Imagens de António Variações em tronco nu e com nádegas à mostra foram tiradas há 40 anos por amiga e agente. Um acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa confirmou a sentença favorável à fotógrafa.
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Um dos irmãos de António Variações queria proibir a publicação de um livro com fotografias do artista em tronco nu, com as nádegas descobertas e com peças de roupa justas, que mostram os contornos do corpo. Alegava que estas imagens pertenciam à vida íntima de Variações e que Teresa Couto Pinto, fotógrafa, agente, amiga do cantor e autora da obra, pretendeu, tal como a a editora Oficina do Livro, retirar "lucros à custa da imagem" do músico, que morreu em 1984. Porém, o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou, em julho, uma primeira sentença a favor da fotógrafa.
"As fotografias não constituem uma fonte de devassa, não causam qualquer prejuízo para a honra, reputação e decoro da António Variações, nem constituem uma ofensa à dignidade dos parentes e herdeiros", sustentou o juiz de primeira instância. Uma posição replicada pelo Tribunal da Relação de Lisboa. "Da publicação das fotografias no dito livro, não resultou prejuízo para a honra, reputação ou simples decoro de António Variações ou dos seus sucessores", escreveram os juízes desembargadores. José Capacete, Carlos Oliveira e Diogo Ravara concluíram igualmente que, "tendo em conta a notoriedade do retratado e as finalidades culturais e artísticas subjacentes ao livro em causa", está "justificada a dispensa do consentimento dos sucessores" de António Variações para a publicação do livro.
"Projeto estético-visual"
Na ação especial de tutela de personalidade intentada por um dos irmãos do cantor contra Teresa Couto Pinto e a Oficina do Livro referia-se precisamente que não tinha sido dada qualquer autorização para o uso das imagens e que a publicação destas chocou e revoltou os herdeiros de António Variações. "Os requeridos [fotógrafa e editora] agiram por meros interesses económicos e financeiros, para obterem lucros e proveitos à custa da imagem de António Variações", sustentava a família.
Na contestação, Teresa Couto Pinto defendeu o livro era uma "homenagem ao artista, que marcou a música e a cultura dos anos 80, em Portugal". "Trata-se de um artista que entendia o corpo como parte da arte, sem pudor, uma verdadeira extensão da música que afrontava a mentalidade da época", argumentou.
Teresa Couto Pinto afirmou, ainda, que as fotografias agora publicadas são da sua autoria, foram tiradas no âmbito de um "projeto estético-visual" autorizado por António Variações e que integravam "um grande espólio que foi guardado mais de 40 anos".
Capítulo com 29 fotografias do corpo
O livro "António Variações" foi lançado em março de 2020 e está à venda nas livrarias por 35 euros. Com 119 páginas, a obra divide-se em capítulos. O mais contestado pelo irmão de Variações chama-se "O Corpo". Neste, diz o tribunal, "constam 29 fotografias, nas quais António Variações posa para a máquina fotográfica, além do mais, de tronco, parcial ou totalmente, descoberto, e/ou anca, nádega ou coxa descobertas, e/ou com peças de roupa justas que mostram os contornos do corpo, incluindo o sexo, sem, contudo, o mostrar". Para o irmão do cantor que propôs a ação judicial, "tais imagens ofendem gravemente a memória, a honra e a dignidade" de António Variações. Teresa Couto Pinto garante, contudo, que o livro não foi surpresa para os familiares do amigo, até porque, diz, pagou 1230 euros para utilizar as letras das músicas de Variações.