Morreu Anita Guerreiro, a voz que fez "Cheira Bem, Cheira a Lisboa" ecoar para sempre

Anita Guerreiro
Foto: DR/Museu do Fado
A atriz e fadista Anita Guerreiro, de 89 anos, morreu este domingo, durante o sono, na Casa do Artista, em Lisboa, onde vivia. A cidade despede-se de uma intérprete que marcou o teatro de revista, o fado e as Marchas Populares com talento e generosidade.
A notícia foi confirmada pela Casa do Artista, onde Anita Guerreiro residia desde 2018. "Calou-se a voz, mas fica para sempre o legado desta grande Senhora da cena artística portuguesa", sublinha a instituição, numa mensagem na rede social Facebook.
João Baião foi um dos primeiros a reagir, deixando no Instagram uma homenagem emocionada: "Minha querida Anita Guerreiro! Um grande aplauso para a Voz de Lisboa, de Portugal."
Também o presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, já lamentou a morte de Anita Guerreiro, "figura da música portuguesa durante muitas décadas", considerando que a sua "simpatia e popularidade" marcaram gerações, lê-se numa nota divulgada pela Presidência.
Nascida Bebiana Guerreiro Rocha Cardinali, a 13 de novembro de 1936, na freguesia dos Anjos, começou a cantar ainda criança no Sport Clube do Intendente. Aos sete anos já se destacava como solista e, aos 16, subiu ao palco do Teatro Politeama para o concurso radiofónico "Tribunal da Canção", de onde saiu com contrato profissional e com o nome que acompanharia toda a vida.
A estreia no Teatro Maria Vitória em 1955 abriu-lhe as portas do Parque Mayer, onde rapidamente se tornou presença obrigatória. A Lisboa popular reconhecia-a nas ruas, e os fados que estreava em palco ganhavam vida nos pregões da cidade logo no dia seguinte.
Após uma temporada nos Estados Unidos, onde casou e foi mãe, regressou a Portugal e passou a cantar no restaurante O Faia, no Bairro Alto. Simultaneamente, a televisão levava-a a todas as casas, com participações em séries e novelas como "Roseira Brava", "Uma Casa em Fanicos", "Olhos de Água", "Os Batanetes" e "Inspetor Max". Tornou-se ainda mais próxima do público mais jovem com a personagem da avó Batanete.
A sua voz aqueceu várias gerações com temas como "Lição de Amor", "O fumo do meu cigarro" e "Cheira Bem, Cheira a Lisboa", que ajudaram a cimentar a identidade musical da capital. Madrinha dedicada de marchas populares, viveu as Festas de Lisboa por dentro e por fora do palco.
Em 2004 recebeu da Câmara Municipal de Lisboa a Medalha Municipal de Mérito, Grau Ouro, em reconhecimento pelos 50 anos de carreira. Em 2022, a Junta de Freguesia de Arroios deu o seu nome a uma galeria cultural, homenagem que muito a orgulhou.
"Nunca tive aulas de canto. É um dom inato", dizia muitas vezes, sublinhando a importância da emoção e da dicção perfeita no contacto com o público. Quem com ela trabalhou recorda uma mulher humilde, generosa e apaixonada pelo que fazia, capaz de transformar qualquer noite num grande espetáculo.
Lisboa perde uma das suas vozes mais autênticas e um dos seus rostos mais populares. Fica a memória de quem soube levar o sorriso e o fado a quem mais precisava de um e do outro.
Ainda não foram divulgados os detalhes das cerimónias fúnebres. Aguarda-se a chegada a Portugal da filha, Pepita Cardinali, que se encontra no estrangeiro.

