mãos dadas com Pete Doherty.
A banda (também) britânica acumulou a maior enchente da noite, ainda que não a tenha sabido agarrar. O encore não tinha terminado e já se sentia a manada que da frente do palco queria sair. Ora para darem esta edição por terminada; ora para, ainda que já passados da meia-noite, irem dar conta de um ratinho que sentiam na barriga.
Ioga ao som de rock’n’roll
Foi então que The Darkness subiram ao palco para salvar uma noite que podia ter terminado com sabor agridoce. Os britânicos formados em 2000 mostraram a Vilar de Mouros que, 24 anos volvidos, ainda se reinventam, ainda se movem e ainda estão aqui para ensinar o que é um concerto de rock’n’roll. A energia contagiante que deram do início ao fim merecia ter tido uma casa mais recheada. O já resquício presente compensou, no entanto, com gritos, pulos e aplausos que se estenderam por um par de minutos já depois de todos terem abandonado o palco.
Para o argumento de que, em The Darkness, a ampulheta parece ter, na verdade, funcionado em sentido inverso, conta ainda a agilidade visita do vocalista e showman Justin Hawkins. A cara envelhecida ameaça mais do que os 49 anos que o músico tem. Mas o tiro ao lado é rapidamente corrigido quando, sem contarmos, Hawkins se coloca de cabeça no chão e pernas para o ar. Mesmo ao lado da bateria, estamos agora numa aula de ioga ao som de rock’n’roll. Um conceito que talvez possa rapidamente conquistar aficionados.
Está confirmada mais uma edição do CA Vilar de Mouros. No próximo ano, o certame caminhense regressa às margens do rio Coura nos dias 21, 22 e 23 de agosto, anunciou este sábado Paulo Ventura, organizador do festival. Vilar de Mouros 2025 volta assim ao formato original de três dias, mas poderá haver uma surpresa: “Não está fora de questão, face ao sucesso do dia gratuito que preparamos este ano, voltarmos a fazê-lo”, indica Ventura. É uma ideia “em cima da mesa” e a decidir adiante. Sobre a edição que terminou na noite passada, estima-se que tenham passado pelo recinto entre 52 e 55 mil pessoas.