O governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, realçou esta segunda-feira no Parlamento que o supervisor não tinha poderes consagrados na lei para afastar a equipa de gestão do BES, liderada por Ricardo Salgado, mais cedo do que fez. Sobre o destino da instituição, Carlos Costa disse o BES só tinha duas possibilidades: a medida de resolução ou a liquidação.
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Questionado sobre se o envolvimento do antigo presidente do Banco Espírito Santo (BES) no caso Monte Branco ou em situações de evasão fiscal não deveria ter levado o BdP a reagir e a afastá-lo mais cedo da liderança do banco, Carlos Costa disse que tal não era possível à luz da lei. "A questão é: se eu pudesse, faria?", lançou o governador, no âmbito da sua audição na comissão Parlamentar de Inquérito ao BES, que arrancou esta segunda-feira.
"Quando o poder não está garantido de forma cristalina estamos num exercício de cálculo de probabilidades e eficácia", sublinhou Carlos Costa, justificando a não retirada da idoneidade de Salgado, mesmo depois de existirem indícios de prática de atos ilícitos de gestão.
Antes, em resposta a Carlos Abreu Amorim, do PSD, dissera que "na prática, a legislação dá-nos poderes de pressão", o que alega que foi sendo feito com sucessivas exigências ao banco. Mas que se confrontou com um "dilema": "nem sempre o que se deve se pode", disse, deixando um lamento: "o poder está aquém daquilo que eu gostaria", disse, insistindo que quando o "dever" não é acompanhado de "poder" conduz a uma situaçao de "grande incapacidade".
Segundo o governador, "a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo disse o contrário", pelo que o BdP não tinha poderes para afastar a gestão de Salgado.
Essa competência cabia aos acionistas, afirmou Carlos Costa, revelando que Salgado "entregou um parecer de dois grandes juristas de Coimbra a mostrar que o BdP não podia fazer o que queria fazer", isto é, afastá-lo da presidência do BES.
Ou a liquidação ou a resolução
O governador explicou, ainda, que, após serem revelados os prejuízos históricos semestrais de 3,57 mil milhões de euros e, consequentemente, após a indicação de suspensão de acesso ao eurosistema por parte do Banco Central Europeu, só havia duas possibilidades: a medida de resolução ou a liquidação, tendo o BdP optado pela medida que resolução que, a 3 de agosto, resultou na separação do BES em duas instituições: Novo Banco (que ficou com os bons ativos) e o BES-mau (que reuniu os ativos tóxicos).
"A resolução era a única solução que permitia manter atividade, acautelar a segurança dos depósitos, permitir manter o crédito economia, prevenir riscos sistémicos e salvaguardar os interesses dos contribuintes e trabalhadores do BES", afirmou o Governador do Banco de Portugal, na comissão parlamentar de inquérito
"Capitalização pública, nacionalização, resolução e liquidação seriam as medidas possíveis", adiantou Carlos Costa.
Ofertas pelo Novo Banco já em 2015
Carlos Costa disse esperar até "meio do segundo trimestre" de 2015 peas ofertas vinculativas para a compra do Novo Banco.
As ofertas indicativas deverão surgir no começo do próximo ano e as vinculativas entre abril e "meio do segundo trimestre", disse o governador no parlamento, falando na comissão parlamentar de inquérito à gestão do BES e do Grupo Espírito Santo (GES).
"Temos indicação que há interessados" no Novo Banco, declarou, acrescentando que se for encontrada uma solução onde seja garantida, por exemplo, a "concessão de crédito necessária" à economia ter-se-á "passado ao lado de uma tempestade".
Denúncia de Queroz Pereira sem influência
O governador do Banco de Portugal (BdP) assegurou também que a denúncia do presidente da Semapa, Pedro Queiroz Pereira, feita em 2013, não teve influência sobre a investigação ao BES que o supervisor tinha já em curso.
"Não teve nenhuma influência. O nosso processo era muito mais vasto e muito mais profundo", afirmou Carlos Costa.
Segundo o governador, "o senhor Pedro Queiroz Pereira, na sua carta, nunca falou em fraude".
Porém, a investigação do supervisor estava direcionada já para a Espírito Santo International (ESI), 'holding' de topo do GES, na qual foram detetadas "irregularidades graves" nas contas.
Mesmo admitindo que Queiroz Pereira também enviou documentos com informação sobre a ESI, Carlos Costa realçou que o BdP "apurou que as diferenças eram muito superiores" aos mais de 600 milhões de euros mencionados pelo empresário.