Fundador da instituição revela ao JN que vai abandonar a direção do organismo que criou em 2011: “É altura de passar a pasta”.
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A Academia Portuguesa das Artes e das Ciências Cinematográficas foi fundada a 8 de julho de 2011. Nos recentes Prémios Sophia, face mais visível da atividade da instituição, o seu fundador e principal alma desde o início, o produtor Paulo Trancoso, anunciou que não se iria recandidatar a um novo mandato, nas eleições marcadas para o fim do ano. Ao JN, explicou as suas razões e fez o balanço destes 14 anos de trabalho.
Porque decidiu anunciar a sua retirada da direção da Academia?
Vamos festejar agora 14 anos, por isso, mais ano e meio de preparação, são 15 anos que dediquei à Academia. Não me quero eternizar como ditador da Academia, longe disso. Os tempos vão mudando, a Academia cresceu, institucionalizou-se e é um desafio para as novas gerações tomarem conta da Academia. E ainda me quero desafiar a fazer qualquer coisa na área do cinema. Era a altura de passar a pasta, sentindo que o dever foi cumprido.
Como é que sente que deixa a Academia?
A Academia e os Prémios Sophia são hoje uma referência. Não existiam há 15 anos. E como é sempre um grande desafio financeiro o dia a dia da Academia, e as sucessivas iniciativas que tem ao longo do ano, deixo a Academia com a certeza de que os próximos anos estão garantidos. A próxima direção pode confiar na resiliência da Academia. Mas também espero estar presente nos próximos prémios Sophia como espectador.
De todos os objetivos que tinha na altura da formação da Academia, há alguns em especial que não conseguiu concretizar?
Não consegui termos uma sede consonante com os projetos que a Academia tem e com aquilo que deu à cultura do país. Onde pudéssemos ter uma mediateca, com livros e DVD de cinema, onde os estudantes pudessem ir. E um museu, com muita coisa que já temos e outra que nos está prometida – também era importante para consolidar a memória do cinema. E um anfiteatro, a projetar só cinema português, sem sair de sala logo ao fim de uma semana. Que as pessoas soubessem que é ali a casa do cinema português.
Diria que há um antes e um depois da Academia?
Claramente que há um antes e um depois da Academia. Em termos de premiação é óbvio. Uma das missões que delineei foi premiar os cineastas, os técnicos e os atores que se consagraram à profissão. Muitos nunca tinham sido premiados. Era algo que me afligia, gente morrer sem nunca ter sido homenageada. É emocionante perceber que essas pessoas foram reconhecidas em vida pela comunidade do cinema. Só por isso já valeu a pena.
Além dos Prémios Sophia, que outro tipo de atividades organizam ao longo do ano?
O Sophia Estudante. Até já encontrámos em Albufeira uma casa onde podemos ter os estudantes selecionados que vêm de todo o país. Recebemos mais de 130 filmes de escolas por ano. E ao longo de uma semana assistem a masterclasses, a discussões sobre o futuro deles. No início, as escolas estavam um pouco desconfiadas, sempre nas suas capelinhas, mas este ano a comunidade juntou-se e discutiram uns com os outros. Eles são o futuro do cinema português.
O Passaporte tem funcionado como previam?
É organizado pela Patrícia Vasconcelos, mas sempre com o apoio da Academia. Hoje vemos um filme ou uma série estrangeira e de repente está lá um ator português. Os Prémios Bárbara Virgínia consagram uma mulher do cinema todos os anos. Temos as Oficinas da Academia, todos os anos relacionadas com uma área específica da atividade cinematográfica. Esta área da formação é muito importante.
Também tiveram uma operação conjunta com a Netflix?
Há dois anos que temos iniciativas com eles. No primeiro foi sobre filmes de mulheres e foram escolhidos cinco que passaram na Netflix. No segundo ano foi o “Pitch me”, onde se mostrou como se deve apresentar um projeto. E os que saíram dali foram todos escolhidos pelos produtores portugueses. São futuros filmes.
Como é que está a atividade editorial da Academia?
Temos uma coleção de DVD, que começámos e agora fazemos em colaboração com a Cinemateca. Agora vai sair o “Sofia e a educação sexual”, do Eduardo Geada. Não deixamos cair o DVD. E estamos a editar vários volumes da História da Animação em Portugal, do Paulo Cambraia. E vamos continuar a apostar, seguramente, em outras edições.
Quantos membros tem hoje a Academia?
Neste momento temos cerca de 1200, distribuídos pelas várias categorias de membros. Há os permanentes, os temporários, que ainda não têm filmes suficientes para serem permanentes, os membros associados, como alguns críticos, diretores de festivais, exibidores e distribuidores. E ainda temos os Amigos da Academia, só para quem quer ajudar a Academia. É um número muito razoável, comparado com os 30 que começaram. Chegámos a um patamar com que nunca sonhámos.