Auxílio à companhia faz disparar despesa em 2020 e equivale a 41% dos apoios dados desde 2016. Há risco de perda em caso de falência.
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O Estado português concedeu 87,6 milhões de euros em auxílios entre janeiro e abril deste ano. Se o empréstimo de 1,2 mil milhões à TAP avançar, o valor multiplica-se por 14,6 vezes. Um aumento de 1370%. A ajuda a uma só companhia aérea equivalerá a 41% das mais de 5000 ações de apoio semelhantes realizadas nos últimos quatro anos. Se a insolvência acabar por se abater sobre a TAP, o Estado arrisca-se a acarretar com as perdas.
Entre junho de 2016 e abril deste ano, o Estado concedeu 2,9 mil milhões de euros em auxílios fiscais, segundo dados publicados pela Comissão Europeia. Os beneficiários têm perfis muito variados: desde entidades públicas conhecidas (STCP, Carris, APDL, entre muitos outros exemplos) a grandes empresas privadas (Nos, Bosch, Corticeira Amorim, BPI, entre outras).
Exemplos muito variados
No entanto, a lista com mais de 5000 referências de auxílios em quatro anos, muitas vezes mais do que um à mesma empresa no mesmo ano ou em anos diferentes, contém factos surpreendentes. Por exemplo, no top 10 surge a Saipem, uma empresa ligada ao ramo petrolífero que está na Madeira, embora não tenha aí qualquer atividade industrial.
A TAP é apenas o exemplo mais recente de um auxílio do Estado autorizado por Bruxelas, pese embora seja fora do quadro temporário criado para acudir às empresas afetadas pela pandemia. No caso português, os 3,89 mil milhões de custo do Novo Banco para o Estado, valor acordado em 2017 e com pagamento faseado, rivaliza com os 1,2 mil milhões da TAP a pagar de uma só vez, mas são casos distintos. Salvar o banco herdeiro do BES foi uma medida considerada pela Comissão Europeia como "ad hoc". As origens recuavam a decisões de 2014 e 2016 e enquadravam-se nos danos causados por uma crise financeira.
"Existem diversos exemplos de auxílios concedidos a empresas em dificuldade, como é o caso da TAP, que terminaram com a insolvência. Num estudo realizado pela Comissão Europeia em 2016, constatou-se que cerca de 25% das empresas que receberam este tipo de auxílio estavam insolventes ou em vias de entrar em insolvência", refere um advogado especialista em legislação europeia, que preferiu não ser identificado. "Se a empresa ficar insolvente, e não tiver património, pode não haver possibilidade de reaver o auxílio", acrescenta Sara Rodrigues, especialista em concorrência da FCB Advogados.
"Neste caso, o interesse estratégico em manter a subsistência dos operadores de "bandeira" de cada país sobrepõe-se à proteção da concorrência efetiva, refere o especialista em legislação europeia. Sara Rodrigues discorda. "A própria Comissão Europeia veio defender que o auxílio de 1200 milhões de euros à TAP não distorce indevidamente a concorrência, considerando que tal auxílio beneficiará não só o setor da aviação mas igualmente o turismo e a economia", explica a advogada.
A Lufthansa, por exemplo, irá receber uma ajuda de Estado de nove mil milhões, o que equivale a 65 euros por empregado. No caso da TAP, o auxílio é de 134 euros por cabeça. Dimensões distintas, mas com apoios desproporcionados.
Casos
Cifial
A Cifial, empresa de torneiras que já foi de Ludgero Marques, antigo líder da AEP, beneficiou em redução de juros mais de 141 mil euros em 2018. Nessa altura, pertencia a um fundo de investimento, que a vendeu em 2019 a investidores chineses.
Mabor
A Continental Mabor, empresa de pneus de Lousado, teve um benefício ou isenção fiscal de 17 milhões de euros no conjunto dos anos de 2017, 2018 e 2019. Este último ano concentrou 59% de todos aqueles auxílios estatais.