O orçamento da União Europeia (UE) terá de pagar os empréstimos do PRR até 2058 e isso vai fazer com que aumente a pressão para cortes nas políticas agrícolas e de coesão. A UE perde, anualmente, o equivalente a um orçamento em fraude e fuga ao fisco.
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Referindo-se à possibilidade das decisões relacionadas com os fundos comunitários serem centralizadas e de haver cortes nas políticas de coesão e agrícola, na abertura do Forum Regional da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N) “Europa-Pós 2027: Quo Vadis?”, o ministro da Agricultura e Pescas, José Manuel Fernandes, colocou a tónica na necessidade de executar as verbas disponíveis para defendermos junto de Bruxelas a necessidade da continuidade destes fundos.
O ministro diz que a posição do Governo “é clara na defesa da Política Agrícola Comum (PAC) e das políticas de coesão (Fundo Social Europeu, Fundo de Coesão e Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional), mas reconhece que há neste momento uma enorme pressão sobre o orçamento comunitário, com a necessidade de aumentar a despesa em defesa e com o pagamento dos empréstimos do PRR já no horizonte. O Presidente da CCDR-N, António Cunha, e da Associação Nacional de Municípios, Luísa Salgueiro, convergem na necessidade de manter as regiões no centro das decisões sobre os fundos europeus.
Para José Manuel Fernandes, as 248 NUTS II (as regiões) que existem na Europa são fundamentais para a implementação dos fundos da coesão. “A melhor forma de defender a política de coesão é executar”, alerta. Diz o ministro que, se não for assim, Bruxelas pode usar o argumento: “vocês têm dinheiro à vossa disposição e não o utilizam. Como é que podem pedir mais recursos?” Segundo José Manuel Fernandes, o trabalho de António Costa, enquanto presidente do Conselho Europeu, será fundamental para convencer os Estados para a importância da política de coesão. De acordo com o governante, não são só os receptores líquidos, como Portugal, que beneficiam destas políticas. “Os chamados países frugais também ganham com o mercado único. Vejam-se as obras que se fazem em Portugal, de onde é que vêm os materiais?”, sublinhou.
Evitar tribunais
A aceleração da execução, na opinião do ministro, passa pela “diminuição da burocracia”. Segundo José Manuel Fernandes, é aquilo que o ministro Adjunto e da Coesão Territorial, Manuel Castro Almeida “está a fazer, simplificando os processos, fazendo com que as candidaturas do PRR possam avançar, ainda que haja litígios”. O ministro lembra que “se um processo cair num tribunal administrativo, acaba o quadro financeiro sem que haja decisão”. O governante afirma que a necessidade de acelerar o Portugal 2030 se deve “ao atraso no quadro 2020, que estivemos a fechar”. José Manuel Fernandes refere, que no âmbito do seu ministério, lançou concursos simplificados, nomeadamente com pagamentos contra fatura. “Em abril, tínhamos ainda 680 milhões de euros por executar, referentes ao PDR 2020. Se somarmos os 400 milhões de euros do PEPCAC (Plano Estratégico da Política Agrícola Comum) que temos que pagar no próximo ano, estamos a falar de mais de mil milhões de euros”, sinalizou.
O presidente da CCDR-N, António Cunha, defende que “o desafio é planear e executar”, indo ao encontro das preocupações do ministro. “Vivemos num inferno de regulamentação e pagamo-la agora”, apontou. O presidente da CCDR-N defende um modelo de aplicação dos fundos semelhante ao atual, em que as regiões se mantenham no centro, mas com “uma redução da teia burocrática e administrativa”. Luísa Salgueiro, presidente da Associação Nacional de Municípios, por outro lado, lembrou que é precisamente nos órgãos políticos regionais e nas autarquias que as populações mais confiam. “Não haja a tentação de acompanhar a tendência centralizadora da Comissão Europeia em Portugal”, avisou a autarca de Matosinhos, defendendo a continuação da descentralização de poderes para os municípios.
Combater a fuga fiscal
O ministro da Agricultura e Pescas lembrou que o dinheiro do PRR provém de empréstimos que terão que ser pagos entre 2027 e 2058. O pagamento dessas verbas vai acontecer ao mesmo tempo que a União também se vê obrigada a aumentar as despesas em defesa. “O orçamento da UE é de 1% do PIB e é com isso que terá que fazer tudo isto. Nos EUA, o orçamento central é de 20%”, expôs. “Vai haver grandes pressões para haver cortes na PAC e nas políticas de coesão, cortes acima de 10%”, sinalizou. José Manuel Fernandes assegura que a UE pode ir buscar mais recursos sem lançar impostos sobre os cidadãos. “Quem não paga deve pagar. A fraude, fuga e ilisão fiscal representam, anualmente, o equivalente a um orçamento da UE. Os Estados têm que fazer do combate a este problema um objetivo comum. Os gigantes do digital como a Apple, Amazon, Facebook, também têm de contribuir e isso não penaliza o cidadão. São receitas que podem reforçar o orçamento da UE, mas que se cada Estado-membro tentar arrecadá-las não conseguirá”.