Exatamente há um ano, Diana Niepce lançou o livro "Anda, Diana", um relato cru do seu processo de reabilitação depois de um acidente que a deixou paraplégica. Como se acorda num novo corpo? Esse processo de reconstrução de uma nova identidade, não normativa, dá origem à obra homónima que se apresenta esta sexta-feira e sábado no Festival Dias da Dança.
Corpo do artigo
Para variar comecemos pelo fim. Quando acaba o espetáculo "Anda, Diana" ainda há, na assistência, pessoas surpresas pela bailarina que aparece em cadeira de rodas. Não é óbvia a sua condição e isso consegue-se, como Diana Niepce explicou em entrevista à "Notícias Magazine", porque as pessoas vivem a obra com ela e também porque há quem lhe sirva de extensão. "Uso os outros corpos como próteses, vão fazer o papel de uma cadeira ou de um andarilho. Interessa-me esse lugar visceral, de estranheza."
"Anda. Diana" é a construção de uma paisagem inclusiva. Engloba todos, sem barreira entre os lugares de uns e de outros.
Diana Niepce, como artista, não nasceu no dia do acidente. À bailarina formada pela Escola Superior de Dança foi dado um novo corpo. Mas como se faz esse caminho quando se trabalha sobre o corpo e se preparou toda uma vida esse corpo e não outro?
"Anda, Diana" não é um exercício de vitimização, é um trabalho até construir um corpo que dança, outra vez. Esta é uma inflexão, do lugar de vítima do sistema para um lugar de fala de um corpo revolucionário. "Mesmo que achemos que estamos empaticamente a compreender, aquilo que fazemos, sem nos apercebermos, é infantilizar, invalidar, é agir de um lugar de superioridade, de condescendência", disse à NM. Sabendo que o caminho a percorrer ainda é longo.
Trabalham com Niepce, em palco, Bartosz Ostrowski e Joãozinho da Costa.
Não poderia, portanto, haver um melhor espetáculo para ter audiodescrição (uma narração coreográfica) e interpretação em língua gestual portuguesa para públicos cegos e de baixa visão ou surdos, um investimento do DDD.
"Anda, Diana", de Diana Niepce, sexta-feira 29 e sábado 30, no TMM Constantino Nery (Matosinhos), às 19.30 horas.