A 23ª edição do festival Doclisboa acontece até 26 de outubro, levando a várias salas de Lisboa um programa variado, composto por mais de 200 filmes que prometem "não fugir do conflito ou da memória".
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O Doclisboa, primeiro festival português dedicado ao documentário, está de volta. Em 2025, o evento volta a ser um convite à exploração e um espelho do Mundo atual e passado, com 211 produções, de 54 países, que querem encontrar no cinema "uma forma de percorrer história, cultura e ideias".
Tudo acontece de 16 a 26 de outubro, em várias salas da capital - Culturgest, Cinema São Jorge, Cinemateca e Cinema Ideal. No programa deste ano, há 39 estreias mundiais e 31 obras portuguesas, com o foco a incidir sobre Gaza na noite de abertura: estreia, esta quinta-feira, no Cinema São Jorge, "With Hasan in Gaza", de Kamal Aljafari.
A obra, filmada em 2001, acompanha as buscas do realizador palestiniano por um antigo companheiro de prisão com um guia local, Hasan, e é, nas palavras do cineasta, uma homenagem "às pessoas, a tudo o que foi apagado e que recordei neste momento urgente da existência - ou não existência - palestiniana. É um filme sobre a catástrofe e a poesia que resiste", relata.
Com as restantes produções distribuídas, como habitualmente, por várias secções, na janela "Riscos", que pretende colocar a natureza contemporânea do cinema num lugar central, a egípcia Hala Elkoussy é realizadora convidada. Outro destaque é "Shadowboxing", concebido num diálogo entre a programadora associada do Doclisboa Cíntia Gil e o crítico francês Jean-Pierre Rehm.
Na secção "Heart Beat", as diversas expressões das artes e os seus protagonistas alimentam o conjunto escolhido, com três homenagens: a Robert Wilson, David Lynch e Luciano Berio. O encenador norte-americano Robert Wilson, que pôs em cena "Einstein on the Beach", de Philip Glass, faleceu em julho deste ano, enquanto o compositor italiano Luciano Berio, nascido em outubro de 1925, vê o centenário do seu nascimento celebrado com um programa especial.
A secção inclui "Welcome to Lynchland", de Stéphane Ghez, obra dedicada ao realizador David Lynch, numa viagem pelo seu mundo, através da voz de atores e convidados ilustres, como Kyle Maclachlan e Isabella Rossellini.
Passa também "Duran Duran: Unstaged", aqui David Lynch mas na realização, em 2012: um mergulho cinematográfico à apresentação histórica dos Duran Duran no Mayan Theater, em Los Angeles, pela lente do histórico cineasta.
A vida de Jeff Buckley em destaque
Situado na mesma era, em "Boy George & Culture Club", de Alison Ellwood, o cantor e os seus colegas de banda partilham pela primeira vez a sua história; enquanto "Becoming Madonna", de Michael Ogden, parte de imagens e registos inéditos, num filme que acompanha a transformação da jovem na estrela pop mais poderosa do mundo.
Outra obra a chamar muita atenção é "It's never over, Jeff Buckley", de Amy Berg - com duas sessões, no São Jorge esta sexta-feira, 17 de outubro e na Culturgest, a 26. O filme retrata Buckley, cuja voz única e carreira promissora terminaram com a sua morte em 1997. Com imagens e testemunhos privados, a cineasta Amy Berg revela o legado e o mistério de uma das figuras mais marcantes da década, tendo o consentimento e testemunhos da mãe do cantor, Mary Guibert.
Já "One to one: John & Yoko", de Kevin Macdonald e Sam Rice-Edwards, mergulha no universo musical, artístico e político de John Lennon e Yoko Ono, tendo como pano de fundo uma época turbulenta da história americana. Também a não perder, "Strange journey: the story of Rocky Horror", de Linus O"Brien (2025), mostra a história do maior filme de culto de sempre.
Serão ainda apresentados "Memórias do Teatro da Cornucópia", filme de Solveig Nordlund construído com recurso a imagens de arquivo de vários espetáculos da companhia fundada por Luís Miguel Cintra e Jorge Silva Melo, de 1973 e 2016; e "Cast of shadows", de Sami van Ingen, sobre Robert Joseph Flaherty; bem como "Andy Kaufman is me", de Clay Tweel; "Barking in the dark", de Marie Losier; "Bobò", de Pippo Delbono; "Paul", de Denis Cotê; "Toni, Mio Padre", de Anna Negri; e "Megadoc", de Mike Figgis, sobre o épico "Megalopolis" de Francis Ford Coppola.
Os elefantes-fantasma de Angola
A secção da "Terra à Lua", inclui "Pescadores de Bubaque", de Pedro Florêncio; "Contemplação impasse tentativa", de Welket Bungué; "Aurora", de João Vieira Torres; "Tales of the wounded land", de Abbas Fahdel; "Angela's diaries. Two filmmakers: chapter three", de Yervant Gianikian, Angela Ricci Lucchi e "Tôsô" de Masao Adach.
Atenção ainda para "Landmarks", da argentina Lucrecia Martel, história de uma luta por justiça na comunidade indígena de Chuschagasta; o regresso ao festival de Werner Herzog com "Ghosts ellephants", uma missão de busca pelos raros elefantes-fantasma de Angola, refletindo sobre questões existenciais e de conservação ambiental e cultural; e "Cover-up", dirigido pela oscarizada Laura Poitras em colaboração com Mark Obenhaus, vindo diretamente do Festival de Veneza e sobre a carreira do jornalista Seymour Hersh, jornalista premiado com o Pulitzer, que revelou os escândalos de tortura do exército dos EUA nas guerras do Vietname e Iraque.
A Competição Internacional reúne 12 filmes, as mesmas da Portuguesa, que estreia títulos como "A baía dos tigres", de Carlos Conceição e "Andar com fé", de Duarte Coimbra. O programa não-competitivo inclui "O Riso e a faca - integral", de Pedro Pinho, versão longa e em estreia mundial do filme premiado em Cannes.
Finalmente, procurando revelar novos talentos e nomes emergentes, a secção competitiva "Verdes Anos" volta a ocupar um lugar especial no Doclisboa; enquanto o festival e a Cinemateca Portuguesa se juntam a apresentar uma retrospetiva dedicada a William Greaves (1926-2014), ativista e pioneiro do cinema documental e experimental afro-americano: começa amanhã com "Symbiopsychotaxiplasm: Take One", na Cinemateca Portuguesa.
Da programação, o festival destaca ainda a exibição de "As Brigadas Revolucionárias na Luta Contra a Ditadura (1970-1974)", de Luiz Gobern Lopes. Entre os convidados deste ano, contam-se o canadiano Denis Côte, que apresentará "Paul"; e o realizador Eugène Green, que encerra o festival no dia 26 de outubro com "A Árvore do conhecimento", uma fábula que situa livremente em Lisboa e que acompanha um adolescente, um ogre e um pacto obscuro, numa crítica ao modo como as cidades se renderam ao turismo.
A programação completa pode ser consultada em doclisboa.org.