Formação dos magistrados e dos órgãos de polícia criminal "vai manter-se e ser incrementada"
Problemas em torno da igualdade "não se resolvem só com dinheiro, resolvem-se com políticas públicas assertivas", diz a secretária de Estado da Igualdade. Carla Rodrigues não levanta o véu sobre medidas que estejam a ser preparadas em torno da violência digital ou a dotação orçamental da pasta para 2026, mas diz que a formação dos profissionais da Justiça está para continuar
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Secretária de Estado Adjunta e da Igualdade não antecipa se a fatia orçamental para a pasta que tutela vai aumentar em 2026, embora gostasse. No âmbito da apresentação do estudo que revelou que uma em cada cinco mensagens recebidas por mulheres políticas e ativistas na rede social X era violenta, Carla Rodrigues considerou que a violência digital "combate-se com a educação e literacia digitais, responsabilização das plataformas e políticas públicas com a igualdade no centro". À margem do evento, a responsável política, que foi presidente do Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA) abordou a necessidade de políticas públicas assertivas, as implicações da nova disciplina educação para a cidadania e a regulamentação da Gestação de Substituição.
Que medidas prepara a Secretaria de Estado para combate à violência digital?
Este combate a todos os tipos de violência que afetam as mulheres é global, de todos. O Governo não vai trabalhar estas questões de forma isolada, mas em parceria com a sociedade civil, as instituições, aproveitando os estudos que são feitos. Há, independentemente das divergências político-partidárias, um consenso alargado, há terreno comum para trabalhar.
O governo também tem, em parte, esse poder. Prepara iniciativas?
Neste momento ainda não estamos, em concreto, a preparar. Mais importante do que legislar, nós temos também já um robusto suporte legislativo em Portugal. Claro que a sociedade é dinâmica, a criminalidade vai-se alterando e, havendo necessidade de fazer ajustes legislativos, também acompanharemos. É preciso haver um conhecimento pleno das ferramentas que temos e que essa legislação seja bem aplicada por quem o faz.
Que medidas estão a ser pensadas nesse domínio?
Tem havido ao longo de anos uma necessidade extrema de formação dos magistrados, dos órgãos de polícia criminal, que não começou com este Governo. Vai manter-se e vai ser incrementada. O Ministério da Justiça, que tem a tutela sobre os tribunais, está muito empenhado nessa formação, e nós também: na formação dos órgãos de polícia criminal e até dos bombeiros, os primeiros rostos que as vítimas encontram quando pedem socorro.
Há reforço orçamental para a igualdade no OE2026?
Ainda não fechámos essa parte, não me vou comprometer, gostava muito, mas também sei que, e vamos desmistificar, estes problemas não se resolvem só com dinheiro, resolvem-se com políticas públicas assertivas, direcionadas para os problemas concretos. Mas é óbvio que, na resposta às vítimas há uma componente financeira muito importante. Que os recursos financeiros não sejam nunca uma desculpa para não cumprirmos este desidrato de combater a violência doméstica, a digital, nas redes sociais, contra meninas e crianças.
Nesta conferência sobre a violência digital sobre as mulheres com projeção pública foi levantada a questão de como a educação para cidadania era importante para lidar com estas matérias. A secretaria de Estado acompanhou as mudanças na disciplina? E agora, o que pode ser feito?
Nós estivemos ativamente a trabalhar com o Ministério da Educação, inclusive na elaboração dos conteúdos essenciais da disciplina para a cidadania. Repare que, pela primeira vez, é integrada nos currículos, não é um corpo estranho, tem o formato de uma disciplina normal. Este Governo está mesmo a valorizar esta disciplina, não só lhe deu a importância de ser uma disciplina integrada no currículo formativo, como também lhe deu esta sistematização de tudo aquilo que são os conteúdos essenciais e que a devem integrar: a componente dos Direitos Humanos, da educação para a saúde, da defesa da igualdade.
Mas a questão da educação sexual é crítica.
A educação sexual não se resume à disciplina de cidadania. Mal seria se, nas escolas, isso acontecesse. A educação sexual está também nas outras áreas, nas outras disciplinas, e é fundamental que deva ser dada não só numa componente biológica e física, mas também numa componente mais alargada dos afetos, do consentimento, da educação também para o respeito pela igualdade.
Este novo modelo responderá a estas matérias [da violência digital]?
Estamos certos que sim, mas obviamente também estamos aqui para analisar e para melhorar sempre que possível, mas estamos seguros.
Há equipa de monitorização?
É ao nível do Ministério da Educação.
Mas no que dependa da igualdade?
Sim. Nós acompanhamos todas estas questões, mesmo que seja no âmbito da tutela de outros ministérios. O Ministério da Educação está a monitorizar a implantação, porque agora é tudo novo e o ano letivo está a começar. Depois, obviamente, o desenvolvimento e eventual melhoria que possa haver. Estamos sempre abertos a modificar se for para melhor.
Enquanto presidente da Comissão Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA) reiterou a urgência da regulamentação da Gestação de Substituição, que está atrasada em anos. Uma vez no governo, como está esta matéria?
Infelizmente não tenho notícias. Pelo facto de ter deixado as minhas anteriores funções de Presidente da CNPMA que não abandonei as minhas lutas durante tantos anos, porque acho que são lutas justas.
Mas esta também não é uma matéria que toque esta pasta [da Igualdade]?
Não, é uma matéria da área da Saúde. Não tendo agora esta pasta, continuo a acompanhar e continuo, de alguma forma, a mover, no fundo, as influências que possa para que a regulamentação seja uma realidade. Não é pelo facto de eu agora fazer parte do Governo que deixei de acreditar ou defender o que sempre defendi, que a regulamentação da Gestação de Substituição é fundamental, porque isso também tem a ver com respeito por Direitos Humanos e com um profundo respeito pelos Direitos das Mulheres, sobretudo estas que sofrem de uma doença e que não podem ter uma gravidez usando o seu próprio corpo, não têm uma resposta legal para o seu problema de infertilidade. Portanto, é fundamental por uma questão de respeito e de, também, igualdade. É uma injustiça atroz.
Neste novo papel de secretária de Estado pode fazer o quê de diferente face ao anterior como presidente da CNPMA?
A única coisa que eu posso fazer, e faço, é sensibilizar quem tem essa pasta, quem tem essa responsabilidade para a importância e para a urgência. É uma questão de justiça também que isso se faça para estas mulheres que desesperam há tantos anos.