Orçamento reforça investimento na Cultura com aumento de 21,9% e foco na descentralização
O Governo prevê um orçamento de 638,1 milhões de euros para a Cultura em 2026, de acordo com a proposta de Orçamento do Estado (OE) entregue esta quinta-feira na Assembleia da República. O valor representa um aumento de 21,9% face à estimativa de execução de 2025 (523,6 milhões de euros), prosseguindo o compromisso do Executivo de aumentar em 50% o investimento público na Cultura até 2028.
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Esta é a primeira proposta orçamental após a reestruturação governamental que juntou Cultura, Juventude e Desporto sob a mesma tutela. O novo Ministério, dirigido por Margarida Balseiro Lopes, dispõe de 783,6 milhões de euros, dos quais 638,1 milhões destinam-se à Cultura e 155,5 milhões às restantes áreas. Apesar do reforço, a Cultura continua a representar apenas 0,26% da despesa total do Estado, longe do objetivo simbólico de 1% reivindicado pelo setor.
Uma parte significativa do orçamento cultural - 220,4 milhões de euros - provém do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), ultrapassando mesmo as receitas fiscais afetas à Cultura (203,4 milhões). Esta verba extraordinária permitirá acelerar 85 obras de reabilitação em museus, monumentos e teatros nacionais, incluindo a Torre de Belém e o Teatro Nacional de São Carlos, com prazo de conclusão até junho de 2026. Além do PRR, o financiamento da Cultura inclui 122 milhões de euros provenientes dos jogos sociais da Santa Casa da Misericórdia e 92,3 milhões em transferências entre entidades públicas.
O programa orçamental distribui as verbas em três áreas prioritárias: 345 milhões de euros para a promoção da criação artística e democratização do acesso à cultura; 36 milhões de euros para a proteção e valorização do património cultural; 51 milhões de euros para a criação literária, leitura e património arquivístico. Entre os objetivos centrais, o Governo destaca a implementação de uma política cultural sólida, descentralizada e inclusiva, capaz de "assegurar o acesso universal à fruição cultural, apoiar a criação artística e valorizar o património", segundo o relatório do OE.
Medidas estruturantes e novas regulamentações
O documento elenca várias medidas já anunciadas pela ministra Margarida Balseiro Lopes, agora com dotação orçamental definida. Entre elas estão: A regulamentação da gestão do Fundo de Fomento Cultural, para garantir maior transparência e previsibilidade nos apoios; a revisão do regime legal do mecenato cultural, tornando-o mais atrativo e eficaz na mobilização de recursos; a generalização dos bilhetes gratuitos para acompanhantes de pessoas com deficiência e a criação do selo de acessibilidade para equipamentos culturais; o reforço dos apoios às artes performativas, cinema, teatro e novas expressões artísticas, fundamentais para a vitalidade cultural do território.
Cinema e audiovisual com novo impulso
O Governo prevê ainda o aperfeiçoamento e implementação do programa SCRI.PT, destinado ao desenvolvimento e internacionalização das produções audiovisuais e cinematográficas. Este programa, em fase de consulta pública no final da legislatura anterior, visa consolidar os mecanismos de incentivo ao setor, nomeadamente através da fusão dos atuais cash rebate e cash refund num novo regime, o RIPAC - Regime de Incentivo à Produção Audiovisual e Cinematográfica.
Mantém-se também a transferência de 14 milhões de euros para o Fundo de Apoio ao Turismo e ao Cinema, responsável pela execução dos incentivos à produção nacional e estrangeira. No campo da educação e literacia cultural, o Governo propõe integrar o ensino artístico especializado (música, teatro e dança) na rede pública, com professores especializados e maior flexibilidade curricular. Na literatura, serão relançados os programas de bolsas de criação literária e a segunda edição do Cheque Livro, destinado a promover a leitura e o acesso a obras de autores nacionais. No domínio do património arquivístico, o Executivo compromete-se a avançar com a aprovação do Regime Jurídico de Classificação e Avaliação da Informação Arquivística, consolidando uma política de preservação documental mais robusta e moderna.
Continuidade e metas até 2029
Segundo o Governo, este reforço orçamental dá continuidade a um percurso iniciado em 2025 e visa atingir em 2029 um nível de investimento público na Cultura 50% superior ao de 2024. O Executivo sublinha que esta evolução "não se mede apenas em números, mas no impacto estruturante que a Cultura tem na coesão social, na educação e na identidade coletiva". Apesar do aumento expressivo de verbas, o setor continua distante do patamar reivindicado por agentes culturais e associações, que há décadas pedem um financiamento público à altura do seu peso simbólico e económico. Ainda assim, o OE2026 marca um reforço inédito na última década, sustentado numa estratégia que pretende conjugar investimento, modernização e inclusão, pilares centrais da política cultural do atual Governo.