Todos as fitas exibidas passam-lhes pelas mãos, mas confessam que não conseguem ver nenhum filme. Valdemar Silveira projectou no Fantasporto, desde o início, em 1981, até ao ano passado. Cândido Lopes estreou-se neste ano na cabina de projecção do festival.
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"Olha, tu não queiras vir para isto. Se corre bem, ninguém se lembra de ti, mas, se corre mal, toda a gente sabe que existe gente cá em cima". Valdemar Silveira, de 60 anos, cita um diálogo do projeccionista Alfredo com Salvatore em "Cinema Paraíso", o filme que, na sua opinião, melhor homenageia os projeccionistas.
Para Valdemar, a projecção de cinema foi obra do acaso. Desempregado após a guerra do Ultramar, valeu-lhe a morte de um projeccionista do Teatro Carlos Alberto para que fosse preencher a vaga, em 1972. A trabalhar na primeira morada do "Fantas", acompanhou a sua infância, adolescência e entrada na idade adulta, já no Rivoli. "O Fantasporto também me deve um bocado daquilo que é hoje", pondera. Ao contrário de Valdemar, para Cândido Lopes, de 37 anos, o cinema é uma herança. Com a família proprietária do cinema de Sandim, Vila Nova de Gaia, e do "Cinema ao Ar Livre", Cândido experimentou a magia da projecção com apenas nove anos.
Do Fantasporto têm, até agora, algumas experiências idênticas e outras distintas.
"Agora, trabalha-se melhor", afiança Valdemar, que é do tempo em que a enroladeira era manual, as colagens feitas com acetona de dez em dez ou de 20 em 20 metros, sobre fitas velhas, o que obrigava a despender horas nestas tarefas. Nos primeiros cinco anos de festival, ainda projectou com a lanterna alimentada a carvão, antes de esta ser trocada, em 1986, por uma lâmpada.
Actualmente, os filmes estão divididos em cinco ou seis rolos, que demoram cerca de 40 minutos a montar e a desmontar.
Entre as diferenças do passado e do presente está o horário das sessões que, nos primeiros anos do festival, chegavam a começar à 1.15 horas e terminar às 7 da manhã, segundo recorda Valdemar, que até chegou a levar uma cama para a cabina quando tinha sessões para a Imprensa de manhã.
Dos filmes, Valdemar não se lembra e Cândido garante que ainda não conseguiu ver nenhum. Porém, vivem intensamente este festival, que é "a festa do cinema", como afirmam em uníssono.
À cabina chega a "amplificação de 700 pessoas em reacção simultânea", com os "uhs" e "ohs" que o terror e o fantástico pretende. A sensação de "missão cumprida" chega no final das sessões, únicas e irrepetíveis, por vezes, com realizadores presentes, o que aumenta a responsabilidade que sentem.