Há uma diferença de 289,8 milhões de euros entre os valores anunciados pelos clubes e as mais-valias.
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A loucura da janela do mercado de inverno terminou no passado dia 1 e a venda de Enzo Fernández do Benfica para o Chelsea foi a mais sonante. O valor comunicado pelas águias regista o negócio em 121 milhões de euros mas, subtraindo os custos de intermediação, mecanismo de solidariedade e a percentagem da venda ao River Plate, os encarnados encaixam 81,7 milhões. Em todas as transferências, há uma diferença entre o valor comunicado e a real quantia monetária que um clube recebe. Em Portugal, desde a época 2017/18, os quatro principais clubes comunicaram que venderam, no total, 1242,7 milhões de euros nas principais transferências. No entanto, contas feitas, "apenas" entraram nos cofres 952,9 milhões, o que se traduz numa diferença de 289,8 milhões de euros.
O JN analisou os relatórios e contas das sociedades e os comunicados à CMVM de todas as vendas de Benfica, Sporting, F. C. Porto e Braga acima de 20 milhões de euros para esmiuçar as transferências, desde os serviços de intermediação ao mecanismo de solidariedade. Nos mais recentes, há comunicados que informam de forma clara quanto é a percentagem ou o valor da intermediação dos agentes e ainda quem está encarregue de pagar o mecanismo de solidariedade, distribuído pelos clubes por onde o jogador passou na formação. Nestes casos, é possível entender quanto uma transferência rendeu realmente a um clube.
Em comunicados mais antigos, a informação é mais escassa e apenas reporta o valor da venda e o nome do comprador e, nestas situações, o JN analisou os relatórios e contas para obter mais informações. Neste processo, verifica-se que os clubes apenas revelam quanto o futebolista gerou em mais-valias. Para chegar a este montante, é subtraído o valor total da transferência ao custo de compra e outros pormenores como comissões, acertos de contas e percentagens do passe detidos por terceiros, entre outros. Assim sendo, nestes casos pode-se concluir que o dinheiro que entrou nos cofres é o valor líquido da transferência.
Veja na galeria as principais vendas de cada clube. O primeiro valor é a quantia comunicada pelos emblemas, sendo que na coluna da direita é quanto é que o negócio efetivamente rendeu.
Por exemplo, na venda de Porro para o Tottenham, o Sporting explica que o mecanismo de solidariedade foi suportado em cerca de 95% pelos ingleses e que os serviços de intermediação ascenderam, no total, a 2,811 milhões de euros. Ou seja, dos 45 milhões de euros comunicados, os leões vão receber 42,07 milhões após o empréstimo do jogador. No entanto, só o próximo relatório e contas irá esclarecer se o Manchester City, o anterior clube do espanhol, será compensado em 11,8 milhões por supostamente ter 30% de uma mais-valia.
Em sentido contrário, em 2017, no comunicado à CMVM, o Benfica apenas refere que vendeu Ederson ao Manchester City por 40 milhões de euros. Porém, no relatório e contas da época 2017/18 os encarnados informam que o jogador gerou uma mais-valia de cerca de 17,7 milhões de euros. Há ainda o caso de Luis Díaz, transferido do F. C. Porto para o Liverpool em 2022 por 45 milhões de euros, mas só gerou uma mais-valia de 24,9 milhões, até porque os dragões apenas tinham 80% do passe.
A venda de Vitinha ao Marselha foi, talvez, das melhores nos últimos anos, mesmo que o valor não seja de três dígitos. O Braga recebeu 32 milhões de euros, acima da cláusula de rescisão, e apenas pagou 1,18 milhões de serviços de intermediação, sendo que o mecanismo de solidariedade é assegurado pelos franceses.
Perguntas e Respostas
Quanto é que os clubes pagam em comissões?
De forma a criar um princípio regulador, a FIFA estabeleceu que o limite das comissões pagas aos agentes de futebol é de 10%. A norma entrou em vigor no início desta época e foi criada porque antes de junho de 2022, os intervenientes acordavam comissões de forma arbitrária, muitas vezes em função da importância dos negócios e isso causava muitos desequilíbrios. Normalmente, as comissões aos empresários de futebol são pagas pelo clube vendedor.
Por que os clubes pagam o mecanismo de solidariedade?
A FIFA criou o mecanismo de solidariedade para que os clubes formadores do jogador transferido possam ser compensados financeiramente no processo de ascensão do atleta. O mecanismo corresponde a 5% do valor da transferência e é distribuído pelos clubes representados pelo futebolista entre os 12 e os 23 anos. O montante a receber corresponde sempre à proporcionalidade do período de tempo que o jogador atuou no emblema formador. Nem sempre é o clube vendedor que paga o mecanismo de solidariedade, depende do acordo estabelecido na transferência.
Os clubes pagam impostos pelas transferências?
Os clubes não pagam impostos pelas transferências, mas são taxados pelos lucros que apresentam nos finais dos exercícios. No fundo, o processo aplica-se aos clubes de futebol como se fossem uma empresa. Sendo assim, é aplicada a taxa de IRC (Rendimento das Pessoas Coletivas) que é de 21%.
As cláusulas de rescisão têm de ser pagas a pronto?
De acordo com o regulamento da FIFA, sim. Se alguém bater a cláusula de rescisão e o jogador aceitar o negócio, o clube terá de permitir a transferência. Como os montantes têm de ser pagos por inteiro, alguns negócios fazem-se acima do valor da cláusula para que o valor remanescente funcione como forma de pagamento a uma entidade bancária. Esta, por sua vez, assume saldar a cláusula de rescisão na totalidade ao clube vendedor. Mas há clubes que negociam o pagamento das cláusulas de forma faseada.
É possível um dos clubes anteriores do jogador receber uma percentagem de uma futura transferência?
Sim. Há muitos clubes que garantem posições percentuais de mais-valias em futuras transferências, porque confiam na margem de progressão do jogador e na sua capacidade de valorização.