A Cooperativa Árvore, no Porto, vai criar um departamento de peritagem científica para avaliação de obras de arte. A iniciativa foi revelada ao JN por José Emídio, presidente da cooperativa, no âmbito da exposição "O falso na pintura", que reuniu obras falsas do núcleo museológico da Polícia Judiciária (PJ).
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Em 2019, a Polícia de investigação fez 50 apreensões de obras de arte falsas - uma média de quase uma por semana. Com a criação deste núcleo, os compradores podem recorrer à Árvore para se certificarem da veracidade da obra que estão a adquirir.
Quem se julgar vítima de burla tem de recorrer à PJ. "O objetivo primordial da Polícia não é só a investigação, mas também prevenir o crime. E como a arte falsa é um crime de burla qualificada, só a Polícia Judiciária tem competência nesta matéria", esclarece ao JN Norberto Martins, diretor da PJ/Norte.
A média anual de apreensões nos últimos anos varia entre 35 a 50 por ano. "A maioria das queixas parte dos artistas falsificados ou dos familiares, no caso de já terem falecido", explica o responsável.
Em Portugal, o artista mais falsificado é Júlio Pomar, pintor falecido em 2018. Mas nas apreensões (a grande maioria são pinturas, alguns artigos de arte sacra e escultura), além dos grandes nomes de portugueses, encontram-se também falsificações de artistas como Picasso ou Cézanne.
Técnicas de verificação
As feiras de antiguidades e lojas onde se vende papel antigo são os sítios de eleição que os falsificadores frequentam. Mas até em locais insuspeitos, como galerias de arte ou museus, se encontraram cópias. Para certificar que se trata de uma falsificação, a Polícia recorre muitas vezes a comités de peritagem com artistas, e também a técnicas científicas. Na maioria das vezes, o erro é detetado no suporte: o tipo de papel ou de material usado não se coaduna com o tempo em que determinado artista viveu ou que utilizava. Ainda que haja imitações grosseiras, a maioria são de "pessoas que conhecem a técnica e a linguagem de quem imitam", explica José Emídio. Os dados da PJ também garantem que a maioria dos falsificadores é do sexo feminino.
perdeu dois milhões de euros
Entre os vários casos recordados por Norberto Martins, está o de um empresário português que, em plena crise, foi aconselhado a investir em obras de arte - uma aposta aparentemente segura e que iria valorizar com os anos. Entrou em contacto com um "marchand" espanhol, que lhe vendeu obras, com certificados, no valor de dois milhões de euros. Mas quando as tentou vender, foram apreendidas. Eram todas falsas, assim como os certificados. O caso agravou -se com a morte do "marchand" durante a investigação. A vítima da burla apenas teve direito a uma parca indemnização.
Outra das denúncias que a Judiciária recebeu veio de um hotel. Um hóspede partiu acidentalmente uma moldura e o que caiu era, afinal, uma fotografia do quadro. Alguém levou o original e deixou lá a imagem (uma falsificação grosseira) sem que ninguém se apercebesse.
Em 2008, outro caso. Um homem pagava a uma mulher viciada no jogo 25 euros por imitação. A falsificadora fazia dez por dia e ele vendia as "obras" depois por milhares de euros, contou um dos investigadores. Acabaram por ser apanhados pela PJ e acusados de burla.
Para emoldurar
Aguarelas copiadas e desenhos falsos de Negreiros - Em agosto de 2017, foi notícia o falsário que, com três ou quatro euros, conseguia digitalizar, reproduzir e ampliar aguarelas do autor portuense Joaquim Costa, que depois vendia, no seu local de trabalho. Mas o falsário, de 50 anos, foi descoberto pela Polícia Judiciária do Porto, que apreendeu 76 aguarelas falsas. No mês anterior, a PJ apreendeu numa feira de antiguidades, em Espinho, 26 falsos desenhos de Almada Negreiros, que até tinham certificados.
Elmyr de Hory, pintor e talentoso falsificador - Elmyr de Hory foi o falsificador de arte mais famoso de todos os tempos. A sua vida deu origem ao livro "Fake", de Clifford Irving ,e ao filme "F is for fake", de Orson Welles. O húngaro, mestre do disfarce e da falsificação, conseguiu vender a reputados museus obras falsas de Henri Matisse, Picasso, Amedeo Modigliani e Renoir. Um dos seus "Matisse" esteve no Fogg Museum da Universidade de Harvard.