O treinador sueco Sven-Göran Eriksson, tricampeão português no Benfica e primeiro estrangeiro a ocupar o cargo de selecionador inglês de futebol - apropriado à fama de "gentleman" que o acompanhava -, morreu hoje, aos 76 anos, vítima de um cancro no pâncreas.
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A pose serena, o diálogo aberto e a imagem de alguém que nunca perdia a paciência talvez tenham sido um dos traços mais visíveis de Sven Goran-Eriksson, um treinador que operou uma revolução no futebol português quando chegou ao Benfica no início da década de 1980. Mais do que isso, o treinador sueco também foi alguém que dominou a tática, o treino e criou uma relação de abertura com os jogadores dentro de um princípio em que a exigência tinha de ser máxima.
Morreu esta segunda-feira aos 76 anos, vítima de um cancro no pâncreas, depois de ter dito que "a vida também é saber morrer".
Quando chegou ao Benfica em 1982, apenas tinha 34 anos e foi uma aposta de risco do presidente Fernando Martins, numa altura em que o futebol português valorizava mais os treinadores veteranos do que os jovens promissores. A verdade é que Eriksson foi uma lufada de ar fresco: trouxe métodos de treino inovadores e um futebol vertical, asfixiante e físico que marcou uma era e levou os encarnados à conquista de dois campeonatos nacionais consecutivos e à presença na final da Taça UEFA, perdida diante do Anderlecht.
Mal chegou à Luz, o treinador sueco impôs um estilo muito próprio que se tornou numa imagem de marca de alguém que trazia conceitos revolucionários. Aboliu as corridas na mata durante a pré-época, porque como uma vez confessou não era treinador de equipas de atletismo, e introduziu a bola nos exercícios físicos. Também permitiu a ingestão de líquidos durante os treinos, uma prática proibida por muitos técnicos há mais de 40 anos.
Os jogadores tinham ainda liberdade de ação fora do campo, mas eram responsabilizados até ao limite. Um exemplo disso foi ter acabado com os estágios da equipa nos jogos em casa, fazendo com que o Benfica apenas se concentrasse ao almoço, no hotel do presidente Fernando Martins.
Duas épocas em grande estilo levaram-no até Itália, onde treinou a Roma e a Fiorentina, até voltar ao Benfica em 1989 para aquela que foi a última passagem pelo futebol português. Em três épocas conquistou um campeonato nacional e levou os encarnados à final da Taça dos Campeões Europeus, perdida para o Milan (1-0), uma das melhores equipas do Mundo naquela época. Tinha um naipe de grandes jogadores, mas debateu-se com um F. C. Porto cada vez mais forte e isso cortou-lhe as aspirações de ter deixado uma marca tão persistente como na primeira passagem.
A verdade é que Eriksson trouxe conceitos novos ao futebol português, algo que duas décadas depois também José Mourinho foi capaz de mostrar, quando chegou ao F. C. Porto para alcançar a glória europeia. Ambos eram apaixonados pelo treino, pela pressão alta e adeptos da modernidade. Aliás, Mourinho chegou a confessar que quando era estudante assistia aos treinos do sueco, um obcecado pela ocupação dos espaços, pelas questões defensivas mas que dava margem à criatividade atacante.
Em 1992, depois de uma eliminatória épica com o Arsenal e de ter lançado Rui Costa a titular em Londres, perdeu o campeonato para o F. C. Porto e voltou para Itália, onde treinou a Sampdoria, e depois ajudou a construir a Lazio, já com Sérgio Conceição e Fernando Couto, que seria campeã nacional. Pela equipa romana ganhou ainda uma Taça das Taças, que juntou à Taça UEFA, esta conquistada ao serviço do Gotemburgo e lhe abriu as portas do Benfica.
Foi selecionador de Inglaterra, o primeiro estrangeiro a assumir o cargo, passou pelo Manchester City, treinou a seleção mexicana e esteve na China. Mas já sem o brilho do início da carreira. Para a história fica a marca de um treinador que ajudou a revolucionar o futebol português. Calmo e sereno. Um verdadeiro gentleman.