Parece que foi ontem, mas completam-se hoje 25 anos que morreu o melhor ciclista português de todos os tempos. O "grande" Agostinho, uma força bruta a pedalar, deixou o país orfão de ídolos no ciclismo até hoje.
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O cão era grande e Joaquim Agostinho, com 41 anos, fez de tudo para evitá-lo, mas acabou caído na estrada, em plena recta final da 10.ª etapa da Volta ao Algarve, na Quarteira. A queda foi para trás e a lesão gravíssima. Mas só se apercebeu disso depois do banho tomado na pensão, horas depois da corrida. Foi na manhã de 30 de Abril de 1984. "Afinal, isto é grave", tremeu, agarrado à parede e às tonturas, enquanto fazia um esforço hercúleo para se manter em pé.
O Portugal, que tanto prestigiou, foi o primeiro a traí-lo. Como não havia serviço de neurocirurgia na região e o helicóptero não estava disponível, meteram-no numa ambulância. Perdeu a consciência em Alcácer do Sal - tinha um coágulo do tamanho de um limão no cérebro e uma fractura, com afundamento no osso parietal direito - e nunca mais acordou. Apesar de terem sido oferecidos os serviços de padres e de bruxos para o curarem, a sua condição era irreversível e morreu às 9.37 horas, do dia 10 de Maio, em Lisboa.
O país chorou e não mais se recompôs no ciclismo. Nunca mais fabricou um igual. Mas diga-se que a tarefa não é nem será propriamente fácil.
Nascido em Brejenjos, Torres Vedras a 7 de Abril de 1943, despertou tarde e a más horas para a modalidade - tornou-se profissional aos 25 anos. Mesmo assim, o busto de bronze que ocupa a 14.ª curva do Alpe d`Huez, a mãe de todas as montanhas da Volta à França, é ilustrativo de que não estamos a falar de um corredor qualquer.
Nas 13 edições que correu no "Grande Boucle", ficou entre os dez primeiros em oito e no pódio (3.º lugar) em duas ocasiões. Conquistou cinco etapas, uma das quais o Alpe d´Huez. Em Espanha, na "Vuelta", foi segundo classificado em 1974, ano em que ganhou as titânicas tiradas de Lagos de Covadonga e de Cangas de Oniz. Em Portugal, arrebatou três Voltas e foi seis vezes campeão nacional. Conquistou ainda o 16.º lugar nos Mundiais de estrada de Imola.
As quedas foram uma constante da carreira. Os amigos diziam, meio a brincar meio a sério, que não sabia andar de bicicleta. Faltavam aptidões técnicas para alguns troços a "Quim Cambalhotas". Ainda hoje se diz que uma "curva à Agostinho" é aquela se faz a direito rumo à ribanceira. Assustados com o elevado número de lesões, a mulher Ana Maria e os filhos Miguel e Ana convenceram-no a retirar-se em 1982. Alegadas dificuldades financeiras voltaram a pô-lo na estrada.
Dois casos de doping marcaram o percurso: foi afastado da maior competição portuguesa em 1969 e 1973. Face à falta de uniformização relativamente a substâncias proibidas, um produto tolerado em França - um estimulante chamado Ritalina - não era autorizado aqui. Mas nunca chegou sequer para ensombrar o mito.