“Thee black boltz” assinala a refulgente estreia a solo do cantor dos TV on the Radio.
Corpo do artigo
Lidera um dos números mais estimulantes do início do milénio – os TV on the Radio, poção de rock embebida em pós-punk, eletrónica e música negra. Tornou-se ator relevante nos últimos anos, participando na série “Star Wars: skeleton crew”. E nunca abandonou a banda desenhada e a colaboração com outros projetos musicais. Tunde Adebimpe, norte-americano de ascendência nigeriana, estreou-se a solo aos 50 anos com “Thee black boltz”.
Escutando-se as 11 faixas, onde se digladiam géneros e disposições, é inevitável sentir o eco dos autores de “Retun to the cookie mountain” (2006) – estão lá as camadas sintéticas e orgânicas, as mudanças de ritmo e temperatura, a exploração de harmonias e as letras escapistas e misteriosas. Mas o álbum tem identidade própria, desde logo porque parte de uma tragédia pessoal – a morte da irmã mais nova de Adebimpe durante a pandemia.
O Mundo entrou em parafuso desde então, parecem dizer as faixas refulgentes de “Thee black boltz”. Não só o Mundo de Adebimpe, mas o de todos nós. Após uma entrada serena em spoken word, com poesia que parece apontar para a aceitação das dores e dos conflitos, seguem-se três ataques de pânico – “Magnetic”, talvez a mais conseguida das canções; “Ate the moon” e “Pinstack”. Entre vagas mais ou menos encapeladas de electro, o cantor desabafa a sua ansiedade política, mencionando tumultos, distopias, autoritarismos.
A introspecção atinge o ápice em “ILY”, balada pastoral que se distingue no meio do disco como clareira no interior de um bosque. É aqui que Adebimpe se dirige à irmã: “Let’s wait for the stars to shine / So maybe we can see it better/ And we could take the time / If only just for one more day.”
O resto do álbum é ciclotímico. Há voz alterada por vocoder, há beatbox, há esperança e há desespero. “Thee black boltz” deixa um tom inconclusivo, como parte de um processo – a carreira de Adebimpe, o estado do Mundo – que está ainda em marcha.