Aos 91 anos, sobrevivente dos irmãos Taviani, um dos mais importantes realizadores do cinema italiano, tem novo filme, "Leonora addio".
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Os irmãos Taviani, Paolo e Vittorio, formaram uma dupla muito apreciada por gerações de cinéfilos, em particular com os filmes revolucionários que se estrearam em Portugal após o 25 de Abril de 1974, como "São Miguel tinha um galo" ou "Que viva a Revolução". Em 1977, venceram a Palma de Ouro de Cannes com "Padre Padrone" e dez anos depois escolheram Joaquim de Almeida para "Bom dia, Babilónia". Vittorio morreu em 2018, aos 88 anos, e Paolo, com 91, estreou agora, em Berlim, o filme "Leonora addio". É uma nova incursão pelo universo de Pirandello, em dois capítulos, sobre a aventurosa viagem das suas cinzas de Roma para a Sicília. Mas começámos a conversa sobre o trabalho de Taviani com Joaquim de Almeida.
Recorda-se do ator português com quem filmou "Bom dia, Babilónia"?
Vi que, depois disso, fez carreira na América. Estou feliz, porque era um ator magnífico. Mas vou contar-lhe um episódio que poucos sabem. Não me recordo se, para a personagem dele ou do irmão, tínhamos feito um casting com o Matthew Modine, que estava fazer o "Full metal Jack". Telefonou-nos a dizer que Kubrick nos admirava, mas tinha de filmar mais dois dias e não podia fazer o nosso filme. Não era verdade, Kubrick não queria era que o seu ator aparecesse noutros filmes.
Como é que o escolheu?
Precisávamos de atores de origem latina. O Joaquim de Almeida trabalhava imenso, era um grande profissional. Além de falar italiano muito bem. E inglês, também. Lembro-me de o termos encontrado nos EUA, fizemos um casting e, entre muitos, escolhemo-lo a ele.
Os seus filmes falam quase sempre de História. O facto de mostrar o regime fascista de Mussolini neste filme é uma forma de dizer que o fascismo está vivo?
Talvez. Quando Pirandello morreu foi cremado. As cinzas ficaram durante dez anos num cemitério em Roma. Ao princípio queria passar logo para o período posterior. Mas apercebi-me que esses dez anos foram importantes para Itália e para o Mundo. Terríveis, mas fundamentais para o que veio depois. Eu e o meu irmão estávamos lá, éramos crianças.
Dedica o filme ao seu irmão, é uma reflexão sobre a perda. O luto influenciou o filme?
Quem vê o filme é que pode julgá-lo, conhecendo o que fazemos. Fomos pondo as nossas ideias em prática. Ele partiu e eu continuei. Fiz este filme como ele gostaria de o fazer. Claro que é diferente, porque ele não está connosco. Mas houve outra coisa importante depois de o Vittorio morrer, que é a pandemia. Neste Mundo surreal em que vivemos, estes dois episódios são muito apropriados.
O Paolo e o seu irmão fizeram tantos filmes em película, mas agora é tudo em digital. Como é que se adaptou às novas formas?
Lindamente! Tínhamos pensado fazer este filme na Cinecittá com os restos do "Era uma vez na América". Mas demoliram tudo e para construir de novo não havia dinheiro. Consegui fazer o filme graças ao digital. É isso que dá a tantos realizadores a possibilidade de contarem histórias.
Como vê a nova tendência de as pessoas verem mais séries de televisão do que filmes?
Dickens publicava livros em fascículos. "Anna Karenina" foi publicada em fascículos. Com as séries é possível fazer o mesmo. Estou velho, iria morrer no meio da rodagem. Mas gostava de ter feito a adaptação do "O Corsário Negro", de Salgari, o grande amor da minha infância, que o meu pai nos lia nas noites de sábado.
Se víssemos o filme sem saber quem é o realizador, podíamos pensar que era muito jovem, porque mistura vários estilos...
Se este filme me rejuvenesceu talvez tenha sido uma fada encantada que me apareceu. Fiz este filme num momento muito peculiar e decidi fazê-lo da forma mais livre que podia, sem nenhum esquema narrativo rígido. Não quis seguir nenhuma regra, mas não houve nada de premeditado. O cinema é uma das atividades mais imprevisíveis que se podem imaginar.