Usar ou não cuecas quando se corre é questão que ainda faz corar.
Corpo do artigo
- "Eh pá, estou toda assada!"
- "Já experimentaste "à comando"?"
- "Sem cuecas!? Não consigo..."
- "Experimenta".
A conversa é mais ou menos fidedigna e já tem umas quantas reproduções no repertório da autora destas linhas. Nos dois sentidos e sempre com a mesma resposta: "Correr sem roupa interior? Ca nojo! Maluca!" Treta. Não é um nojo, a roupa de corrida passou a cheirar mesmo a lavado depois de lavada e as assaduras foram assar outra. Portanto, fica assente desde já a defesa, neste artigo, do exercício "à comando". Mas vamos tentar dar algum caráter científico a uma convicção pessoal.
Por partes. A maioria da roupa interior, para ser confortável, é de algodão. E o algodão, sabe-se hoje, cientificamente, não é o melhor amigo do corredor. O estudo "A influência dos tecidos de roupa desportiva na saúde e na performance dos atletas", publicado em 2012, concluiu que o "100% polyester" bate aos pontos o "65/35 polyester/algodão" e arruma completamente o "100% algodão". Os investigadores atribuem uma melhor resposta fisiológica ao polyester, devido à maior permeabilidade do vapor de água e à menor condutividade térmica, facilitando a regulação da temperatura do corpo e, por conseguinte, a performance cardiorespiratória.
Já os atletas que optaram pelo tradicional algodão revelaram problemas na gestão da humidade: a respiração é melhor absorvida pelo algodão, é um facto, mas não seca com duas tretas, fica ali bem colada ao corpo. Além de desagradável, pode gerar uma sensação de frio. Com polyester, o suor é rapidamente afastado da pele, pelo simples facto de que o tecido é propício à secagem rápida.
E agora vem aquela outra pergunta, porventura mais colocada por corredores: mas e então a cueca não serve para suster o material estalactítico e evitar assaduras? Verdade. Por isso é que a maioria dos calções de corrida têm uma espécie de cueca incorporada se forem largos (geralmente em rede), ou são ajustados ao ponto de conter protuberâncias. E estes, se o produto for de qualidade, têm até um minúsculo triângulo de um tecido pouco abrasivo para proteger da eventual irritação das costura. Isto é válido para homens e para mulheres e para corrida ou bicicleta.
Ramón Grimalt, dermatologista, maratonista e bloguer, explicou ao "El País" que uma cueca de fraca qualidade, ou apenas um pouco larga, acaba por criar dobras e mexer-se debaixo do calção, "causando mais danos do que o calção sem nada". Mais prosaicamente, correr com roupa interior é tão lógico quanto ir para a praia com roupa interior - porque os tecidos do equipamento de corrida e do fato de banho, na verdade, são semelhantes. E uma cueca na praia é um salto alto no tartan...
Realçando a necessidade incontornável do uso de roupa interior por mulheres na altura do período, o treinador Joe English recomenda, no seu blogue "Running Advice", que quem não quiser mesmo deixar a cueca na gaveta deve escolher uma justa e de malha que permita eliminar a humidade, se possível com alguma perna, para evitar as comuns fricções nas coxas.
Mas voltemos à cueca de algodão: pelos problemas atrás expostos - dificuldade de secagem -, são perfeitas para acumular bactérias num sítio onde a flora é abundante e podem potenciar infeções em quem tem tendências para desenvolvê-las. Ainda que mais performantes na eliminação da humidade, as malhas sintéticas também acumulam essas coisas desagradáveis. Qualquer equipamento deve, por isso, ser tirado quanto antes - antes da cervejinha da hidratação - e lavada após cada uso, para evitar que o micrococo (é mesmo assim) lhe dê aquele cheiro nauseabundo. Blheck!
Posto isto, um dia iremos aos sutiãs.