É tempo de (re)descobrirmos o cinema argentino, agora que o Trindade lhe dedica, a partir desta terça-feira, o ciclo "Sol de Maio". Entre os traumas da ditadura militar e as incertezas várias face ao futuro, quantos mundos cabem, afinal, nos filmes argentinos?
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Só uma distração extrema pode justificar o desconhecimento absoluto de uma cinematografia como a argentina, tão interessada na reflexão sobre o real como na capacidade de criação de histórias sem fim.
Ao longo das próximas semanas, o Cinema Trindade, no Porto, acolhe algumas das mais estimulantes propostas fílmicas oriundas daquele país sul-americano. Sem pretensão de esgotar o filão, mas tão só com o propósito de divulgar os méritos da sua cinematografia, o ciclo "Sol de Maio" vai apresentar um total de nove obras (cinco longas e quatro curtas) que, por muito diversas que sejam, partilham uma forte identidade nacional assente em preocupações comuns. As marcadas deixadas pelo passado ditatorial, nas décadas de 1970 e 1980, são uma delas, tal como o peso das tradições familiares, capaz de resistir até às aceleradas mudanças.
Logo a abrir o ciclo - nesta terça, às 18.30 horas - será exibido "Rojo". A película realizada em 2019 por Benjamin Naishtat mergulha na Argentina que precedeu a ascensão do poder militar, centrando-se no quotidiano de uma pequena vila cuja quietude vai ser abalada em definitivo pela chegada de um estranho.
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Não menos recomendável é "Dos disparos", filme que vai ser exibido no Trindade a 4 de junho. Martin Rejtmant assina esta película que interliga real e absurdo, ao focar-se num adolescente que dispara por duas vezes sobre o seu corpo sem razão aparente. O caso não preocupa por aí além os seus familiares, acirrando assim a lógica de 'non sense' que atravessa o filme.
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Quem aprecia filmes de pendor artístico ou experimental ainda mais acentuado sentir-se-á descerto familiarizado com Jazmín López.
Desde a estreia, em 2012, com "Leones", que esta realizadora e atriz, nascida em Buenos Aires há 36 ano, insiste em fazer dos seus filmes locais de questionamento das narrativas tradicionais.
Com projeção apontada para 1 de junho, às 18.30 horas, no Trindade, "Si yo fuera el invierno mismo", filme de 2019 que já esteve em competição no IndieLisboa, conta-nos o percurso de quatro amigos que se encontram numa propriedade remota com o objetivo de reconstituir produções cinematográficas célebres.
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Extra-ciclo, não faltam obras de produção argentina suscetíveis de disputarem a atenção. De entre estas, uma das mais notórias será "O segredo dos teus olhos". Realizada em 2009 por Juan José Campanella, a película foi indicada para o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro e, não menos significativo, seria eleita pela BBC um dos 100 melhores filmes do século XXI.
O legado de sangue e desgraça deixado pela ditadura militar está fortemente presente nesta trama, centrado na figura de um agente policial chamado Benjamin Espósito, mas também muito marcado pelas incontáveis vítimas das autoridades políticas e militares da época.
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São abundantes as entrevistas a Jorge Luis Borges disponíveis na Internet. A verve e a sabedoria demonstradas pelo grande mago argentino sempre exerceram forte atração sobre a comunicação social, que solicitava a sua presença amiúde.
Uma das entrevistas mais completas que pode ser visionada foi transmitida em setembro de 1976 no programa "A fondo". Ao jornalista Joaquín Soler Serrano, Borges disserta sobre a sua paixão pelos livros, enquanto escritor e sobretudo como leitor, mas aborda também a política, manifestando a sua descrença quanto à possibilidade de instauração de uma democracia plena no seu país.
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