O primeiro-ministro anunciou um pacote de austeridade sem precedentes: cortes nos salários da Função Pública, nas prestações sociais e nas pensões, a par de um aumento do IVA e da redução das deduções no IRS. A viabilização do OE fica, assim, mais possível.
Corpo do artigo
Solenemente, à hora a que jogava o Benfica para a Liga dos Campeões, José Sócrates também jogou para a viabilização do Orçamento do Estado (OE) para 2011. Tudo indica que, ao contrário do que aconteceu com o clube do qual é adepto, o primeiro-ministro conseguirá ganhar, apertando cada vez mais o cinto aos portugueses, mas evitando um cenário de crise política, que tanto estava também a preocupar o presidente da República.
"Registamos as novas e muito duras medidas de contenção da despesa. O PSD nunca rejeitou que apoiaria um Orçamento que desse primazia ao ajustamento pelo lado da despesa. E mantém, como sempre manteve, essa sua posição". Com esta frase, o dirigente social-democrata Nogueira Leite dava sinais de abertura a um OE que terá aumento de impostos (ler pág. ao lado).Quanto ao agravamento fiscal, ficou a apenas um apelo, em nota de rodapé, para que o Governo "reconsidere". O sentido de voto será decidido mais tarde, no Parlamento, como dissera Passos Coelho, de manhã em Belém, "quando houver uma proposta concreta de OE".
Sobraram ainda as críticas (do PSD e do CDS-PP) à ausência de referência ao congelamento das grandes obras, como o TGV e o aeroporto. A resposta tranquilizadora para a Direita seria dada mais tarde, por Francisco Assis e por Santos Silva. Ambos admitiram que "todos os investimentos públicos terão de ser avaliados".
Sócrates fez questão de anunciar o que chamou de "medidas dolorosas", no final do Conselho de Ministros, ao lado do ministro Teixeira dos Santos, que, logo a seguir à conferência de Imprensa voou para Bruxelas. Aí, na reunião do ECOFIN (Conselho de ministros da Economia e Finanças da Zona Euro), poderá apresentar hoje o trabalho de casa do Governo de forma a "sossegar" os mercados financeiros.
Mas, por cá, os portugueses terão a vida dificultada. Um argumento que a Esquerda usará para retirar ao Governo e ao PS qualquer apoio para manter o registo de contenção no próximo ano.
A contestação organizada pelos sindicatos já esteve nas ruas, ainda antes do anúncio do chefe do Governo. A greve geral pode deixar se ser uma ameaça para se tornar uma realidade a "ensombrar" a previsível aprovação, à Direita, do OE para o próximo ano.
Ainda ontem à noite, na sua própria casa, na sede nacional do PS no Largo do Rato, Sócrates teve de explicar a opção pelo aperto orçamental, que penalizará, em particular, os que vivem dos rendimentos do trabalho ou que são obrigados a recorrer a apoios sociais. Aos membros dos órgãos dirigentes do partido e aos deputados, o secretário-geral terá falado da "inevitabilidade" de fazer reduzir o risco da dívida e, com isso, "atar as mãos" ao PSD para viabilizar o OE.
Publicamente, Sócrates argumentou que só com "medidas dolorosas, à frente das quais está o corte salarial para a Função Pública, é possível salvar a credibilidade externa do país e garantir o actual modelo social". "São medidas que só se tomam quando não há alternativas", justificou. É uma base argumentativa que o primeiro-ministro irá, muito provavelmente, desenvolver no debate quinzenal de hoje, no Parlamento.
Cavaco fez apelo ao entendimento
Entendam-se porque a situação económica e financeira é grave e as eleições não podem ser antecipadas para já. Em linguagem comum, é esta a síntese do resultado das audiências de Cavaco Silva aos representantes dos cinco partidos com assento parlamentar.
Em nome dos "superiores interesses nacionais". O apelo do chefe do Estado foi tornado público num comunicado que o Palácio de Belém emitiu cerca de meia depois de terem terminado as audiências.
No texto, Cavaco Silva revela que chamou a atenção dos partidos para a forte dependência da economia portuguesa relativamente aos financiamentos externos a que recorrem o Estado, o sector bancário e os agentes económicos" e que salientou "as consequências extremamente graves que resultariam da ocorrência de uma crise política na actual conjuntura." Fez ainda questão de lembrar "o quadro jurídico-constitucional que presentemente condiciona" a resolução de uma eventual crise política.
